BK’ é um dos rappers brasileiros mais interessantes da atualidade e, em 2020, lançou o disco O Líder Em Movimento.

Sucessor do icônico Gigantes (2018), o álbum manteve o nível da carreira do músico carioca e ainda levou a sua sonoridade adiante, fazendo um verdadeiro disco de Rap em um dos anos mais difíceis de todas as nossas vidas.

Artista do mês em Janeiro de 2021 no TMDQA!, BK’ conversou com Tony Aiex sobre as motivações para esse álbum, os percalços da pandemia, Rap Nacional e mais.

Você pode ver a segunda parte da nossa entrevista exclusiva com BK’ logo abaixo, ou direto em nosso canal do YouTube, onde pode se inscrever e ativar as notificações.

Além disso, ainda pode ouvir o papo no Podcast Tenho Mais Discos Que Amigos! e, claro, ler tudo em texto aqui mesmo.

Para ver a primeira parte da conversa, onde o artista fala sobre as origens e as influências de nomes como Racionais MC’s e MV Bill, é só clicar aqui.

Divirta-se!

BK’ Explica o Processo de “O Líder em Movimento”

TMDQA!: Falando sobre processos, 2020 foi diferente. Mesmo você fazendo um disco sem nenhuma participação, ainda tem muitas pessoas que precisam estar envolvidas pra rolar, e 2020 dificultou muito tudo isso. Muitos artistas até deixaram de lançar seus discos. Queria que você falasse um pouco de como foi o processo desse disco na sua cabeça nesse ano tão louco. Ainda mais depois de um álbum tão elogiado como o “Gigantes”. Como foi essa decisão?

BK: Cara, em janeiro a gente foi gravar o disco e já o processo de composição, 2019… a gente se isolou pra gravar. Mas era Janeiro, já pertinho do Carnaval, eu já sabia que não ia conseguir gravar 100%, tá ligado? Não ia conseguir dar a atenção necessária que eu queria dar pro álbum. Vou sair, tem Carnaval, pré-carnaval, não vai dar certo. Eu me conheço, mano. Eu me conheço. No Rio de Janeiro a coisa mais comum é viver em festa. Mas a meta era lançar esse disco em maio, e eu queria lançar dois álbuns neste ano. A minha meta era essa. Aí chegou março e essa pandemia do COVID, e a gente ficou meio perdido, porque a galera não entendia a doença, não entendia o momento. A galera não se encontrava mesmo. E eu fiquei de fato três meses sem botar o pé na rua, então isso atrasou muita coisa. Eu tinha outros planos, outras metas até com o audiovisual do álbum, tá ligado? Que eu não consegui fazer.

A gente tinha outros planos pra capa. Eu gosto muito do resultado da capa, mas tínhamos outros planos pra isso também. E aí eu comecei a ficar preocupado, porque eu tenho um montão de coisas pra montar o universo do disco, e não vou poder fazer isso. Aí fiquei na dúvida de lançar ou não. Aí atrasa aqui, atrasa ali, atrasa não sei aonde… Não é que ia sair incompleto, até porque o “Líder” foi onde eu cheguei mais perto do 100% que eu queria. A gente fez tudo que a gente pensou pro álbum, tá ligado? Eu falei pro JXNV$, isso aqui é um álbum de ideia, é um álbum de conceito. A gente não pensou em nenhum super hit, nada comercial. A gente quis fazer realmente um álbum de Rap mesmo, chegar na galera da do Rap e entregar algo pra cultura de fato, e acho que a gente conseguiu bater essas metas 100%, tá ligado? O que pegou mesmo foi esse lance do audiovisual, que ficou faltando.

TMDQA!: Então você já tinha imaginado um projeto audiovisual pensado pra isso?

BK: Sim, tinha um rascunho, a gente já estava se planejando pra fazer, mas foi quando realmente parou tudo. E aí acomeçou a atrasar. Tipo, a gente precisava ter uma sessão de mix no estúdio, mas ia dar pra encontrar o Arthur, não ia dar pra todo mundo se reunir. Qualquer coisa no estúdio que era pra fazer, a gente não conseguia. A gente não sabia como iria se encontrar. Máscara, luva… O covid-19 realmente atrasou a vida de todo mundo (risos).

TMDQA!: Pois é, nem dá muito pra lamentar muito, né? A gente lamenta, aí olha pro lado e vê que isso afetou todo mundo. 

BK: Total, cara. E aí foi isso, o lançamento ficou em setembro, mas a parada era pra maio.

TMDQA!: E você acha que, no final das contas, o timing acabou sendo bom? Dentro das condições que a gente tinha e que o mundo estava enfrentando. Você falou que ficou feliz com o resultado em si. Eu senti que, quando você soltou o disco, a comoção foi muito grande entre os seguidores e fãs, muita gente agradecendo tudo que você falou nas letras. Declarações como “Eu precisava desse disco, obrigado”. Pra mim a reação mais latente foi a dos fãs mesmo. Isso te deixou satisfeito?

BK: É exatamente o que você falou. A gente ficou nessa de “lança ou não lança”, mas o momento, tudo que vem acontecendo, a gente falou, “cara, não tem outro… ou a gente lança agora, tá ligado…?” A gente tem que falar do que tava acontecendo. Porque assim, toda essa violência, esse movimento do Vida Negras Importam, esse ano teve essa explosão mas foi algo que a gente sempre acompanhou, infelizmente. Nesse momento a bomba explodiu, mas a bomba já tá pra explodir há muito tempo. A gente já observa isso há muito tempo, então eu já fui focando nesses assuntos.

Aí teve o momento em que explodiu tudo e eu falei, “então é agora”. Uma das nossas formas de colaborar além de estar indo nas manifestações e fazer todo o nosso movimento é a nossa arte. A minha forma de colaborar com todo o movimento, com tudo que eu acredito com o próprio Rap e o próprio movimento negro é com a minha música. O disco foi minha forma de ajudar, e muitas pessoas me falaram que estavam precisando ouvir aquilo. Até eu estava precisando ouvir. Cara, tem coisas que falo no disco que quero que sejam realidade pra mim também.

Eu nunca gosto de me colocar no lugar de professor de ninguém ou líder de ninguém, porque muitas vezes o que eu to falando ali, eu to falando pra mim também, tá ligado? O que eu preciso aprender? O que eu preciso melhorar? Tô me comunicado com meus irmãos e minhas irmãs, mas comigo também.

TMDQA!: Legal você falar isso, porque às vezes você escreve e só a hora que você ouve entende aquilo que saiu mesmo, né…

BK: Exatamente, cara. Depois, ouvindo, eu senti o peso daquilo que eu escrevi. Não é nem o artista sendo cobrado. Muitas vezes a galera cobra uma mensagem de você, mas dessa vez eu escrevi pra mim também. Um exemplo disso é a faixa “O Show Nunca Acaba”, que é uma faixa que a galera gostou muito, mas ela é mais um desabafo, tá ligado? Era um momento que eu não tava muito bem e precisava soltar aquilo. Muita gente se identificou, mas aquilo foi pra mim também. É pra mim também. Tem coisa no Líder em Movimento que eu quero ser mais, tá ligado? Eu quero ser mais aquilo.

TMDQA!: O massa é que isso fica como um registro pessoal seu. A gente tá em constante evolução e movimento, então vai ser massa você ouvir isso daqui uns 2 ou 5 anos. Bom, eu falei de pandemia, mas 2020 também foi o ano dos protestos, ainda mais sobre o racismo no mundo inteiro. Em um episódio do Podcast TMDQA!, chamamos o Babu Santana justamente pra falar desses assuntos, e eu trouxe todo um histórico do problema lá nos Estados Unidos, coisa desde os anos 80. Depois que eu falei, ele concordou e disse: “Cara, tudo que você falou aí, acontece em uma semana no Rio de Janeiro”. E eu fiquei espantado, porque as coisas aqui não recebem a mesma atenção que lá fora. Por uma lado a gente fica feliz de ver mudanças acontecendo, e de outro muito triste de saber que isso ainda é uma questão tão forte. E aí tem o seu disco, que é um registro de Rap em todos os sentidos, colocando o dedo na ferida e tudo mais. Queria que você comentasse um pouco sobre isso e sobre como esse tipo de coisa influenciou no seu disco.

BK: Eu tô acompanhando muito esse crescimento do Rap agora e eu acho muito maneiro isso, acho muito bom, acho muito importante. Mas é importante também fortalecer a base, como diz o Mano Brown, no rolê de voltar pra base, tá ligado?

O Rap tá crescendo muito, traz muita gente de fora, mas a base tem que estar forte também. A gente tem que lembrar o que fez a gente chegar até aqui. Eu amo todos os tipos de Rap, mas cheguei aqui com o Rap do papo reto, o Rap mais consciente, tá ligado? Foi isso que me fez chegar até aqui. Eu amo todas as vertentes, todas as formas que o Rap tem. Mas o que me fez chegar aqui, BK, aqui, foi esse Rap consciente.

Então eu queria devolver um pouco pra isso no momento que a cultura tá crescendo. Mas o entretenimento do Rap tá crescendo, tá ligado, então eu acho que é importante… “Vamos crescer? Vamos! Mas vamos lembrar também que a gente veio daqui.” Tem que lembrar de onde foi o “start”. Então a gente vai e sobe, sempre lembrando de onde veio. Não pode esquecer, eu acredito nisso. E foi um pouco disso que eu quis fazer nesse disco, por isso eu digo que é um disco de Rap de verdade, do Rap que eu aprendi pra mim, da minha realidade de Rap.

Eu acho importante sempre voltar pra base e pra cultura, pra gente não deixar isso se dissolver só por causa de números e shows lotados. No underground do Rap existe muita gente que luta e sangra por essa cultura sem lucrar nada, e a gente não pode ignorar, tá ligado? É muito importante vender o produto também, mas a base tem que estar forte.

TMDQA!: Acho que essa sua visão é a mais construtiva possível. Porque é de alguém que sabe como o negócio funciona, mas de quem sabe também que, se não estruturar direito, a coisa cai, né?

BK: Pois é, cai na mesma velocidade que subiu, às vezes até mais rápido. Eu acredito muito nisso de ter cuidado e carinho com a cultura. Essa é minha forma de devolver mesmo, foi com esse disco.

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