
Desde 1990, o rap ocupava pelo menos uma posição entre as 40 músicas mais populares dos Estados Unidos. Essa presença ininterrupta chegou ao fim em outubro de 2025. Pela primeira vez em 35 anos, nenhum rapper apareceu no Top 40 da Billboard Hot 100.
Mas o que esse dado realmente significa? Será que o rap tem perdido sua relevância ou estamos diante de um momento que revela mais sobre os critérios da indústria e o tipo de cultura que domina as paradas hoje?
À primeira vista, pode parecer uma crise criativa. Mas, olhando com calma, é possível ver que o que está em jogo não é a qualidade da música ou o interesse do público. O que mudou foi a maneira como o sistema funciona e o que ele escolhe destacar.
Mudança na metolodogia
A principal responsável por esse marco foi uma mudança técnica na metodologia da Billboard. A nova regra elimina automaticamente da contagem as músicas que passam de 26 semanas na parada e caem abaixo da 25ª colocação. Foi assim que “Luther”, hit de Kendrick Lamar e SZA que chegou ao topo da parada por 13 semanas, saiu da lista mesmo ainda estando entre as 40 mais tocadas.
Esse ajuste de critérios já seria suficiente para alterar o cenário. Mas somado a isso, as paradas estão completamente dominadas por grandes lançamentos de artistas pop. Recentemente, todas as 12 músicas do novo álbum de Taylor Swift estavam no Top 40. Isso reduz drasticamente o espaço para qualquer outro gênero respirar, inclusive o rap.
Isso não é novo, mas escancara como o espaço nas paradas hoje depende menos da diversidade de consumo e mais da força de marketing e mobilização de fandoms ultra-engajados.
Rappers em baixa?
Nesse período, não faltaram lançamentos. Singles de artistas como Drake, Kid Cudi, Cardi B e YoungBoy Never Broke Again surgiram nas últimas semanas. Alguns até bateram na trave, mas nenhum conseguiu furar a bolha.
Muito se falou que o sumiço do rap se deve à ausência de novos álbuns dos grandes nomes. Mas essa leitura ignora um ponto importante: não é papel de um ou dois artistas sustentar sozinho a força de um gênero. A indústria ficou dependente demais de figuras como Drake e Kendrick Lamar. E, por outro lado, deixou de investir de forma estruturada na construção de novas trajetórias.
Parte dessa falha está na forma como o rap tem sido tratado nos últimos anos: como conteúdo, não como arte. A lógica da viralização engoliu o processo criativo —o que também tem afetado o Brasil, mas deixarei o debate para outro texto. Hoje, a prioridade passou a ser produzir sons de 15 segundos que funcionem nas redes sociais ou atendam às demandas das plataformas de streaming.
A indústria preferiu apostar no hype de curto prazo a construir jornadas consistentes, e isso cobra um preço.
O rap está lá, mas de outra maneira
O mais irônico de tudo é que o som do rap segue presente no Top 40. Taylor Swift canta sobre batidas trap. Morgan Wallen flerta com flows do gênero. Já Justin Bieber exibe letras que são praticamente braggadocio de rapper. Ou seja, o rap continua ali, mas absorvido e reapresentado por artistas de outros gêneros.
Como provocou um texto interessante do site Stereogum, isso seria uma nova forma de colonialismo cultural? Se o som do rap segue vendendo, mas os artistas que o criaram estão fora da equação, de que tipo de apagamento estamos falando?
Mas, no fundo, a ausência do rap no Top 40 pode ser um chamado. Um lembrete de que o rap nunca precisou da validação da Billboard para existir. “Alright”, de Kendrick, nunca chegou na lista e é um hino histórico. As músicas mais importantes do gênero muitas vezes nem chegaram perto de figurar entre as 40 mais tocadas. E isso nunca diminuiu sua relevância.
O Top 40 da Billboard nunca foi um bom termômetro para medir a grandeza do rap. A lógica de medir relevância apenas por números, certificados e posições nas paradas é um erro de perspectiva. E se você é um artista de rap, faça música foda. Música que seja foda pra gente, e não para os outros.
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A coluna que mergulha nas histórias, letras e batidas que estão redefinindo o cenário musical do Rap. Acompanhe de perto os lançamentos e a força das rimas que ecoam pelas ruas.
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