Antes mesmo de se imaginar como artista, o carioca Leo Middea, já sentia a música rondando sua infância. Era o som da sua avó cantando canções italianas e o seu próprio olhar curioso para o violão encostado em um canto da sala.
Posteriormente, ele se aproximou do instrumento, que sua mãe havia ganhado e nunca aprendido a tocar, para impressionar uma garota. Em conversa com o Tenho Mais Discos Que Amigos!, ele relembra:
Aquele gesto adolescente foi o primeiro passo de algo muito maior, que eu nem fazia ideia. Quando fui aprender meu primeiro instrumento, aos 15, aquilo despertou algo muito forte em mim. Logo percebi minha facilidade para compor — algo que eu nem imaginava que era possível. Dali em diante, nunca mais parei.”
Essa descoberta inaugurou um processo intenso e intuitivo de conexão com a música. Mesmo sem músicos na família, Leo mergulhou de cabeça no violão, a ponto de até repetir o ano escolar.
Canções que abrem caminhos
A faísca criativa veio após o impacto do disco Canções de Apartamento, de Cícero, lançado em 2011. Nas palavras de Leo, esse álbum despertou sua vontade de escrever canções e seguir a música como profissão, para “tentar passar para as pessoas nem que fosse 1% do sentimento que aquele disco passou pra mim”. A partir dali, ele começou a desenhar um caminho próprio.
A primeira canção escrita após esse momento foi “O Mochileiro”, que abre seu disco de estreia, Dois, lançado em 2014. Desde o início, suas referências, ainda mais claras em A Dança do Mundo (2016), eram plurais: funk, samba, rap, indie e MPB formaram a base de uma sonoridade que vive em movimento.
Acho que ainda tô encontrando meu som, mas com certeza cada coisa que escuto, que me influenciou, acaba sendo refletida, em algum momento, nas minhas composições ou no meu trabalho.”
Leo Middea: do subúrbio do Rio para o mundo
A guinada internacional veio cedo. Com apenas 19 anos e após portas fechadas no Brasil, Leo decidiu apostar em uma turnê pela Argentina, realizando 28 shows com a ajuda de um amigo músico. A viagem de 52 horas de ônibus entre Rio e Buenos Aires mudou tudo. “Me veio a ideia de expansão: se algo não tá funcionando, tenta outros lugares”, relembra.
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Cantar em português para públicos estrangeiros virou parte fundamental da experiência. O idioma nunca foi um obstáculo, já que a conexão acontece de um jeito quase espiritual, como ele mesmo conta:
A música brasileira é muito mais forte do que a palavra, e acho que é isso que conecta as pessoas. Os nuances de coro, as melodias, o ritmo… tudo isso fala por si. […] Todo mundo da indústria dizia que não ia ser possível se eu não fosse muito conhecido no Brasil. E no final, foi possível.”
Artista fora do eixo
Desde então, Leo passou longe dos roteiros tradicionais. Fez um retiro de silêncio na Índia, morou por seis anos em Lisboa e agora está radicado em Barcelona, onde vive há dois anos.
Totalizando oito anos de Europa, Leo Middea acumula mais de 300 shows em 16 países, sendo 100 deles feitos somente em 2024. “Comecei a entender que esse era o meu verdadeiro caminho quando os shows começaram a esgotar — em Lisboa, Madrid, Polônia, Inglaterra… e com público local. Isso, pra mim, era incrível,” celebra Leo.
Um dos momentos mais simbólicos dessa fase foi o lançamento do álbum Vicentina (2020), viabilizado após Leo pedir 1 euro nas ruas de Lisboa para cada pessoa com quem conversava. Com o valor arrecadado, gravou o disco no estúdio de Marcelo Camelo (Los Hermanos), ídolo de longa data.
Fiquei super feliz com o resultado. Com um mês do lançamento, fui fazer um show no Rio, meu recorde de público na cidade até então, quase 400 pessoas. Todo mundo cantando as músicas do disco novo com só um mês de lançado. Eu pensava: ‘agora vai’. Aí… veio a pandemia e acabou com tudo [risos].”
Durante o isolamento, Leo compôs e lançou Beleza Isolar, também em 2020. De lá, saiu “Lisbon Lisbon”, que viralizou no Instagram e fortaleceu ainda mais sua conexão com o público europeu. “Como artista brasileiro imigrante, isso me dá gás pra continuar e me faz enxergar esse caminho de forma mais nítida possível”, ele comenta.
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Ao vivo e em constante movimento
Criatividade nunca foi problema para Leo Middea. Nos primeiros tempos em Portugal, ele compôs mais de 100 músicas em um único ano. Contudo, para ele, escrever era uma forma de desabafo: “Era tudo novo, tudo dando errado e certo ao mesmo tempo. Escrever era uma forma terapêutica de botar pra fora tudo o que estava preso”, nas palavras do próprio. Do volume de 100 composições, 12 foram escolhidas para o disco Gente, lançado em 2023.
Seu mais novo trabalho, Solo Nights (Live in Europe & Brasil), nasceu de registros ao vivo, com uma faixa escolhida por cidade onde Leo tocou, transformando, assim, cada lugar em memória afetiva.
Foi uma seleção muito difícil. Acabei escolhendo os momentos que minha memória guardava com mais afeto, aqueles que me faziam voltar para aquela hora de um jeito que despertava sentimentos que eu queria reviver.”
A nova fase também marca sua entrada no selo Esfera, uma parceria do LOCO Records com Paulo Novaes, com quem Leo dividiu as produções no disco Vicentina e também algumas composições.
É uma felicidade imensa. Estar em um selo é uma experiência muito especial porque permite compartilhar ideias e tirar o peso de estar fazendo tudo sozinho. Ter mais pessoas em volta, com vontade de trabalhar e fazer a parada acontecer, é muito bom. Tô animado para essa fase, e estar ao lado do Paulo Novaes, que já é meu amigo de anos e que produziu o disco Vicentina, torna tudo ainda mais especial. Feliz por esse novo ciclo!”
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E, certamente, as conquistas não pararam por aí. Afinal, em Julho deste ano, Leo levou seu repertório em português ao palco do prestigiado Montreux Jazz Festival, na Suíça, um festivais dos mais importantes do mundo. A apresentação marcou um dos momentos mais inesquecíveis de sua trajetória internacional até aqui.
De mochileiro a artista do mundo, Leo Middea construiu sua carreira desbravando caminhos que fogem do padrão. Assim, com coragem, criatividade e um violão como passaporte, sua música continua viajando mundo afora, levando o Brasil na bagagem. E, se depender do fôlego e da entrega que marcaram seus primeiros passos, os próximos capítulos prometem ser ainda mais surpreendentes, inegavelmente.
Ouça Leo Middea
Com 5 álbuns de estúdio e 2 discos gravados ao vivo, as músicas de Leo Middea estão disponíveis nas plataformas de streaming. Seu trabalho pode ser visto no Youtube e acompanhado pelo Instagram.
