Beto Bruno com a banda Cachorro Grande na Expopato, em Pato Branco

Por Nelson Junior

Fotos por Luís Henrique Boneti

Quem for a um show da Cachorro Grande vai ver duas versões diferentes da mesma banda. Uma delas é a de sempre; a dos terninhos, das canções certeiras, meio desbocados, e que foi entendida como uma lufada de atitude no rock brazuca quando começou a decolar, lá nos primeiros anos da década passada.

A outra está navegando em mares então pouco navegados, fazendo tudo com mais paciência, explicando melhor e experimentando novos sons e instrumentos.

Foi a sonoridade de Costa do Marfim, o recém-lançado disco de estúdio, que forçou o grupo a dividir suas apresentações em dois atos. Tudo  começa com um combo de novas canções para só depois aparecerem as velhas conhecidas. “São músicas muito diferentes”, reconhece o vocalista Beto Bruno.

São mesmo. Com músicas maiores, muita psicodelia e efeitos eletrônicos, o disco é um experimento nascido das influências que a banda já ouvia e aos poucos estava tentando sintetizar, como The Chemical Brothers, Kraftwerk, e os discos mais viajados de David Bowie.

O resultado é uma obra com prelúdio e encerramento, uma faixa que beira os 11 minutos, uma narração musicada e muitas outras coisas, inclusive histórias. A seguir Beto Bruno fala sobre a gestação e o nascimento de Costa do Marfim.

TMDQA!: De quem foi a ideia de deixar as coisas mais experimentais?

Beto Bruno: Partiu da banda, no momento em que estávamos excursionando com o último trabalho, o DVD ao vivo no Circo Voador, que gravamos como se fosse uma coletânea de maiores sucessos. No meio da turnê nos demos conta de que poderíamos aproveitar o encerramento dessa primeira fase da banda e investir em uma sonoridade nova, que já estávamos procurando há muito tempo mas que ainda não tínhamos propriedade pra fazer. Então surgiu de uma vontade nossa de não se acomodar.

TMDQA!: E por que enveredar para o caminho mais eletrônico e psicodélico?

Beto Bruno: Porque é uma coisa que a gente sempre amou, como os últimos discos do Clash, aquele disco do Bowie do final dos anos 70, começo dos 80, e algumas coisas dos anos 90, como o “Outside” e o “Earthling”. Kraftwerk, que é de antes ainda, e muita coisa que estamos ouvindo hoje, como o The Chemical Brothers. E pra nos ajudar a encontrar essa  sonoridade nós chamamos o Edu K.

TMDQA!: Qual é a parcela de culpa dele no resultado final?

Beto Bruno: Ele faz isso desde o final dos anos 80, com o Defalla. Ele só estava uns 20 anos à frente do que qualquer outra banda aqui no Brasil. Além disso é um grande amigo nosso, com quem há muito tempo queríamos fazer algo juntos e achamos que apareceu o melhor momento.

TMDQA!: E essa estética meio colorida? Qual a relação entre o som e a imagem?

Beto Bruno: Foi uma coisa meio desleixada, isso nunca foi algo proposital. E a gente achou engraçado isso ter acontecido de uma hora pra outra. Ficamos cansados de carregar terno preto por aí, era hora de dar uma limpada. Tinha muita coisa escura ao redor.

TMDQA!: Aliás, quem é o cara da capa do disco?

Beto Bruno: Ele se chama Rodrigo Pecci, ou planta. É um artista plástico, amigo nosso há muito tempo. Essa foto já existia. Quando eu fui na casa do Cisco (Vasques), o fotógrafo das nossas últimas três capas, vi essa foto lá no canto. Achei cômico, e disse que nem precisávamos mais conversar porque a próxima capa seria aquilo ali.

TMDQA!: Vocês estão levando para o palco todos os elementos do estúdio?

Beto Bruno: Tudo o que tem no disco rola.

TMDQA!: E a resposta está sendo boa?

Beto Bruno: Está. Por enquanto está mais nas capitais, mas a galera já chapou, estão cantando as músicas. O mais importante é que a gente está conseguindo passar a energia do disco no palco.

TMDQA!: A banda é conhecida por fazer um rock mais cru, direto. Em algum momento vocês tiveram receio de que o novo disco pudesse não agradar aos fãs que acompanham vocês há mais tempo?

Beto Bruno: Pra ser bem sincero, o nosso maior receio foi se repetir, não evoluir musicalmente e ampliar os horizontes. Claro que a reação dos fãs a um disco diferente desses poderia ser um pouco indesejada. Mas nosso público não é bobo, eles vão atrás dessas influências que citamos nas entrevistas e muitas delas eles já escutam.

TMDQA!: Costa do Marfim pode ser considerado um disco conceitual. Qual a importância de fazer um trabalho assim para uma época em que parece que menos gente percebe o significado do disco como uma obra completa?

Beto Bruno: O mais importante é o amor que temos por um disco, pela música em si e pelo nosso trabalho. E que isso não acabe, porque a gente cresceu com uma boa discografia. Acredito que bandas precisam pensar em discos com conceito, que é algo que não se perde. Ainda mais o rock, que anda numa fase tão ruim. Nunca houve uma fase tão careta pro rock no Brasil. Nós pensamos sempre em fazer um disco melhor do que o outro, um show melhor do que o outro.

TMDQA!: Beto, pra encerrar. Você tem mais discos que amigos?

Beto Bruno: Eu tenho muito mais discos. Na verdade eu tenho muito mais contatos do que amigos de verdade.

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