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Do Clássico ao Pop: maestro Felipe Prazeres, da Petrobras Sinfônica, fala sobre “showcertos” para democratizar acesso a orquestras

Já faz algum tempo que as orquestras brasileiras ganharam nova notoriedade e fôlego. Unindo jovens instrumentistas virtuosos, maestros com uma abordagem mais plural e grandes doses de ousadia, essas formações sinfônicas vêm lotando estádios e salas de concerto. Entre Bach e Beethoven, eles apresentam de Michael Jackson a Jackson do Pandeiro; de Queen a Legião Urbana.

É claro que o encontro dos mundos da música clássica e do pop já acontece há tempos. Cantoras que mesclam bem esses universos estiveram no mainstream ao longo das últimas décadas – falamos sobre isso com Sarah Brightman, como você pode relembrar aqui. Orquestras estão em álbuns populares, em trilhas sonoras de filmes blockbuster. 

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Agora, mais do que nunca, elas parecem estar abraçando essa conexão com a música popular, saindo dos teatros para os festivais, fazendo feats com cantores famosos e mergulhando com tudo no lúdico da música infantil. E uma das pioneiras nesse movimento, no Brasil, é a Orquestra Petrobras Sinfônica.

Oito anos atrás, quando começou a lançar EPs temáticos – O Clássico É PopO Clássico É Rock (2016), seguidos pelas versões dedicadas ao Samba (2017) e ao Reggae (20018) -, o ensemble logo caiu no gosto popular. 

Suas apresentações iam de cervejarias a palcos da Lapa carioca, como a Fundição Progresso, onde um público cantava emocionado junto com a orquestra o repertório do álbum Ventura, do Los Hermanos – no mesmo espaço onde Camelo, Amarante, Barba e Medina gravaram um de seus icônicos DVDs.

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Desde então, outras orquestras vêm seguindo um caminho similar, porém próprio. O panorama da música clássica continua mudando continuamente, ao contrário do que os mais tradicionalistas possam desejar. Prova disso é que a Petrobras Sinfônica está em mais uma de suas múltiplas turnês, dessa vez com datas por capitais do nordeste.

Os concertos, sob a regência do maestro Felipe Prazeres, mostram versões sinfônicas dos clássicos da Legião Urbana e do infantil Saltimbancos (Fortaleza e Natal, 02 e 03 de maio respectivamente). Já Recife também recebe o showcerto Legião Sinfônico e um espetáculo especial com o cantor e compositor Lenine (07 e 08/05).

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Prazeres é, também, um cara que trilha esses dois caminhos com desenvoltura. Ele vai do Mundo Bita com a Petrobras Sinfônica à batuta titular do Teatro Municipal do Rio e à direção artística da orquestra de câmara Johann Sebastian Rio.

O TMDQA! conversou com o maestro sobre este novo momento da orquestra e da junção desses mundos. Confira abaixo!

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TMDQA! Entrevista: Maestro Felipe Prazeres (Orquestra Petrobras Sinfônica)

TMDQA!: A Orquestra Petrobras Sinfônica vem fazendo um resgate do cancioneiro popular brasileiro há quase uma década. Como você avalia o início desse projeto, em 2016, e o ponto que se encontra agora em 2024?

Felipe Prazeres: De fato, começamos a fazer esse resgate do cancioneiro popular em 2016 com o “Projeto Álbuns”. O primeiro foi o disco Ventura, do Los Hermanos e foi um sucesso arrebatador. O público se identificou com essa versão sinfônica, principalmente os fãs do Los Hermanos, cantando muito nas apresentações. Depois a gente fez várias bandas internacionais, como o Queen, em que o público canta junto também.

Hoje podemos dizer que a Orquestra Petrobras Sinfônica tem intimidade com repertório pop, que vai até o rock pesado mesmo, como Metallica, Guns N’ Roses, Pink Floyd, e vários outros clássicos do rock. Ou seja, a orquestra ganha essa bossa de tocar outros ritmos que não são tão comuns para uma orquestra sinfônica, que toca música de concerto, que é uma música que flutua, inclusive, no tempo. Então, podemos dizer que, nesses quase dez anos, essa experiência tem sido um grande aprendizado para a Petrobras Sinfônica.

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TMDQA!: Parte da iniciativa é fazer lançamentos nas plataformas de streaming, um mundo ainda complicado até mesmo para artistas pop. Como tem sido a experiência da Orquestra Petrobras Sinfônica nas plataformas? Tem sido possível furar bolhas com essa presença no digital?

Felipe Prazeres: Essas bolhas na presença digital são difíceis para a música popular e também para a orquestra, dentro das suas proporções. Uma orquestra não sobrevive disso. A música clássica não sobrevive disso. A gente sobrevive das nossas performances ao vivo, que é a grande experiência para o ouvinte e para o artista que está se apresentando. Mas é claro que é importante a gente ter a nossa representatividade nas plataformas e sempre pensarmos os lançamentos como oportunidade para chegar a ainda mais pessoas, aproveitando a grande possibilidade de disseminação de música pela internet. 

TMDQA!: Os concertos sempre são associados à ideia de democratização do acesso à música clássica, o que é muito importante. Muita gente pensa que os fãs de rock ou de MPB ou de samba não consomem, também, o clássico e chegam totalmente novatos a este ambiente com orquestra e maestro. O que mais te surpreende nesses encontros cara a cara com o público?

Felipe Prazeres: A nossa proposta dos concertos, que chamamos de “showcertos” está associada à democratização, à ideia de desmistificar a própria orquestra sinfônica que foi colocada no lugar de ser somente uma representante de um acervo, de algo que já foi escrito há séculos atrás. Ela é um organismo pulsante e que continua a fazer, e, o principal, pode pertencer a qualquer estilo de música. Não precisa estar necessariamente presa ao repertório de concerto, apesar de ser esse o DNA da orquestra. A orquestra surgiu da música de concerto, de todos os compositores e compositoras que existiram há muitos anos e até hoje produzem.

Porém, por que não entender a orquestra como um organismo musical que está aberto a todos os estilos musicais? O que mais surpreende nos encontros com o público, é que eles se identificam quando a gente começa a tocar, independente de ter um vocalista ou uma vocalista.

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TMDQA!: Quais repertórios a Orquestra Petrobras Sinfônica não fez ainda e que estão no seu radar para os próximos anos? Pode adiantar, talvez, a listinha de desejos de vocês?

Felipe Prazeres: Tem muita coisa que a gente quer fazer, inclusive porque pensando em brasilidade e no nosso país como uma grande fonte de repertório, com estilos completamente diversos, cada um na sua região, mas formando essa diversidade linda que é o Brasil. Então, temos uma ideia de passear pelo Brasil e abraçar todas essas manifestações musicais maravilhosas que a gente possui. 

TMDQA!: Quando a Orquestra Petrobras Sinfônica e outras orquestras começaram este movimento de popularizar o clássico, imaginou-se que o mundo erudito iria torcer o nariz. Mas na verdade, é possível ver um movimento crescente de unir as orquestras cada vez mais em festivais de pop e rock, de levar aos estádios, de fazer feat com cantores, etc. A seu ver, esse é um movimento que não tem volta?

Felipe Prazeres: Eu acho que sempre terá gente que vai torcer o nariz, que vê a orquestra de uma outra forma. O principal é que a Petrobras Sinfônica, e até outras orquestras, não deixam de tocar o repertório sinfônico, ou não tocam menos o repertório sinfônico. Fazemos o repertório tradicional e sempre o faremos. O que queremos é que o público que está assistindo concertos de pop, rock e outros estilos fique estimulado para saber como uma orquestra funciona.

Então, eu acho que esse é um movimento que não tem volta. Uma orquestra cai muito bem para qualquer música. Todos os grandes artistas que a gente toca, como Lenine, Gilberto Gil, Gal Costa e outros que já passaram pela Petrobras Sinfônica, se sentem muito bem, ficam honrados de ter uma orquestra sinfônica à disposição. E estilos como o rock e o pop provaram que funcionam numa orquestra, pois temos instrumentos muito importantes do rock, como a bateria e o baixo elétrico. Isso faz uma grande diferença e as pessoas se identificam.

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TMDQA!: Com iniciativas como Os Saltimbancos Sinfônico e também o Mundo Bita Sinfônico, qual a importância de iniciar, desde cedo, a introdução à sonoridade clássica?

Felipe Prazeres: O ensino da música para a criança, independente de ser música clássica ou não, provou-se que é algo que faz uma diferença enorme no desenvolvimento. É claro, se a gente puder diversificar o repertório e também apresentar a música clássica, nós despertamos nas crianças desde cedo o interesse por esse universo diverso de timbres e sons.

Quando a gente apresenta uma orquestra sinfônica para a criança, por exemplo, tocando o Mundo Bita, em uma versão sinfônica, em uma formação com o Chaps, vocalista do Mundo Bita, tocando com uma banda, talvez com um violão ou com uma bateria, a gente une um repertório já conhecido pela criança e torna esse som único. Não existe nada igual a uma orquestra sinfônica em termos de quantidade e complexidade, porque se unem várias histórias diferentes de famílias de instrumentos que se desenvolveram durante todos esses anos e acarretaram nesse organismo maravilhoso que é a orquestra sinfônica. 

E as crianças escutam isso, independente de ser complexo ou não pra gente, elas escutam isso de uma forma simples, porque a gente toca esse repertório que elas gostam de ouvir. E daqui a pouquinho vai tocando os clássicos também, que são portais para a entrada da música clássica e seus grandes compositores. A gente sempre dá uma atenção especial a esse novo público que está por vir, essa é uma das vertentes da Petrobras Sinfônica.

Published by
Nathália Pandeló