
Texto por Gui Beck e fotos por Rafael Beck
Existem mil maneiras de falar de música e outras mil de curtir um show ao vivo. Faremos hoje aqui um modesto estudo de caso (e portanto, sem ambições de chegar a qualquer conclusão, vejam bem), uma comparação entre duas experiências das mais distintas ocorrendo dentro de um mesmo Festival.
O evento em questão: o mega Festival South by Southwest, ou SXSW, em Austin (capital do estado do Texas e autoproclamada “Capital da Música ao Vivo” dos Estados Unidos), que acontece anualmente desde 1987 por lá, unindo música, cinema, tecnologia e inovação de uma forma geral, além de juntar muita gente de vários lugares diferentes do mundo pra trocar idéia e apreciar essas atrações todas durante alguns dias.
Mais especificamente, nosso estudo se debruçou sobre dois pequenos festivais dentro do Festival, promovidos por dois icônicos (ainda que cada um à sua maneira e proporção) órgãos de imprensa especializada em música.
Os festivais dentro do SXSW
De um lado, a Revista Rolling Stone, fundada em 1967, na onda da contracultura americana, mas que cresceu e ao longo dos anos, e está entre as publicações de música mais importantes do mundo, tendo se tornado um veículo de mídia dos mais tradicionais em seu formato.
Desde 2023 a revista promove, dentro da programação oficial do SXSW, um Festival de 4 dias intitulado “O Futuro da Música”, trazendo ao palco de uma das Casas de Show mais importantes dos Estados Unidos, o Moody Theater, uma seleção de novos talentos da música mundial. Alguns já em franca ascensão como o cantor pop Benson Boone, que foi o headliner da primeira das 4 noites no Moody Theater este ano, e outros ainda em um estágio mais inicial de “estouro” como a cantora country Brittney Spencer.
Do outro lado, a Revista Creem, autointitulada em um dado momento “A única Revista de Rock and Roll da América”, fundada em 1969 e que foi publicada por 20 anos até 1989, quando encerrou as atividades antes de ressurgir em 2022 com a proposta de se manter fiel à sua origem underground em Detroit, onde ajudou a popularizar termos como “Punk Rock” e “Heavy Metal” e a tornar conhecidos nomes como os de Lou Reed e David Bowie nos anos 70 e Motörhead e Van Halen nos 80.
Desde 2023 a Creem promove seu próprio mini festival não oficial durante o SXSW, que nas últimas duas edições aconteceu com a parceria da gravadora Third Man Records de Jack White no 13th Floor, um pequeno bar na região central de Austin.
Duas experiências ao vivo distintas
São 4 dias de shows com a Rolling Stone e 2 dias com a Creem. No primeiro caso, uma casa de shows com dois mezaninos, capacidade para 2750 pessoas e uma estrutura absurda de som, iluminação e câmeras de vídeo, afinal é nessa casa de show que é gravada a série musical mais longeva da televisão americana, o Austin City Limits, no ar desde 1974.
No segundo caso, um bar nomeado em homenagem a uma banda de Rock Psicodélico dos anos 60 (The 13th Floor Elevators, de Austin), um lugar pouco iluminado, ainda que com personalidade, capacidade para cerca de 200 pessoas, um balcão e um palco baixinho.
Experiências quase que diametralmente opostas e, no entanto, tudo é sobre música ao vivo em Austin, tudo é sobre novidade no South by Southwest e esses são os dois pontos de convergência dessas experiências tão diferentes em todo o resto.
Essa talvez seja a parte mais bonita desse festival de proporções tão grandes: existem várias experiências possíveis e você não é obrigado a curtir todas. Aliás, isso nem é possível porque várias dessas experiências acontecem simultaneamente.
Como foi ver shows no SXSW?
É claro que não seria diferente com a experiência da nossa equipe no SXSW. Escolhas foram feitas, shows foram apreciados, shows foram preteridos, assim é a vida. Por conta de algumas dessas escolhas, não vimos os saltos mortais ou a performance musical de Benson Boone ao vivo, mas vimos a simpática Brittney Spencer que mencionei anteriormente e, logo depois dela, algo que nos impactou bastante: a banda Larkin Poe, das encantadoras irmãs Rebecca e Megan Lovell.
Continua após a foto

Uma mistura de Blues, Country, Americana e Southern Rock, tudo muito bem dosado, justificando bem demais por que tem gente que chama elas de “the little sisters of the Allman Brothers” (as irmãs mais novas dos Allman Brothers). As duas são apoiadas por uma banda competente composta por baixista, baterista e tecladista homens, mas o show mesmo é da harmonia entre as vozes e guitarras das irmãs. O Moody Theater não estava lotado, então pudemos apreciar bem o show – inclusive, experimentando assistir a uma parte de pertinho e a outra do conforto de um dos mezaninos.
Esse não foi exatamente o caso do Festival da Creem e Third Man Records no 13th Floor. O lugar pequeno e já bem cheio quando chegamos se mostrou um desafio para a execução do nosso plano de fazer umas fotos bem da frente do palco, mas fomos progredindo e chegamos lá.
Deu pra ver a banda de Nova York, Fantasy of a Broken Heart, que não impressionou muito, e depois Frankie & The Witch Fingers, vindos de Los Angeles e com um certo culto na área, capazes de iniciar uma pesudo roda punk no pequeno 13th Floor. Mas a atração principal era mesmo as meninas da banda punk local Die Spitz, que tem no currículo uma turnê nos Estados Unidos abrindo para a banda punk australiana Amyl and The Sniffers, que aliás acabou de passar pelo Brasil junto com The Offspring e mais uma galera.
Continua após a foto

O palco para Die Spitz foi montado do lado de fora, na frente do bar e virado para a rua, ao nível do chão, bem improvisado mesmo, provavelmente pra dar chance de mais gente ver o show e causar uma comoção na rua, que estava fechada por conta das atividades do SXSW. Uma sacanagem com a gente que lutou pra chegar na frente do palco lá dentro, devo dizer.
Quando percebemos que o último show do dia seria do lado de fora, a confusão já estava armada e qualquer fresta pra ver a banda mais de perto era artigo de luxo. Pra completar, o sol texano do fim da tarde ainda queimava forte na cabeça de quem se aglomerava do lado de fora do 13th Floor. A experiência não poderia estar mais longe do conforto e da excelência sonora que experimentamos no Moody Theater, obviamente.
Mesmo assim, um dos pontos altos da nossa experiência no SXSW acabou sendo fotografar Ellie Livingstone (um dos vocais e guitarra na Die Spitz) bem de perto, na sua aventura em forma de stage dive, se entregando e sendo carregada pela turba de punk rockers que circundavam o bar. A roda punk ensaiada lá dentro no show anterior teve mais fôlego e energia pra se expandir sob o sol escaldante e os comandos da baixista Kate Halder e a coisa toda foi divertida demais. Experiências diferentes, cada uma com seus pontos positivos e negativos.
SXSW: vale a visita?
Existem muitas críticas à cara cada vez mais comercial e corporativa do SXSW, que apesar de continuar sempre se propondo a ser um evento arauto das novidades e um farol que aponta os caminhos para o futuro, parece se valer cada vez mais, para tanto, de parcerias com grandes marcas e corporações, o que nunca combina muito bem com a criatividade espontânea que caracteriza naturalmente os artistas e criadores independentes.
Não haverá conclusões a respeito dessa dita tendência, como prometi no início deste “estudo de caso”. Se houver alguma conclusão a respeito, que seja então, por ora, essa ideia de que a pluralidade de experiências é sempre mais interessante do que um só tipo de show, de galera, de lugar, e isso é o que o SXSW costuma trazer.
Apesar de quaisquer que sejam as mudanças que as próximas edições do SXSW tragam, esperamos que os Festivais oficiais e não oficiais continuem existindo por lá e que sigam sendo bem diferentes, pois diferente é que é bom mesmo.
OUÇA AGORA MESMO A PLAYLIST TMDQA! RADAR
Quer ouvir artistas e bandas que estão começando a despontar com trabalhos ótimos mas ainda têm pouca visibilidade? Siga a Playlist TMDQA! Radar para conhecer seus novos músicos favoritos em um só lugar e aproveite para seguir o TMDQA! no Spotify!