Tash Sultana
Foto: Giulia McGauran + These Wild Eyes

Há artistas cuja essência pulsa tão forte que você sente a presença mesmo antes de ouvir uma nota. Tash Sultana, fênomeno global e artista australiane não-binária que atende por pronomes neutros, é um desses nomes. 

Multi-instrumentista, produtore de seus próprios discos, empresárie, proprietárie da Lonely Lands Records (estúdio e selo) e artista que mistura reggae, soul, R&B, psicodelia, rock alternativo e indie folk, Tash construiu uma trajetória marcada por improvisos magnéticos, camadas sonoras hipnóticas e uma liberdade criativa que segue inspirando fãs e músicos ao redor do mundo.

Desde o começo, elu rejeita rótulos, mas constrói identidade a partir de cada acorde, cada textura sonora, levando ao vivo aquilo que muitos levam uma vida inteira para tentar reproduzir.

TMDQA! entrevista Tash Sultana, fenômeno global

Às sete da manhã de uma quarta-feira, diretamente de sua casa na Austrália, Tash nos respondeu em chamada de vídeo. Enquanto o Brasil já vivia a noite, elu começava o dia falando sobre música, raízes e liberdade criativa, com a voz carregada de entusiasmo para apresentar a nova fase da carreira.   

Em tempo de reencontro consigo mesme, Tash prepara sua primeira turnê solo pela América Latina, realizada pela 30e como parte do projeto ÍNDIGO, novo ecossistema de curadoria de shows da produtora. Quase dez anos depois de sua participação no festival Lollapalooza pela América do Sul, a expectativa para os novos shows é grande, tanto do lado dos fãs quanto do lado de Tash:

O público latino é movido por uma paixão que não se encontra em nenhum outro lugar.”

Parte desse entusiasmo também se conecta ao lançamento do EP Return to the Roots, um trabalho visceral e genuíno, repleto de significado. Nele, Tash resgata canções escritas na adolescência, revisita a essência do início da carreira e compartilha colaborações especiais, como a parceria com City and Colour, projeto de Dallas Green (Alexisonfire). O EP é apenas o começo de um projeto maior, que já está em andamento e irá expandir ainda mais seus horizontes musicais.

Entre reflexões sobre a cena atual, críticas à lógica das gravadoras , comentários sobre ser artista independente e suas principais inspirações, Tash reafirma algo que disse em 2018 e que ainda ecoa hoje: “Eu não me coloquei em uma caixa e não tenho nenhuma limitação”. Livre de rótulos, segue criando música com verdade, intensidade e uma conexão inegável com quem a escuta.

Abaixo, confira na íntegra o papo exclusivo que o Tenho Mais Discos Que Amigos! teve com Tash Sultana!

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Tash Sultana em nova turnê pelo Brasil

TMDQA!: Bom dia, Tash! Obrigada por topar conversar conosco tão cedo! Vamos conversar sobre sua turnê atual, seu novo trabalho e coisas do tipo. Essa será sua primeira turnê solo na América Latina. Em 2018, você tocou no Lollapalooza no Chile, Argentina e Brasil (onde fez um show solo também em São Paulo). Quais são suas expectativas para esses shows, quase dez anos depois daquela experiência?

Tash: Acho que vão ser insanos. Porque tenho certeza… não sei exatamente o que acontece na América Latina, mas é algo que o resto do mundo não faz. É algo grande. Todo mundo aí é muito apaixonado. Eles amam intensamente. Eles amam uns aos outros intensamente. Amam esporte intensamente. Amam música intensamente. E suponho que, a não ser que você seja um artista latino-americano, às vezes essa região nem sempre entra no mapa como parte de uma turnê. Mas eu recebo todos os dias, a cada segundo, mensagens dizendo “vem para o Brasil, vem para o Brasil, vem para o México, vem para a Argentina, vem para o Chile, vem para o Equador, vem para cá…”. Já estava demorando demais. Era hora.

TMDQA!: Aliás, você tem publicado mensagens super carinhosas para os fãs da América Latina, especialmente para os brasileiros, inclusive brincando em português no Instagram. Como é sua conexão com o público brasileiro e o que significa para você tocar em um país que tantos artistas sonham em conhecer?

Tash: Bem, como você disse, estive aí em 2018, sim, no Lollapalooza. E também fiz dois shows meus na época. Um no Brasil e outro no México. E foram bem pequenos. Nem sei exatamente onde toquei no Brasil — foi em um rooftop, em algum lugar de São Paulo. Então agora vai ser bem diferente. Primeiro porque eu amadureci, já tenho mais estrada, e acho que a expectativa cresceu muito ao longo do tempo. Tenho certeza de que vai estar lotado. Os ingressos já venderam muito bem, está tudo indo bem.

TMDQA!: Depois de anos fazendo um show de “uma pessoa só”, você passou a levar uma banda para te acompanhar. O que motivou essa mudança? E como isso influenciou sua forma de tocar e se apresentar?

Tash: A banda não escreve as músicas, ela é só uma banda de apoio ao vivo. Ela só toca comigo nos shows e eu amo isso. Nós somos como uma grande família e eles trazem muito para a turnê, para o meu dia a dia, para a minha estabilidade na estrada. Porque eu sei o que consigo fazer sozinhe. O mundo já sabe o que eu consigo fazer sozinhe. Já risquei isso da lista.

Então eu penso assim: já sou capaz de todas essas coisas sozinhe, mas quando adiciono mais três pessoas, consigo levar a performance a três lugares diferentes. Você vai ver no show, é insano. Faço metade do show sozinhe e a outra metade com a banda. Então tem os dois lados. E eu simplesmente não queria ser conhecide apenas como “artista de looping”. Eu componho de várias formas e às vezes as músicas não são feitas para serem “loopadas”. Existe um outro elemento de performance nelas.

Novo EP, parceria com City and Colour e novos horizontes

TMDQA!: Então, você lançou recentemente o EP Return to the Roots, que é incrível e talvez seu trabalho mais honesto até aqui. Você colaborou com Dallas Green, do City and Colour, em “Ain’t It Kind of Funny”, uma faixa belíssima — na minha opinião, uma das melhores do compacto. Como surgiu essa colaboração com Dallas e como vocês se conheceram?

Tash: Eu vi que o City and Colour estava em turnê na Austrália. Então pensei: vou mandar uma mensagem para ele, ver se teria tempo de passar no meu estúdio. E deu super certo. A gente entrou em contato, começou a trocar algumas ligações para se conhecer melhor, sentir a compatibilidade e tal. Decidimos que sim, que íamos escrever algo juntos — talvez algumas músicas novas.

Eu já tinha essa canção que tinha escrito há muito tempo, chamada “Ain’t It Kind of Funny, que acabou sendo a que fiz com o City and Colour. Escrevi essa música quando tinha uns 15 anos. Não na forma atual, claro, mas já com os mesmos acordes, melodia e uma letra parecida. Eu costumava tocá-la acústica em noites de microfone aberto. Na época se chamava “Blackstone Soul”. Provavelmente, existe algum vídeo antigo dela no Youtube ou em algum lugar. Mas tinha algo nessa faixa que achei que seria legal reescrever aquela ideia de um jeito mais maduro porque eu sabia que tinha potencial.

Tento não desperdiçar nada do que escrevo: tudo que chega até mim vem por um motivo e precisa ganhar um espaço. Agora, inclusive, a música que estou compondo para o meu próximo projeto é bem experimental. Tem uma sonoridade global, muito inspirada no Oriente Médio. Tenho tocado bastante bouzouki, oud (alaúde árabe) e cítara.

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TMDQA!: Sim! Eu vi você tocando cítara ontem, se não me engano.

Tash: Pois é! Vai ser muito interessante ver para onde esse disco vai. Eu tenho tido sonhos. Então, eu ganhei essa cítara de presente, junto com algumas aulas com um guru, mas nunca tinha realmente tocado. Ela ficou guardada em casa por muito tempo. Outro dia olhei para ela e pensei: “Por que diabos eu não toco isso?”. Então entrei no YouTube e comecei a ver tutoriais para iniciantes: como segurar, como sentar, como afinar (porque tem muitas cordas!). Mas o som era incrível. 

TMDQA!: E foi incrível o que eu vi. Era a primeira vez que você tocava e já foi mágico!

Tash: É. Mas assim, quando você já sabe tocar vários instrumentos e, principalmente, de corda, não começa totalmente do zero, não é como se nunca tivesse tocado um instrumento na sua vida. Return to the Roots foi o portal que me levou de volta a sentir prazer em compor, algo que estava faltando há algum tempo. Estou exatamente onde preciso estar: compondo pela arte em si e deixando as coisas acontecerem naturalmente.

Evolução física, mental e musical

TMDQA!: Aliás, Return to the Roots soa tão cru e orgânico. Como foi o processo de gravação? Teve muito improviso ou já estava tudo planejado?

Tash: Dessa vez estava bem planejado. Mas quis que soasse exatamente como você ouve no disco porque também é assim que toco ao vivo. Queria cantar como nunca tinha cantado antes. Queria me expressar na guitarra de um jeito novo, arranjar tudo e contar as histórias que precisava contar. Sempre consegui desempenhar muito bem no palco porque recebo toda aquela energia da plateia. Mas no estúdio, às vezes, era mais difícil conectar os pontos. Então, muitas dessas vozes eu gravei em uma única tomada. Entrei na cabine, a performance estava lá, ficou registrado e pronto. Tenho cuidado bastante da minha saúde e da forma física…

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Tash Sultana
Foto: Giulia McGauran + These Wild Eyes

TMDQA!: Sim, fiquei sabendo, você disse até que se sente meio Rock Balboa, no momento (risos).

Tash: Sim, estou super em forma. Perdi sete quilos, sigo uma dieta e treino pesado. Me sinto feito de aço. Isso tem feito maravilhas para o meu canto.

TMDQA!: Acompanho você desde o primeiro EP e dá para perceber essa evolução, especialmente na voz e na presença ao vivo. Acho que você está em ótima forma!

Tash: Muito obrigade, aprecio muito isso.

Visão de artista independente e suas inspirações

TMDQA!: Agora, Tash, você sempre foi artista independente. Hoje em dia, a forma como as pessoas consomem música mudou muito. Como você enxerga a conexão do público com artistas atualmente? E como isso impactou a sua trajetória?

Tash: Hoje existe uma nova camada em tudo isso. Quando eu estava começando, a coisa mais importante era tocar em todo e qualquer show possível. As redes sociais até existiam, mas, sabe, não eram prioridade. Era preciso sair de casa e construir sua rede de contatos pessoalmente. Agora, existem pessoas que ficaram mundialmente famosas no TikTok sem nunca ter feito um show na vida. Nunca saíram do quarto com o violão. E de repente têm algumas das músicas mais ouvidas do mundo, só que ainda não estão prontas para subir em um palco, não por falta de talento, mas por falta de experiência. Então, você passou de um quarto pequeno para apenas estar no palco. 

TMDQA!: Sim, eu tenho a mesma impressão.

Tash: Do jeito que as coisas estão indo agora com as gravadoras, elas não estão interessadas em contratar você a menos que você tenha seguidores, a menos que você tenha uma certa quantidade de seguidores nas redes sociais e um bom engajamento porque as gravadoras agora, elas realmente não sabem o que fazer com os artistas. Eles não estão mais tão interessados ​​em criar um artista inovador porque, bem, as pessoas estão fazendo isso por conta própria, então elas não sabem realmente o que fazer no momento.

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Tash Sultana, fenômeno global, anuncia shows no Brasil
Foto: Divulgação / SRO PR / Giulia McGauran + These Wild Eyes

TMDQA!: Bem, esses são nossos últimos minutos e eu quero muito te fazer essa pergunta, pois sei que você vai gostar. Nosso site se chama Tenho Mais Discos Que Amigos!, então eu preciso te perguntar: você também tem mais discos que amigos?

Tash: Eu tenho diversos discos, na verdade.

TMDQA!: Você consegue escolher um disco que tenha mudado sua vida para sempre?

Tash: Sade. Qualquer coisa de Sade. E Erykah Badu. Based on a True Story, do Fat Freddy’s Drop; Voodoo, do D’Angelo e For Emma, Forever Ago, de Bon Iver, foram os discos que mudaram minha vida. 

Tash Sultana no Brasil: ingressos, locais e informações

A volta de Tash Sultana ao país depois de quase 10 anos é a chance do público testemunhar um artista no auge da liberdade criativa, explorando novas camadas sem perder o que sempre fez elu soar único. E acredite, você vai querer estar lá pra conferir isso.

Com realização pela 30e, os shows acontecem nos dias 04 e 05 de Novembro, respectivamente no Rio de Janeiro (Circo Voador) e em São Paulo (Audio). Os ingressos estão à venda por aqui e custam a partir de R$197,50. Algumas modalidades de entrada para o show de São Paulo já estão esgotadas, então corra para garantir a sua!