hugo
Crédito: Guilherme Ventura

Em 2021, Hugo Noguchi, através de seu projeto solo hugo, lançou o disco de estreia Humaniora. Agora, o trabalho ganhou uma versão em curta-metragem.

O vídeo, como aponta o artista em comunicado para a imprensa, vai da banalidade do cotidiano ao surrealismo quase distópico ancorado na realidade do Brasil atual e nas desilusões que o povo encara diariamente.

O álbum apresenta 20 faixas e tem duração de 47 minutos, o que, no registro audiovisual, foi comprimido em 15. O roteiro foi escrito pelo próprio artista em parceria com William Freitas e Iago Gomes. Este último, inclusive, foi responsável pela direção e fotografia do material.

Assista ao curta de hugo ao final da matéria!

Humaniora

Visualmente, Humaniora vai de Anima (2019), de Thom Yorke, a Beyoncé, álbum visual da cantora americana lançado em 2013; ou de Yoko Ono a Wong Kar Wai; de Minari, de Lee Isaac Chung, a Tenet, de Christopher Nolan, chegando até a jogos de Super Nintendo e PlayStation.

Já as inspirações musicais passam por Bjork, Jorge Ben Jor, Elliott Smith, Thundercat, Flying Lotus, J Dilla, Clube da Esquina e Kanye West.

Conversamos com hugo para saber mais sobre a concepção do curta-metragem e o resultado da entrevista você confere a seguir!

TMDQA! Entrevista hugo

TMDQA!: O curta se inspira em projetos ambiciosos, como o Anima, do Thom Yorke, porém feito de forma independente. Quais foram os desafios para realizar essa abordagem visual do disco?

hugo: Antes de mais nada, gostaria de agradecer do fundo do meu coração a vocês pela plataforma, pela escuta! Como toda produção independente, os desafios foram a boa e velha falta de recursos (rs) mas também ouve o ineditismo desse tipo de performance para mim (sem contar que foi filmado durante a pandemia, o que aumentou nossas limitações) . O primeiro foi contornado pelas dedicação, talentos e parcerias do William (Freitas, roteirista e produtor do curta) e do Iago (Gomes, direção e fotografia), que vieram lá de Belo Horizonte pra me ajudar nessa, e também tivemos muito apoio da Luiza (Catalani, assistente de produção), que é aqui do Rio mesmo.

A proximidade entre nós também foi um facilitador, já que os hospedei e também sou amigo pessoal de cada um deles. Quanto ao segundo, apesar da minha dificuldade de me ver em tela sem estar tocando; acho que alguma coisa consegui passar, e como esse trampo é para ser peculiar mesmo, consegui desapegar, abraçar e aceitar uma eventual estranheza, algo que o Thom Yorke faz bem.

TMDQA!: O que o curta oferece para além das canções? Como esses conteúdos se complementam?

hugo: Acredito que ele dá um suporte visual para as músicas, algo que estava sentindo falta desde quando lancei o disco. Apesar de ter escolhido esse nome (Humaniora) a anos para meu primeiro álbum, aconteceu de ele retratar meus sentimentos em uma época bem específica da minha vida e do país, com rupturas pessoais, a experiência de passar por uma pandemia tão brutal, junto a uma conjuntura política lamentável. Eu diria que o objetivo do curta é condensar essa obra e acrescentar a ela outras sensações, junto a dimensionar o disco em seu contexto histórico e particular também.

TMDQA!: O seu projeto é uma mescla de várias coisas que te inspiram, principalmente na cultura pop. Como é remixar essas referências para criar algo do zero, com a sua cara?

hugo: Foi divertido, antes de mais nada (rs). Como autor, não acredito que eu tenha assunto para uma obra ininterrupta por décadas, mas como primeiro álbum, foi bacana fazer um amálgama de todas essas referências caras a mim. Como método, fiz um esforço consciente de compor este disco como um livro, pois a pandemia me fez retomar o hábito de leitura (talvez minha primeira paixão na arte), mas incorporando outras mídias, como cinema, lendas, mitos, animações, hqs, video-games, e a própria música (como um bom millennial, sou viciado em informação). Acredito que o cerne da composição ainda é o que eu estava sentindo à época, porém ter todas essas referências para ilustrar esses sentimentos foi de muita valia.

Ali exercitei bastante o ato de samplear, então eu diria que esta obra é algo como um livro sampleado (sampler aqui não apenas do ponto de vista musical, mas também de todas estas outras mídias).

TMDQA!: A identidade do seu projeto solo, aliás, é algo que difere das bandas onde você já tocou, naturalmente. O lado pessoal e da sua identidade enquanto homem criado no norte, de raízes asiáticas, é muito forte. Qual a importância de fazer uma música que traz esse aspecto quase biográfico?

hugo: Essa importância felizmente não cabe a mim dizer. Acredito que faço a minha parte para tentar suavizar esse grande déficit de representatividade que pessoas como eu passam neste país, mas vislumbro algo mais para minha obra além de representar uma dada identidade (ainda mais porque sei que essa é uma questão bem superficial frente às complexidades estruturais de um país colonial como o nosso). Humaniora mesmo, sendo um estudo das humanidades, se propõe a uma troca além do que eu “sou” em relação ao que meus interlocutores “são”. Entendo que chame a atenção onde fui criado, as origens de minha família, ou o meu fenótipo, porém são apenas uma fachada que permite essa troca através desta alteridade, deste ineditismo de alguém com a cara como a minha dizer as coisa que digo, fazer o som que eu faço. Apenas a primeira onda de impressões de muitas outras subsequentes que pretendo provocar com minha arte a quem quiser desfrutar dela.

A minha primeira intenção com este trabalho é fazer algo antes de mais nada sincero, algo que afirme o que sou independente de qualquer denominação, por isso escolhi o hugo, sem meu sobrenome tão característico. E deste processo de tirar algo de dentro de mim para botar no mundo entendo que acabe passando por esse filtro identitário, pois é assim que estamos nos acostumando a ver a arte ultimamente. Mas gostaria de acrescentar que também é importante para pessoas sub-representadas como nós, afirmar um ponto de vista individual, para além de identificações coletivas.

TMDQA!: Você gere o selo Diáspora, que tem por objetivo dar mais visibilidade a trabalhos de artistas racializados, cujas raízes remontam justamente às diásporas. Qual a importância de ter um trabalho focado nessas peles ainda tão discriminadas?

hugo: Também é uma importância que não cabe a mim mensurar. Porém é interessante dizer que apesar de tantos avanços no campo da representação, percebo no campo artístico que a aceitação de artistas de determinadas etnias está vinculada aos estilos de música que são esperados deles e delas. Sem contar com as temáticas das obras, onde percebo uma espécie de pressão invisível nestes artistas racializados para falar de temas também de seus lugares pré-determinados, enquanto ao outro lado é concedido o verniz da “universalidade”. Se for para resumir espero que seja esta a minha contribuição com a produção musical neste selo: mesmo com nossas limitações, possibilitar real liberdade artística para estes musicistas, tentando fugir deste ciclo vicioso que se apresenta quando identificamos um problema porém nos limitamos apenas a falar e escutar sobre ele.

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