Resenha: Alabama Shakes - Sound & Color

Desde que Billie Holiday colocou a voz e a presença da mulher negra à frente de grupos geralmente formados por homens brancos numa tenebrosa época de segregação racial nos Estados Unidos, muitas outras tiveram coragem de se expor a toda sorte de riscos que podiam correr. Essa tendência foi se esvaindo à medida que se tornava comum e a passagem da música negra na construção das bases do rock foi ficando cada vez mais complexa e distante.

No caso do Alabama Shakes, ver Brittany Howard ocupando esse posto de forma despretensiosa, claro, pois o contexto é outro, sendo quase exceção numa época em que a América ainda não superou o racismo (vide caso Baltimore) faz pensar na importância desse simbolismo. Ainda que o engajamento político e a militância não sejam bandeiras do grupo, simbolicamente, sua figura expõe parte da cena indie atual: a predominância branca e quase nenhum questionamento social. Obviamente, a intenção aqui não é criar ou resolver um “problema”.

Desde quando surgiu em 2009, o Alabama Shakes tem sido um prato cheio para a crítica musical “tradicional”, aquela que adora rechear seus textos com termos do tipo “southern-soul-blues-country-gospel-indie-rock” ou comparações como “Brittany é a nova Janis Joplin”. Sim, basta ouvir o som que a banda faz e logo o ouvinte começa a fazer tais ligações. Porém, esse mecanismo pode ofuscar um pouco os méritos da banda em ter conseguido agregar tantas camadas sonoras ao rock moderno, quase todo baseado em baixo, guitarra, voz e bateria.

Após o lançamento estrondoso do álbum de estreia, Boys & Girls (2012), a banda é tida como uma das grandes revelações da década na cena indie. O excelente disco que trouxe hits como “Hold On” e “You Ain’t Alone” galgou os primeiros degraus das paradas de sucesso no mundo inteiro e inflou ainda mais as expectativas em relação ao que viria em seguida na carreira da banda.

Resenha: Alabama Shakes - Sound & Color

O quarteto acaba de lançar seu segundo trabalho, Sound & Color, e, em menos de um mês alcançou o primeiro lugar da Billboard. A sensação de ouvir a obra não é igual a do primeiro disco, eles têm referências sonoras parecidas, mas melodias e uma amarração diferente e um pouco mais complexa entre as canções. Quem esperava pela repetição da fórmula pode ter se decepcionado, pois aqui o que se vê é a continuação de um precoce amadurecimento já mostrado em seu primeiro trabalho. O que os integrantes já diziam em entrevistas anteriores fica evidente: eles não seguem a cartilha do sucesso e apontam para diversos lados.

O disco mostra uma exploração mais profunda dos elementos que compõem sua música. Mesmo em “Don’t Wanna Fight”, primeiro single que ganhou inclusive o primeiro videoclipe produzido pela banda, que é trabalhada de uma forma mais comercial, há um vigor intensificado. Até então, a banda não produzia clipes, a questão visual conseguiu se manter até aqui apenas com imagens do grupo ao vivo. Quem já teve a oportunidade de assistir a um show da banda sabe do que se trata.

Em “Gimme All Your Love”, a melhor faixa do disco, o que se ouve são perfeitos encaixes instrumentais que vão se modificando e a cada segundo te mostram o quanto a música pode ser diversa em si mesma. No álbum, as potentes vocalizações de Brittany ganham novos contornos também, seja pelo teor das letras – que abordam temas como espiritualidade e amores errados – como pela própria postura do quarteto em obter mais de seus instrumentos.

Com doze faixas, o novo trabalho foi produzido por Blake Mills, que também foi parceiro de Brittany nas composições de “Future People”, música carregada de distorções de guitarra numa levada empolgada; a confessional “Guess Who”; e “Gemini”, penúltima faixa, com quase sete minutos.

As primeiras seis músicas do disco, sua primeira parte, carregam o lado menos complexo de ser abordado, com faixas bastante trabalhadas. Aqui, os riffs da guitarra de Heath Fogg ecoam em vários momentos a fim de transportar o espectador a outros lugares. É uma viagem que vai de Jimmi Hendrix às distorções com a cara de Jack White. O preenchimento dos espaços na música se dá de uma maneira quase orquestrada, com cada elemento se amarrando um no outro de maneira exemplar.

Na segunda metade do disco, uma aura soul fica mais evidente. E aqui, a presença de Ben Tanner, o tecladista/pianista que a banda leva nos shows, se torna indispensável. Só foge disso a música “The Greatest”, um country acelerado colocado no meio de faixas mais limpas. A música talvez se encaixe melhor em Boys & Girls.

O placar, enfim, marca pontos para o Alabama Shakes. Eles mostraram que não superar expectativas talvez seja libertador, que a tal “maldição do segundo disco” é uma grande balela e que uma banda não deve ficar presa ao que já não mais a conforta.

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