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Depois Que a Água Baixou

Babidi faz arte a partir da dor em disco que denuncia o racismo ambiental

Como uma forma de denúncia ao racismo climático e estancar ferida pessoal, projeto tem feats de VND, yung vegan, Matheus Coringa e mais

Babidi
Crédito: @saantana.vi

As enchentes que devastam as áreas periféricas brasileiras deixam marcas profundas que não se limitam à perda de bens materiais. Para Igor Pankowski, conhecido como Babidi, produtor e beatmaker carioca, a água que inundou o Parque Colúmbia, na Zona Norte do Rio de Janeiro, levou também sonhos e esperanças.

No entanto, foi nesse cenário de destruição que nasceu Depois Que a Água Baixou, seu primeiro disco solo, uma obra que transcende a música e reflete um processo de cura, resiliência e questionamento social profundo.

“O disco foi um projeto que, quando eu falei que ia fazer, não parece que fui eu que falei. Parece que foi a minha criança interna,” compartilha Babidi. Em meio ao caos pós-enchente, onde ruas se transformavam em lama e a tristeza predominava, ele encontrou na criação musical um caminho para transmutar o sofrimento em arte.

O resultado é um álbum de 12 faixas que mistura revolta, esperança e profunda conexão emocional, trazendo participações de artistas como VND, Matheus Coringa, yung vegan e Killa Bi. Interlúdios gravados com seu pai, Seu Gerê, e áudios antigos de sua avó, Luiza Florisbal, reforçam o tom intimista da obra.

Uma voz para os silenciados

Mais do que um relato pessoal, Depois Que a Água Baixou é uma coletânea que denuncia o racismo ambiental — a injustiça social e ambiental que afeta desproporcionalmente as comunidades mais vulneráveis.

O conceito se desenvolve a partir da experiência direta de Babidi com a destruição causada pela chuva e pelo descaso público. “Onde eu morava, no Parque Colúmbia, a gente resistia, mas não porque queria. Resistíamos porque não tínhamos outra opção,” reflete o produtor. Essa resistência involuntária é central ao álbum, que carrega em cada faixa uma mistura de denúncia e sensibilização.

A primeira faixa, “Canoa Furada”, abre o disco com a voz magoada de Seu Gerê, que narra o ciclo infinito de reconstrução após a destruição. “Chamei meu pai para conversar, e ele soltou várias percepções naturais sobre essa fase,” explica Babidi. O tom da faixa estabelece uma atmosfera reflexiva e emocional que permeia todo o disco.

Ao longo das 12 músicas, Babidi explora como a música pode servir tanto como espaço de denúncia quanto de catarse. A canção “Plano”, com participação de Killa Bi, aborda o acolhimento necessário a todos diante da perda, enquanto a faixa-título, com a voz de Servo, narra o desespero de ver sua casa sendo engolida pela enchente, colocando o público de forma visual no território do acontecimento, com riqueza de detalhes muito específica do tema.

Entre homenagens e amizades

A escolha dos colaboradores também foi uma extensão da visão de Babidi. “A amizade foi o principal fator. Tinha pessoas que estavam lá comigo quando tudo aconteceu e que eu sabia que topariam na hora,” conta ele. Esses artistas não só acrescentaram suas vozes à obra, mas ajudaram a dar profundidade ao contexto abordado. Os versos trazem vivências individuais que se conectam ao tema central, criando uma narrativa coletiva.

Interlúdios gravados com Seu Gerê e áudios de sua avó, Luiza Florisbal, dão uma dimensão ainda mais humana ao disco. “Minha avó faleceu, mas encontrei um vídeo dela no WhatsApp recitando um poema. Decidi que precisava homenageá-la,” diz Babidi. Esses momentos criam pausas significativas no álbum, convidando o ouvinte a refletir sobre a vida e a resistência.

Depois Que a Água Baixou não é apenas um registro de um momento traumático, mas também um marco no processo de superação de Babidi. “Esse disco é sobre dar um passo à frente em meio ao caos. É uma ferida que eu quero botar um curativo em cima e esquecer que ela existiu,” afirma o produtor.

O álbum também é uma expressão de sua identidade musical. Conhecido por seu trabalho com samples, Babidi utiliza elementos sonoros que deixam uma marca duradoura no ouvinte. “Eu gosto de implicar com um elemento, marcar o ouvinte com aquele som,” explica. A capa do disco, uma imagem teatral e carregada de simbolismo, sintetiza a bagagem emocional que Babidi carrega e traduz em sua música.

O recomeço de Babidi

Para Babidi, DQAB é mais do que um álbum; é um recomeço. Depois de anos trabalhando nos projetos de outros artistas, o disco representa sua afirmação como criador e protagonista de sua própria história.

“O produtor se sacrifica quase o triplo. Trabalhamos muito e, muitas vezes, não somos reconhecidos. Esse disco é meu momento de marcar meu nome na história.”

Com 31 minutos de duração, Depois Que a Água Baixou oferece uma experiência imersiva que reflete não apenas a trajetória de Babidi, mas também a realidade de milhares de pessoas em situações semelhantes.

A obra convida o ouvinte a refletir, a sentir e a se conectar com as histórias de resistência que emergem das periferias brasileiras. Como o próprio produtor conclui: “Esse disco é uma perspectiva em meio à desesperança. É uma declaração de que, mesmo no caos, ainda podemos encontrar saídas.”

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