John estreia com álbum que transforma amores "Na Trave"
Em conversa com o TMDQA!, o cantor revela a saída do Direito, o incêndio que adiou tudo, a força da banda em estúdio e o vídeo viral em que pediu para namorada morar com ele
O “ex-advogado” capixaba John viu sua vida mudar depois de um vídeo gravado ao lado da namorada, AmandaVieira: ele canta uma composição olhando nos olhos dela, parece anunciar um término… até revelar que quer mudar de vida e levar ela junto.
A reação viralizou com milhões de visualizações, conquistando novos ouvintes e chamando atenção de nomes como Seu Jorge. A faixa faz parte do álbum de estreia do cantor e compositor, intitulado “Na Trave”, onde transforma amores em canções pop cheias de samba.
O TMDQA! conversou com o artista sobre a trajetória cheia de reviravoltas que o levou até este primeiro lançamento: um álbum dançante e divertido, que conecta diferentes momentos de sua vida e abre uma fase inédita, com histórias sinceras, ska, samba, pop e tempero de axé.
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Entre composições recentes e outras guardadas desde a adolescência, John costura um tema que batizou de “Na Trave”: relações imperfeitas, paixões platônicas e boas histórias.
“A primeira faixa, ‘Domingo em Paz’, eu compus com 15 anos. Fui juntando letras que falavam de um mesmo lugar e isso virou o fio do disco”.
A base vem do violão e da voz. Simples no nascimento, complexa no resultado.
“Eu componho sempre em voz e violão. Não sou virtuoso no instrumento, então os arranjos crescem depois.”
Esse “depois” quase não aconteceu. Em 2020, antes de pensar no primeiro álbum, John já preparava seu primeiro EP no estúdio recém-construído pelo irmão, Jackson Pinheiro, baixista que já tocou com Supercombo e Silva, hoje dedicado à mixagem.
Mas uma fatalidade adiou tudo: o estúdio pegou fogo, e os planos que já estavam em andamento precisaram ser interrompidos por anos.
“Minhas primeiras músicas, todas eram produção do Jack, e em 2020 não foi diferente. Ele tinha acabado de construir um estúdio, era o sonho dele, a gente fez as guias lá, só que aí teve uma fatalidade. Depois de anos que ele conseguiu construir o estúdio, teve um acidente lá, e o estúdio pegou fogo.”
Foram quase 3 anos esperando o estúdio se reerguer, e no caminho John seguiu compondo, fazendo parcerias e criando. Sem conseguir avançar no cronograma do álbum, John pediu benção ao irmão para tentar um single com o baiano Peu, produtor, guitarrista e cantor da banda AôA.
Nasceu“Energia Rara”, com influências musicais da cidade do co-autor e fruto do Bloco do John, projeto paralelo de axé que lotou carnavais e lapidou entrosamento com músicos.
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A caminhada musical de John
Deu tão certo que veio a ideia do próprio Jackson: fazer o álbum com o Peu. A primeira versão não ficou do jeito que John gostaria.A solução? Recomeçar com banda em estúdio, feita nos estúdios da Hitmaker.
“Pouca gente é tão livre de ego quanto o Peu. Eu falei: ‘Vamos passar uma borracha e gravar do zero, com banda, todo mundo junto?’ E ele topou na hora”.
O resultado é uma produção caprichada: gravações limpas, som orgânico com balanço de palco, personalidade e espaço real para a banda criar. John participou ativamente do processo e foi creditado por Peu como coprodutor. A mixagem é um diferencial; tudo se ouve com clareza e em harmonia, sem atropelos.
Entre as faixas, “Na Trave”, que dá nome ao álbum, traz uma nostalgia cheia de nuances e delicadezas até desembocar num refrão que convida a dançar. “Seu Lugar” aposta num reggae cantante, com baixo marcado e astral pra cima. “Dessa Vez Cê Fica” evidencia a assinatura do baiano Peu, em linha com trabalhos que ele já fez na AôA. E “De Novo (vou lhe amar)” também merece o play.
O vídeo que parecia um término
No vídeo que mudou sua carreira, John olha nos olhos da namorada, Amanda, e começa sério, recitando a letra de “Preciso Mudar“, a sexta música do álbum:
“Hoje eu percebi que eu não tô bem / Vi que você percebeu também / Faz tempo, eu não me sinto mais o mesmo / Quero ir atrás do que eu desejo / Sei que tudo isso te faz mal / Que você merece muito mais/ Não dá pra fingir que tá normal / Quero ter de volta aquela paz”…
Ela vai desmontando aos poucos, a câmera registra cada segundo da aflição. Até que vem a reviravolta:
“Quero me mudar… mas levo você.”
O vídeo ultrapassou 9,3 milhões de visualizações no Reels, puxando milhares de pessoas para o trabalho recém-lançado do cantor, inclusive Seu Jorge, que comentou dizendo que a música era “muito boa”.
O autor conta sobre a reação espontânea da namorada:
“Eu sabia que ela ia ficar em dúvida. A Amanda presta atenção em tudo, observa cada detalhe. Eu queria que fosse especial e que mostrasse essa virada na minha vida”.
Uma mudança que também é pessoal
Desde que saiu do Espírito Santo, John nunca havia morado sozinho. Dividia a casa com dois amigos músicos e, com o tempo, percebeu que precisava de uma nova fase. Passou um ano ansioso, esperando o álbum ficar pronto, sem saber quando conseguiria seguir adiante.
A ideia de “Preciso Mudar” nasceu exatamente nesse ponto de virada: quando ele decidiu mudar de casa, organizar a própria vida e dar o próximo passo na carreira, levando com ele quem faz parte do seu caminho. Apesar do pedido, o casal ainda não está morando junto.
Inspirada em “Você Não Entende Nada”, de Caetano Veloso, “Preciso Mudar”usa o mesmo truque narrativo: começa com um ar de ruptura, mas rapidamente revela outra intenção. Em vez de fim, é um pedido de parceria. A letra inverte a expectativa do ouvinte ao mostrar que a mudança não é sobre se afastar, e sim sobre evoluir ao lado de quem se ama. O vídeo foi postado depois do lançamento do álbum, uma estratégia certeira.
“O viral levou as pessoas para o disco inteiro. As pessoas começaram a ver os vídeos do YouTube, a se inscrever no canal. Tudo que eu fiz fez sentido, e o impacto foi exatamente como eu esperava.”
No álbum Na Trave, essa virada vira estética: tem ska, samba, indie, ecos de Jorge Ben e uma MPB moderna com coreto e pista juntos. “É um álbum orgânico e bonito, do jeito que eu sempre quis”, resume. Os números comprovam o interesse: foram 26 mil salvamentos do álbum e 10 mil playlists adicionadas em poucas semanas do viral.
Trajetória de ex-advogado
A história de John na música começou cedo. Aos 10 anos, ele venceu um festival de música no interior do Espírito Santo, competindo com adultos, numa família grande e com poucos recursos, onde a música sempre foi esperança. No ensino médio, estudou em um colégio federal interno com foco em agropecuária, mas com aulas complementares de artes. Ali aprendeu violão, formou banda, compôs suas próprias músicas e descobriu a arte da liderança no grêmio estudantil, onde participava de simulações de tribunais.
O plano seguro veio com a faculdade de Direito. Saiu de sua cidade para estudar em Minas Gerais, quando conseguiu um patrocínio para cursar faculdade e moradia. Começou a cantar em barzinhos para os custos adicionais, até que o apoio acabou, seis meses depois. Voltou ao Espírito Santo, fez cursinho e conquistou uma bolsa para estudar em São Paulo.
Na capital, morou primeiro com o irmão, Jackson, e dividiu os dias entre estágio em escritórios e barzinhos à noite. Quando Jackson voltou para Vitória, o irmão passou a viver em repúblicas e pensões na capital paulista, ainda tentando fazer conexões na música. Até que o amigo Enzo o levou ao Raposa do Alasca, um boteco que nem tinha som ao vivo. Eles ofereceram uma caixa de som e ganharam o palco.
“No começo, era só cerveja”, ele lembra. O público cresceu tanto que vieram cachês e noites com mais de 500 pessoas.
“Sem coragem pra dizer que sou artista”
A virada de chave veio em 2019, vendo de dentro os bastidores da vida de artistas em seus projetos – entre eles, SóCiro, Silva e André Prando. A realidade bateu na porta quando ele estava em um pós-show cheio de músicos e precisava ir embora porque tinha que acordar cedo no dia seguinte para ir ao escritório. Esse foi o momento em que ele sentiu que não tinha experiências como um artista.
“As pessoas me perguntavam o que que eu era, eu não tinha coragem de falar que eu era artista, porque eu senti que eu não tinha experiências como artista. E aí, quando eu larguei o escritório teve a pandemia. Foi difícil, mas comecei a fazer coisas de artista, conhecer mais artistas, viver mais experiências, gravar… Essas experiências que eu vivi em 2019 me fizeram querer largar o escritório para poder viver de música.”
Voltou para o básico: cantar onde desse, construir degrau por degrau, do bar ao corporativo, do bloco ao autoral. “Tudo que eu começo parece muito longe, mas eu sempre penso no próximo passo.”
As referências ajudam a entender o mapa afetivo: Gil, Caetano, Chico, Milton, Nação Zumbi, o suingue de Seu Jorge (de quem “Domingo em Paz” já vestiu a pele samba-rock). Entre os pares da geração, ele cita Zé Ibarra e reforça a admiração por André Prando, presente no fecho do álbum com “Choro Plebeu”.
“Eu interpretei essa música como um amuleto, lá atrás. Não queria terminar o disco triste. Liguei para o Prando e ele topou gravar a versão acústica. Ficou linda.”
No horizonte? Festivais e palcos maiores. A base, ele já tem: uma banda afiada, a produção partilhada com Peu e um repertório que sabe onde quer chegar. “É um álbum de banda sendo banda”, resume. E de histórias que quase foram, até virarem música.
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Liz Sacramento é jornalista há 10 anos e cantora. Já passou por grandes telejornais da TV aberta, e atualmente atua como correspondente internacional. Ao longo da carreira, percorreu diversos estados do país cobrindo grandes eventos, política, cultura e meio ambiente. Com paixão pela música, pesquisa trajetórias sonoras marcadas por autenticidade, identidade e transformação social. Sempre sonhou em unir jornalismo e música, e para isso tem se dedicado a escrever sobre narrativas que celebram a música preta, brasileira e global.
Liz Sacramento é jornalista há 10 anos e cantora. Já passou por grandes telejornais da TV aberta, e atualmente atua como correspondente internacional. Ao longo da carreira, percorreu diversos estados do país cobrindo grandes eventos, política, cultura e meio ambiente. Com paixão pela música, pesquisa trajetórias sonoras marcadas por autenticidade, identidade e transformação social. Sempre sonhou em unir jornalismo e música, e para isso tem se dedicado a escrever sobre narrativas que celebram a música preta, brasileira e global.
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