
No palco, na vida e no estúdio, Fleezus sempre foi muitas versões de si mesmo. Teve o Fleezus da Recayd Mob, moldado pelo corre e pela estética da cena; o Fleezus do BRIME!, com os pés fincados no grime londrino e a cabeça nas vielas de São Paulo.
Agora, é a vez de outro personagem assumir o protagonismo: aquele que também dirige, narra e vive as próprias cenas. Crônicas, seu terceiro álbum de estúdio, lançado no último dia 8 de outubro, marca uma virada de chave. Segundo ele, é um disco sobre o amadurecimento de ideias, sobre se despir das armaduras e sobre construir pontes entre o passado e o futuro com elegância e coragem.
“Esse disco representa a realização de conseguir traduzir da forma como realmente sinto. Já passei dos 30 e não dá mais pra olhar pra trás”, resume o artista. De acordo com ele, Crônicas é uma encenação íntima, onde assume todos os papéis e filma, com sensibilidade, as dores e alegrias de uma caminhada que não busca aplauso, mas sim escuta, afeto e transformação.
Jazz e drill
Produzido por nomes como CESRV, El Lif, Mad Gui e Paulo DK, o álbum é sustentado por uma combinação inusitada de dois mundos sonoros que Fleezus e CESRV amam: o jazz e o drill. A fusão dessas linguagens não é apenas um recurso técnico, mas uma escolha simbólica.
O jazz, com sua liberdade e melancolia, e o drill, com sua urgência e tensão, criam uma base que permite ao artista explorar o íntimo sem perder o pulso da rua. “A ideia era voltar pra base, de um jeito mais elegante. Sem perder a finesse”, afirma.
Nesse ambiente sonoro confortável, Fleezus deixa de lado o peso das expectativas e se permite falar sobre amor, raiva, saudade, esperança e rancor com uma maturidade rara. “No disco passado, Off Mode, eu já estava mostrando esse lado, mas ainda tinha muita coisa engasgada. A arte é um movimento constante e eu tento traduzir isso na minha música”, explica ao TMDQA!.
As múltiplas faces de Fleezus
Ao longo dos anos, Fleezus se reinventou sem abrir mão da própria essência. Para ele, cada fase — seja na Recayd, no BRIME ou agora em carreira solo — é parte de um mosaico que constrói o artista que é hoje. “Esse tempo de estrada me fez ter um cuidado especial com o que quero fazer e o que quero passar para o público. Eu passei a entender o que é importante pra minha carreira”, conta.
Mas Crônicas é também sobre tirar a armadura, como ele mesmo define. Não se trata de abandonar o que veio antes, mas de permitir que outras camadas da sua personalidade venham à tona, especialmente as mais sensíveis.
“É a maneira que o Fleezus enxerga o amor, e é preciso ter coragem pra fazer isso. Eu sei que todos têm seu tempo para dar esse passo, eu mesmo ainda não estava totalmente pronto para ele, mas eu me capacitei e tirei todas as amarras”, diz. O resultado é um disco que transborda vulnerabilidade, mas também seguro e necessário.
O álbum também deixa claro seu tom político. Discursos do ativista Galo de Luta e trechos da Rádio Libertadora sinalizam que, para Fleezus, o microfone é também um instrumento de combate. Em tempos de despolitização no rap, o artista não hesita em afirmar sua postura: “Tem muito artista com medo de se posicionar, com medo de perder patrocínio e festival, mas eu não tenho medo. Do mal da omissão eu não vou sofrer”
Para além de narrar o que viveu, Fleezus quer conversar com quem ainda não conhece sua música. E, ao mesmo tempo, propor novas reflexões a quem já o acompanha. “Quero alcançar pessoas que ainda não conversei, e com aqueles que já conversei, quero trocar uma nova ideia”, finalizou.
A coluna que mergulha nas histórias, letras e batidas que estão redefinindo o cenário musical do Rap. Acompanhe de perto os lançamentos e a força das rimas que ecoam pelas ruas.
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