Samara Joy no C6 Fest Rio de Janeiro 2023
Samara Joy (Crédito: Diego Castanho)

Samara Joy talvez tenha chamado a atenção da maioria dos brasileiros ao vencer Anitta no Grammy, no início de 2023. Porém, a cantora novaiorquina já vinha causando no mundo do jazz ao trazer certa jovialidade para um repertório antigo.

O que gerou comparações com Ella Fitzgerald e Sarah Vaughan foi seu domínio vocal; porém, sua personalidade está em sintonia com sua geração. Tanto que, com apenas 23 anos, Samara começou a se destacar no TikTok, onde conseguiu a façanha de viralizar cantando Jazz.

Samara Joy segue colhendo os frutos de seu ótimo ano e veio ao Brasil pela primeira vez para se apresentar no C6 Fest, evento que aconteceu no Rio de Janeiro e São Paulo quase simultaneamente. Durante essa passagem pelo país, lançou uma versão deluxe do álbum que quebrou todas as barreiras da sua música.

Samara Joy: um talento em ascensão

Linger Awhile é um disco que somou a uma trajetória já surpreendente. Ainda em 2019, Samara despontava como vencedora da conceituada competição anual e internacional de Jazz vocal Sarah Vaughan. No ano seguinte, ganhou a bolsa Ella Fitzgerald Memorial.

Depois do primeiro álbum, homônimo, Joy foi eleita a artista revelação pela JazzTimes. O segundo trabalho, lançado em 2022, solidificou sua posição como uma voz que evoca as divas do passado, porém com uma conexão real com os ouvintes do presente.

Recapitulando esses impressionantes últimos meses, a artista conversou com o Tenho Mais Discos Que Amigos! no camarim antes do show no Rio de Janeiro – uma apresentação que arrebatou a plateia, conforme você fica sabendo na nossa resenha do festival.

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TMDQA! Entrevista: Samara Joy

TMDQA!: Samara, estamos felizes em te receber aqui no Brasil. Está se divertindo até o momento?

Samara Joy: Estou sim. Chegamos aqui ontem e já vimos o Cristo Redentor e o Pão de Açúcar. Comi feijoada e tomei caipirinha, então tá tudo ótimo.

TMDQA!: Isso é tipo “Brasil para iniciantes”.

Samara: É! (risos)

TMDQA!: Mas como o Brasil está te tratando? Porque os brasileiros não foram tão legais com você no início…

Samara: Ah, sabe como é, eu entendo. E até o momento tem sido muito agradável. Eu até preciso mandar mensagem pra Anitta, porque eu falei pra ela que estava vindo e ela falou pra avisar. Então vou avisar e ver o que acontece, talvez a gente se esbarre em algum momento. Mas todo mundo tem sido muito legal.

TMDQA!: É que a gente é apaixonado. Às vezes, até demais (risos).

Samara: É, mas isso é o que torna o Brasil tão incrível. É essa paixão.

TMDQA!: Falando nisso de Grammy… Parece que hoje em dia, seu nome é sempre precedido por adjetivos assim, como “vencedora do Grammy” ou “cantora jovem”. Ótimo, nada mal! Porém, há algo que você gostaria que as pessoas enxergassem para além desses predicados?

Samara: Uhm… Bem, acho que quero que as pessoas entendam que eu não penso que já estou bem-sucedida. Estou crescendo, tenho muitos objetivos que quero realizar nessa jornada longa. É incrível que isso tenha acontecido, sabe? O Grammy, a atenção e o apoio de muita gente. Mas espero que as pessoas entendam que ainda estou trabalhando em direção aos meus sonhos. Sou um trabalho em progresso.

TMDQA!: E não somos todos?

Samara: Uhum.

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TMDQA!: Falando no seu disco vencedor do Grammy, acaba de sair uma edição de luxo muito bonita. Já era um álbum bem profundo. O que te fez desejar adicionar mais camadas a ele?

Samara: Sabe, quando gravamos em março de 2022, eu me lembro de escolher um monte de músicas que eu amo e queria gravar. Mas no final, na primeira edição do disco, queríamos que fosse uma apresentação mais clara e direta para as pessoas, então deixamos algumas coisas de fora. Agora que as pessoas já me conheceram por meio desse álbum, eu quis mostrar um outro lado – ou pelo menos, mais canções que entraram no processo de fazê-lo.

TMDQA!: Ah, eu não estou reclamando! Mas Linger Awhile me faz pensar em alguém que quer ficar por aqui um tempo. Como você falou, ainda não concluiu seus objetivos. Então esse é o objetivo final – fazer tudo isso durar o máximo de tempo possível?

Samara: É sim. Sabe, muitas pessoas e artistas que admiro, elas têm carreiras muito longas e fases diferentes, onde experimentam coisas novas criativamente falando, para mostrar o fato de que estão amadurecendo como artistas e que estão pegando o que está ao seu redor e se inspirando para criar e até mostrar lados diferentes de si. Eu quero que seja um processo longo, não acabou (risos). Isso é só o começo, então vou ficar por aqui um tempo.

TMDQA!: A gente estava falando dos seus dias aqui no Rio, vi suas fotos e vídeos no Instagram. O que mais te surpreendeu na cidade?

Samara: O que me surpreendeu mais? Ah, hoje eu encontrei uns macacos e eles tentaram correr atrás de mim (risos)! Mas o que mais me surpreendeu… bom, acho que o senso de comunidade. Nos Estados Unidos, é mais fácil para as pessoas ficarem nas suas próprias áreas, sem se importar com ninguém ao seu redor. Aqui, as pessoas formam comunidades, todo mundo come junto, ou vai ao Pão de Açúcar, ou sai pra andar na praia… Eu amei a comunidade.

TMDQA!: Mas olha, eu diria que macacos te perseguindo no meio da rua… Já é bem impressionante!

Samara: Ufa [faz cara de alívio]! Eu acho que eles queriam fazer amizade e ir comigo pra casa nos EUA ou algo assim (risos).

TMDQA!: Eu vi que você foi entrevistada pelo Djavan! Você já conhecia o trabalho dele? Tem alguma conexão com a música brasileira?

Samara: Eu o descobri através de um amigo meu. Ele me mostrou seu disco A Voz, o Violão, a Música de Djavan. E eu fiquei tipo, “Meu Deus, eu amei isso”. Eu não tinha ouvido falar nele até escutar esse álbum, então quando ouvi, aprendi a cantar “Flor de Lis”. Fiquei muito feliz que a gente conseguiu se conectar e vou vê-lo amanhã em um show pela primeira vez, em São Paulo. Vai ser ótimo!

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TMDQA!: Com certeza. A gente estava falando sobre como as pessoas comentam sobre você ser jovem e muito realizada. E você faz parte de uma leva de novas cantoras e músicos que levam o Jazz a outros jovens. O que você diria que separa sua geração das anteriores?

Samara: Eu acho que minha geração tem acesso à música através dos nossos telefones. Em gerações passadas, já havia muita música, mas não dava pra acessar no toque de um botão; tinha que comprar um CD, algo assim. Então, hoje há tanta música no mundo para a minha geração consumir e se inspirar sem precisar sair de casa. É ótimo. É uma geração que tem uma apreciação por todos os tipos de música. Então fico feliz de ter entrado no TikTok sem pensar que atrairia muita atenção. Mas isso prova como é importante expor todo mundo – não só os jovens, mas todos – a todo tipo de música.

TMDQA!: Claro. E até pensando nesse aspecto geracional, só de olhar a lista de músicas do seu álbum, há um panorama vasto de standards de Jazz. Resumindo: há opções infinitas. Como você escolhe um repertório?

Samara: Pra mim é meio aleatório, para falar a verdade. Porque eu ouço, por exemplo, Sarah Vaughan. Aí digamos que eu escute uma música e pense, “Ela está incrível, mas os músicos são sensacionais. Quem está tocando com ela? Quem é o baterista? E no piano? Ah, o nome dele é Ronnell Bright. Ah, ele compôs ‘Sweet Pumpkin’. Ah, eu amo essa música”. Sabe? É meio efeito dominó, meu método de pesquisa. Mas quando eu ouço muito um artista – Thelonious Monk, Sarah Vaughan, Ella [Fitzgerald] – a inspiração vem. Eu sou um pouco… não sei se “selvagem” é a palavra certa, mas eu gosto de muita coisa. E se eu ouço uma melodia ou algo assim que me interesse, eu vou querer fazer. É só isso.

TMDQA!: E você citou Sarah, Ella… Essas são algumas das maiores vozes de todos os tempos, e agora você está sendo comparada a elas. Essas comparações te deixam orgulhosa ou enfurecida?

Samara: Ah, não! Não sei se daria pra me deixar brava com isso. Sou grata que as pessoas pensam em mim nesse nível, considerando o que essas duas realizaram – e também Betty Carter e Carmen McRae -, o que elas fizeram pelo som do jazz e sobre como ele poderia soar, suas possibilidades. Me sinto honrada. Ao mesmo tempo, espero que as pessoas entendam que não sou elas. Não sou tão boa quanto elas ainda, mas espero que um dia seja!

TMDQA!: Um dia. Um trabalho em progresso, não é isso?

Samara: Trabalho em progresso, é isso.

TMDQA!: E você estava falando do aspecto comunitário do Brasil, né? O Brasil ama Jazz, mas ainda não é acessível para todos. Não vou te pedir pra solucionar isso (risos), mas quais saídas você diria que são possíveis pra tornar o Jazz um gênero mais acessível para as pessoas?

Samara: Eu diria que todos que conheci aqui tem feito um ótimo trabalho de realizar festivais e trazer pessoas não só dos EUA, mas também apoiar artistas brasileiros. Acho que a melhor forma é manter como parte das comunidades, em eventos, nas escolas, esse tipo de coisa. É manter o Jazz vivo, mostrar que estamos apoiando os artistas e o público também.

TMDQA!: Isso. Agora, voltando para aquela tracklist, se você só olhar o título das músicas, dá pra dizer que são mini-contos. A música é uma ótima ferramenta para contar histórias. Você escolhe as canções com base nas histórias das letras? E que tipo de histórias você quer contar com o seu trabalho?

Samara: Sim, letras e histórias são importantes para mim. Quero ter certeza de que quando estou cantando, não seja apenas sobre o que consigo fazer com minha voz, mas como posso usar meu vocal para contar uma história. E o que eu quero contar é que estamos conectados. Todos temos experiências humanas compartilhadas, independente de onde você é. E se notássemos mais o que nos une, não teríamos tanto tempo para focar no que nos separa.

TMDQA!: Que lindo isso. Você tem mais discos que amigos?

Samara: Olha, é bem por aí… Agora que estou pensando nisso… Mas tudo bem, os discos são meus amigos.

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TMDQA!: Claro, quanto mais melhor. Esse disco te levou a experiências inimagináveis. E agora, qual o próximo passo para você?

Samara: O futuro? Espero elevar todos ao meu redor. Estou vivenciando todas essas bênçãos, e agora eu quero compartilhar e devolver para a comunidade que me elevou e me apoiou nessa jornada. Pode significar cantar com minha família ou me doar para minha antiga escola. Tudo que eu faço, quero que tenha um propósito e tenha intenção. Que não seja apenas para fazer dinheiro, mas com o objetivo de ter um legado, gentileza e de entrega às pessoas.

TMDQA!: E o resto virá por acréscimo.

Samara: Com certeza.

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