
Poucas artistas contemporâneas têm a ousadia e a base técnica para realizar uma virada radical como a de ROSALÍA em LUX. Lançado após o frenesi dançante e tropical de MOTOMAMI, seu quarto álbum de estúdio é menos um disco pop e mais um manifesto de avant-garde clássica, que exige – e recompensa – cada minuto de atenção do ouvinte.
Se a indústria em 2025 pede faixas feitas para o algoritmo e implora por virais em redes sociais, a artista catalã estava ocupada gravando com a London Symphony Orchestra (LSO) e Björk, provando que o pop ainda pode ser uma arte de verticalidade e profundidade. O resultado é um álbum que soa como absolutamente nada mais na música atual – e realmente, não é um exagero dizer isso.
Com 15 faixas divididas em quatro movimentos, cantadas em 13 diferentes idiomas – incluindo até mesmo o latim -, LUX é a ópera espiritual de uma artista em plena ascensão mitológica. O TMDQA! ouviu o disco, e conta tudo a respeito para você.
Continua após o vídeo
A Promessa Cumprida – e o Pop que transcende limites
A temática de LUX não é apenas o fim de um noivado (o término com Rauw Alejandro em 2023 é a ferida aberta do álbum), mas a busca por um propósito eterno, inspirado pelas hagiografias de santas femininas. ROSALÍA, com sua formação em flamenco de conservatório (ESMUC), usa esse arcabouço histórico para explorar o amor, o luto, a luxúria e a espiritualidade.
O álbum se inicia com o convite de “Sexo, Violencia y Llantas”, onde ela declara o plano de atravessar a vida e a morte:
“Quão bom seria viver entre os dois / Primeiro amarei o mundo, depois amarei Deus”
O disco então se desdobra em canções que são simultaneamente íntimas e monumentais, onde o ouvinte depara-se com um lirismo cortante e profundamente vulnerável. Em “Reliquia”, a artista lamenta as partes de si mesma perdidas em viagens, concluindo: “Meu coração nunca foi meu / Eu sempre o distribuo / Pegue um pedaço de mim / Guarde-o para quando eu estiver ausente”. É uma autorrevelação crua.
Continua após o vídeo
Caos Orquestrado com lampejos de genialismo
A confusão sonora que poderia advir da fusão de cordas barrocas, fado, opera e eletrônica é evitada pela precisão de um caos agente que sabe exatamente o que quer. A produção é frequentemente minimalista para que sua voz, tal como Édith Piaf, permaneça no centro.
A “seriedade” do clássico é constantemente subvertida pela irreverência pop. “Berghain”, o primeiro single, divide críticos clássicos com seu coro dramático e órgão pulsante, mas é coroado pelo vocal operático em alemão e o sample de Yves Tumor (citando a fala de Mike Tyson), além da participação etérea de Björk.
“Mio Cristo Piange Diamanti”, uma canção em italiano, demonstra a ginástica vocal da catalã, que muda de um belt gutural para um lamento – antes de quebrar a quarta parede e rir no microfone para aliviar a tensão. Já em “La Perla”, ao lado de Yahritza, destila uma série de insultos deliciosamente em desacordo com a melodia de valsa alegre.
“La decepción local, rompecorazones nacional
Un terrorista emocional, el mayor desastre mundial
Es una perla, nadie se fía
Es una perla, una de mucho cuida’o”
Caminhando para a libertação, a liberdade e a transcendência são o objetivo, resumidos pela fala em “La Yugular” (sample de Patti Smith): “Sete céus? Que grande coisa! / Eu quero ver o oitavo céu, o décimo céu, o milésimo céu / Sabe, é tipo… atravessar para o outro lado!”.
Continua após o vídeo
ROSALÍA: a consagração
LUX não é apenas um álbum musical, mas um ato de desafio artístico. Em um cenário dominado pela segurança algorítmica, ROSALÍA questiona o que o pop pode ser, ecoando as lições de nomes como Kate Bush.
O álbum se encerra na sombria, mas esperançosa, “Magnolias”, onde a flor do casamento adorna o caixão imaginado da artista. “Eu venho das estrelas, mas hoje me transformo em pó para voltar a elas”, canta – uma aceitação da mortalidade que concede a imortalidade artística.
LUX é uma obra-prima: um álbum completamente singular que é intenso, maximalista e, acima de tudo, corajoso. Ele não quer ser consumido; quer ser sentido, reescrevendo o livro de regras da música pop ao se recusar a seguir qualquer regra. É um convite a desligar a dopamina e mergulhar na luz.
★★★★★ (5/5)
OUÇA AGORA MESMO A PLAYLIST TMDQA! LANÇAMENTOS
Quer ficar por dentro dos principais lançamentos nacionais e internacionais? Siga a Playlist TMDQA! Lançamentos e descubra o que há de melhor do mainstream ao underground; aproveite e siga o TMDQA! no Spotify!