Capital Inicial e Dinho Ouro Preto em 2024
Foto por Leo Aversa (via Divulgação)

Os próximos dias de Abril serão muito especiais para Dinho Ouro Preto. Afinal de contas, o vocalista do Capital Inicial, banda que completou 40 anos há pouco tempo, estará comemorando 60 anos no dia 27 — mas a festa acontece uma semana antes, no dia 20 de Abril, como parte do festival Música Urbana: 64 Anos de Brasília.

Conectado com o aniversário da cidade que deu origem não apenas à sua banda mas também a tantos outros ícones do Rock nacional, o evento receberá figuras importantes da cena local. Liderado pelo Capital Inicial, o line-up conta ainda com Zélia Duncan, Scalene, Plebe Rude Marcelo Bonfá, reeditando da melhor maneira possível um marco histórico de 1984.

Trata-se da edição inicial do Música Urbana, que aconteceu há 40 anos e reuniu justamente Capital Inicial, Plebe Rude e Legião Urbana no teatro do Colégio Alvorada, em Brasília, em um show tão inspirador que deu nome ao primeiro single de grande sucesso do Capital e também serviu como referência para toda uma geração do Rock nacional.

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Dinho Ouro Preto e os 40 anos de Música Urbana

Quatro décadas e muitos sucessos depois, Dinho Ouro Preto conversou com o TMDQA! em um papo exclusivo que tratou de diversos temas, incluindo a importância de resgatar esse evento no momento atual. Para o cantor, a ocasião não poderia ser mais especial:

Esse é um daquels momentos que, por essas várias datas, ainda mais nesse festival agora com Bonfá, com a Plebe, celebrando aquele show, é difícil você não olhar ou tentar fazer um retrospecto, fazer um balanço e pensar como é possível que a gente tenha chegado até aqui. Como é possível que a música da minha geração, da minha turma de Brasília, ainda encontre a ressonância? As pessoas a conhecem de diferentes idades, de diferentes regiões pelo Brasil inteiro. As pessoas sabem o que é.

Dinho continua, explicando por que é fundamental, na sua visão, relembrar as origens da banda e explicá-las para uma geração que pode nunca ter entendido como esse fenômeno do Rock de Brasília se formou.

Ele ainda mencionou o saudoso Renato Russo, que segundo o cantor foi responsável por fazer diversas das influências internacionais chegarem até os músicos da época:

Muitos ficam surpresos quando descobrem da improbabilidade, principalmente. Sabe, as pessoas mais jovens no Brasil têm dificuldade de entender exatamente qual era a situação do Rock no Brasil há 40 e poucos anos. Havia um vácuo muito grande, até das cenas locais, as diferentes cenas brasileiras que tinham muito pouco diálogo entre si – a gente não sabia da cena paulista, não sabia da cena gaúcha, carioca, mineira, a gente não sabia de nada. E shows gringos, então, eram raríssimos.

Houve uma explosão nesses 40 anos. Há 43, 44 anos, quando eu conheço o Aborto Elétrico, conheço a turma da Colina, o método que a gente tinha era o jornal – NME e Melody Maker, que chegavam na Cultura Inglesa, onde o Renato [Russo] trabalhava, dava aula de inglês. E quando alguém ia pra fora a gente pedia para que essa pessoa comprasse os discos; quando ele voltava, fazia fitas cassettes para todo mundo e distribuía.

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Eu nunca tive um disco dos [Sex] Pistols ou do Clash. Ramones chegou a vender uma vez! Acho que o ‘End of the Century’ apareceu nas lojas de discos, mas todas as outras bandas, os primeiros discos do Cure, essas coisas todas vieram através disso. Eu nunca tive os discos, eu tinhas as cassettes que alguém passava pra mim.

Filho de pai diplomata, Dinho Ouro Preto destaca que sua conexão também foi formada muito pelo período em que esteve fora do país – na ocasião, assistiu a shows de nomes como Uriah HeepPeter GabrielStatus Quo Scorpions, “todos em lugares pequenininhos”.

Na volta ao país, o vocalista se reencontrou com dois outros parceiros importantes da cena nacional: Herbert ViannaBi Ribeiro, ambos d’Os Paralamas do Sucesso e que foram os responsáveis por fazer sua transição das influências de sua mãe (nomes como Bob DylanDavid Bowie) para o Rock mais pesado de Led ZeppelinDeep Purple Jimi Hendrix.

E é neste contexto que entra a Turma da Colina – um movimento cujo nome se deriva do local reservado para moradia de pessoas ligadas à Universidade de Brasília e que se tornou responsável pelo surgimento das bandas citadas acima: Capital Inicial, Plebe Rude, Os Paralamas do Sucesso (que, apesar da ligação com Brasília, surgiram de fato no Rio de Janeiro) e Legião Urbana.

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Turma da Colina e a ascensão do Rock nacional

A Colina, no caso, não foi usada como nome meramente ilustrativo para designar a tal Turma. Conforme explica Ouro Preto, eram essas cerca de 30 pessoas “ligadas à UnB, ou das proximidades da UnB” que faziam parte de um coletivo embasado no movimento Punk Rock e na cultura do “faça você mesmo”:

O mote dessa turma era do Punk Rock, ‘faça você mesmo’. Então, em volta deles, foi criada uma bola de neve com cada vez mais gente sendo atraída pela música, principalmente do Aborto Elétrico e da Plebe Rude. Contagiou a galera, e Brasília virou a capital do Rock. Mas no começo, quando a gente vê o Aborto Elétrico pela primeira vez, era circunscrito a um número muito pequeno – deviam ser, cara, 30 pessoas.

E as primeiras pessoas que aparecem que não fazem parte desse grupo, que não têm nada a ver com a origem deles, com a Colina, com as quadras em volta, somos nós: eu, Dado [Villa-Lobos] e o Pedro, irmão do Bi. Isso deve ter sido no final de 80, há 44 anos. E a partir daí, outras pessoas começam a se interessar, começam a ouvir, eles começam a puxar, fazem um marketing muito bom – começaram a pichar o A do Aborto Elétrico com o A de anarquia pelas paradas de ônibus da cidade e nos blocos, nas pilastras.

Eles picharam o bloco da nossa quadra! Falamos, ‘Caraca, que porra é essa?’. E aí a gente vai atrás e vê o primeiro show deles.

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“Eu sou de uma geração com sucessivas frustrações”

Como mostra o vídeo acima, parte do MTV Especial: Aborto Elétrico, de 2005, mesmo a mudança de nome não tirou a importância desta fase para a banda de Dinho e companhia. Para além das músicas que sobreviveram ao teste do tempo, outro ponto que permanece firme na trajetória de Dinho Ouro Preto é seu envolvimento com a política.

A mudança, no entanto, se dá na forma como essa política é feita. Se no passado a Turma da Colina se manifestava através de pichações anárquicas, hoje o vocalista parece deixar esse tipo de demonstração para um público mais jovem, enquanto se pronuncia e se mantém envolvido de outras formas. Questionado sobre isso, Dinho aponta as dificuldades em manter um discurso equilibrado no meio das redes sociais:

Eu acredito que as redes sociais tendem primeiro à histeria e depois a um certo maniqueísmo. É difícil você buscar equilíbrio, sabe? E talvez você pode argumentar que isso é fruto da polarização que caracteriza a política do mundo hoje em dia. Porém, quando você lê os números que o Datafolha, por exemplo, divulga, você vê que tem, no caso brasileiro, por exemplo, um terço dos brasileiros se identificando como petistas e um quarto dos brasileiros que se identificam como bolsonaristas.

Acho que não dá para caracterizar o PT como partido de extrema esquerda – existem várias tendências dentro do PT, com certeza há tendências mais extremistas, mas não se compara ao PCO, por exemplo, sabe? Eu vejo a grande maioria como um centro esquerda. No entanto, somando esses dois grupos, você tem 45% dos brasileiros que não são nem uma coisa nem outra.

Eu acredito que isso caracteriza o Brasil. Uma disposição ao diálogo, à procura de consensos, à procura de um meio-termo. Eu acredito que talvez isso seja uma amostra de maturidade política do Brasil, sabe?

Claramente empolgado ao falar sobre o tema — como, na verdade, parece estar durante toda a conversa —, Dinho Ouro Preto recobra o raciocínio com uma conclusão interessante:

Onde eu quero chegar é o seguinte: eu me considero uma pessoa de centro-esquerda. Se eu fosse europeu, seria social-democrata. É importante você não deslegitimizar o teu antagonista, quem discorda de você, sabe? A menos que o cara tente dar um golpe, aí a conversa é outra.

Voltando ao tema do Música Urbana, outro ponto curioso da conversa com Dinho é justamente a ponte entre 1984 e 2024 no espectro político. Ele conta como as suas próprias experiências são de frustração e explica que, apesar da chateação com isso, entende que tudo faz parte do processo democrático:

É curioso como a gente achou – eu achei, jovem, que bastaria a redemocratização do Brasil para que o Brasil prosperasse. Depois, quando veio o Real, eu achei, ‘Pronto, agora fica bom’. Depois o Lula se elegeu, agora vai. Ou seja, eu sou de uma geração com sucessivas frustrações. E no entanto, em uma democracia, ao contrário justamente de um regime autocrático, as melhoras são incrementais, são frustrantemente lentas.

É muito fácil para um país como a China, onde você não tem direitos trabalhistas, por exemplo. É um ‘milagre’, um ‘milagre’ com explicações muito claras, né? O que eu acho talvez muito frustrante é porque, ao mesmo tempo, você tem outras democracias que conseguiram; você tem, por exemplo, a Coreia [do Sul]. Como é possível? E isso foi feito no espaço de 30 anos. Aonde a gente está errando?

A resposta a essa pergunta, infelizmente, nem Dinho Ouro Preto nem muito menos este que escreve têm. Por enquanto, o que resta é seguirmos fazendo nossas partes da melhor maneira possível, e celebrar a Música Urbana e sua história é entender um capítulo importante não apenas do Rock brasileiro, como de toda a história do país, da música à política.

Logo abaixo, você confere todas as informações sobre o evento Música Urbana: 64 Anos de Brasília, e os últimos ingressos disponíveis podem ser adquiridos neste link.

Serviço – Música Urbana

Serviço:
Música Urbana: 64 Anos de Brasília
– Capital Inicial
– ⁠Scalene
– ⁠Plebe Rude
– Zélia Duncan
– Marcelo Bonfá (Legião Urbana)

Data: 20 de abril
Local: Arena BRB Nilson Nelson
Endereço: SRPN – Brasília, DF, 70297-400
Ingressos e informações: https://www.eventim.com.br/artist/capital-inicial/?affiliate=87F

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