Capa de Ícarus, novo álbum de Bk'

Que BK’ é um dos rappers que mais entrega conceitos em seus discos não é novidade para ninguém. No mais novo capítulo dessa história, o carioca lança ICARUS, seu quarto álbum de estúdio, ambientado no conhecido mito grego de Ícaro.

Tendo sido o tema muito explorado culturalmente, BK’ foca em outra ótica da história:

O que eu mais achei a conexão não foi essa ideia de chegar perto demais do sol, e sim que ele tem que criar asas para sair do labirinto. É onde o álbum e o mito se esbarram.

Um ano após o EP Cidade do Pecado, o MC segue na ideia de contos urbanos, explorando sob essa ótica as diversas fugas. Para isso, Marina Sena, L7nnon, Major RD, Bebé, Luccas Carlos e Júlia Mestra colaboram para somar na história do cantor, que se diz “mais assertivo” em seus versos.

O lançamento de Icarus conta com uma grande obra do artista carioca Nikolas Demurtas, releitura de “O Voo de Ícaro”, pintada por Jacob Peter Gowy (1636 – 1638). A obra está em exposição no Museu de Arte do Rio (MAR) de 17 a 19 de novembro e é também uma ativação, na qual basta mirar um aparelho celular para mergulhar nos detalhes e nas faixas do álbum. A ideia era de somar no universo do disco, unindo ao som o lifestyle do artista.

Para falar mais sobre a obra e o trabalho por trás dela, BK’ bateu um papo com exclusividade com o TMDQA!. Acompanhe a entrevista na íntegra logo abaixo!

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TMDQA! Entrevista BK’

BK' por Bruna Sussekind
BK’ por Bruna Sussekind

TMDQA!: Faz praticamente um ano que você lançou o EP Cidade do Pecado, e também teve o Egito (EP colaborativo com Froid e Djonga) ano passado. Sendo você alguém que não tem o hábito de lançar tantos trabalhos em pouco tempo, por que lançar outro álbum agora?

BK’: Cidade do Pecado não foi exatamente um álbum, eu tenho esse costume de lançar alguma coisa no meio do caminho entre os álbuns, até para experimentar, ver se continua investindo nesse projeto ou se vai mudando. Eu queria que Cidade do Pecado fosse um álbum mas não cheguei onde queria para que fosse, então lancei como EP e já comecei a me planejar pra fazer esse álbum. Até para manter a tradição de (lançamento de álbuns) de dois em dois anos, um tempo que acho que é saudável para mim, para chegar no resultado que eu quero ou o mais próximo disso. 

TMDQA!: Qual a conexão do título, ICARUS, e a mitologia grega com o conteúdo do álbum, já que você gosta de trabalhar mais esse lado conceitual nos seus trabalhos?

BK’: Esse álbum seria a continuação de Cidade do Pecado, como foi o Antes dos Gigantes Chegarem e Gigantes, um EP de introdução e depois o álbum, testando as sonoridades e o caminho. Mas fazendo o álbum a sonoridade foi se distanciando, então achei que não fazia tanto sentido ampliar aquele mundo. Mas a base das ideias é parecida.

Então fomos estudando o que chegava perto desse conceito e chegamos no mito de Ícaro. Mas o que eu mais achei a conexão não foi essa ideia de chegar perto demais do Sol, e sim que ele tem que criar asas para sair do labirinto. É onde o álbum e o mito se esbarram. Há várias formas de você criar suas asas, e tem vários labirintos ali, e para fugir disso você só vai indo, vai embora e esquece. O conceito para mim é mais de fugir do labirinto do que chegar perto do Sol.

TMDQA!: Legal, quando falam do Ícaro na música geralmente só falam da parte de chegar no Sol.

BK’: Sim, mas isso é só o final né?

TMDQA!: Mas não tem a jornada, né?

BK’: Sim, exatamente.

TMDQA!: Puxando o gancho da ideia de ser uma continuação do EP, há momentos no álbum que lembram muito o som da Cidade do Pecado. O que o BK’ como artista traz aqui que não tinha nos álbuns anteriores, que o ouvinte talvez nem vá pegar mas que você sabe que mudou?

BK’: A minha escrita vai mudando de álbum pra álbum. É até algo que eu quis fazer. Tem formas que eu escrevia e que até escuto, que eu não curto mais. Hoje acho que sou mais assertivo na caneta, é mais do meu gosto. Antes era outra época, outra forma de escrever. Com o passar dos anos eu fui achando a forma que eu gosto de escrever. Tem também algumas coisas que até lembra o BK’ do Nectar.

Os beats também, tem algumas coisas ali que eu não costumava trazer pros meus trabalhos. O que tu falou acho que até que é o caso de “Nome nas Ruas”, que tem o Carlos do Complexo, e que lembra Cidade do Pecado.

E nos meus álbuns eu costumo separar sessão por sessão, e nesse álbum eu mudei isso. Até por ser uma mente confusa no álbum, eu misturei tudo. Eu costumo separar em mais ou menos três capítulos os projetos, e nesse eu não fiz isso, pra dar mesmo essa sensação de confusão.

TMDQA!: E você atualmente participa bastante do processo de produção dos beats ou você só recebe e rima neles?

BK’: Eu tô sempre. Até isso demora um pouco no processo do álbum. Eu até conseguiria fazer um álbum em menos tempo, mas achar o beat certinho, estudar as referências, mandar pro JXNV$ (produtor da maioria dos sons de BK’) e até pros outros beatmakers…

O JXNV$ foi quem eu mais perturbei, ele tá me mandando beat desde o começo do ano. Sem exagero, ele deve ter me mandado uns 50 beats esse ano e eu, “Vem mais, vem mais… Esse eu não quero…”. Esse álbum tem mais coral, isso foi uma ideia minha, e a gente vai construindo junto a parada. E o legal de sempre estar trabalhando com o JXVN$ — eu sou muito fã do trabalho dele, falo isso em todos os lugares — é que ele entende isso e fica mais flexível na hora de mexer nas coisas. Tem pessoas que não vão gostar de mexer no trabalho delas, o JXNV$ a gente se entende. Tem músicas que eu queria tirar elemento e ele, “Não, BK’, isso eu não vou tirar não”, e eu falo pra chegarmos num meio termo.

Esse também foi o álbum que eu mais acompanhei as mix também. Desde O Líder Em Movimento eu tenho acompanhado bastante as mixagens, gosto de estar junto no processo, assim fica mais próximo do que eu quero. Entregar e deixar ali… normal também, já fiz isso, mas você deixa passar algumas coisinhas, o que não é tão da hora.

TMDQA!: Falando agora sobre os feats, você tem até um número mais alto agora,  tendo em vista que O Líder Em Movimento você fez todo sozinho (na parte de performances vocais). Primeiro, por que você resolveu dessa vez trazer convidados, e como você os encaixa no seu conceito, na sua história?

BK’: Faz parte do estudo também. A gente tem a música primeiro, eu não gosto de botar o feat só por causa do nome, ele vem complementando e somando a música. Na track com o Major RD, por exemplo, eu faço umas linhas um pouco mais debochadas, que eu não faço tanto, e com uma voz forte. E quem é o cara que costuma fazer isso? Eu lembrei do Major, e a gente é parceiro de maior tempão e queria trabalhar junto. O feat tem que deixar a música mais maneira, tipo a cereja do bolo. Pelas linhas da track, achei que ele era o cara que ia saber chegar.

O L7nnon eu mandei 3 tracks pra ele, e eu falei, “Ainda bem que ele curtiu essa, porque as outras duas saíram do álbum”, e se ele tivesse escolhido outra ele ia ficar fora. E eu acho que foi um dos melhores versos que ele fez esse ano. Acho que ele chegou bem, somou bem na música, acho que ficou bem maneiro. 

A Marina Sena eu queria fazer aquela vibe bem da antiga, tipo Jay-Z, que vem o cara rimando e a mina do pop cantando, e aí foi isso do estudo. E a Marina a gente foi se aproximando, de esbarrar com ela em vários festivais, isso de camarim, backstage, e mandei pra ela e rolou. E ela mandou benzão demais no refrão.

Mas pra mim é isso, o lance de estudar quem vai somar bem na track, não só entregar o nome. Tem que fazer sentido.

TMDQA!: E pelo que você falou do L7nnon, teve algum feat que ficou de fora e a gente nunca vai ouvir?

BK’: Cara, eu sempre acabo soltando a música ou o verso em algum lugar depois. Feat que acabou não rolando não teve, mas teve muita música que ficou fora. Esse álbum foi o que mais demorou pra chegar num resultado que eu estivesse satisfeito, desde Cidade do Pecado eu já estou trabalhando.

Cidade do Pecado era pra ser um álbum, então eu já tava nesse processo de escrever, eu tava tentando chegar naquele nível. Ficou muita track que o pessoal até gostou, mas eu achei que não fazia parte do conceito. Até porque é algo que eu falo muito, às vezes a música não tem cara de álbum. Tem música que tem cara de mixtape, tem música que tem cara de EP. E acho que no resultado final cheguei nas músicas com cara de álbum. Teve música que ficou pronta três semanas atrás, a intro (“Luzes”). A primeira track foi a última a ficar pronta. A track com o Luccas Carlos (“Músicas de amor nunca mais”). Não tinha uma lovesongzinha, aí falei, “Ah, quer saber, vou colocar uma também”. E entrou.

TMDQA!: Agora sobre a capa, vai ser outra parada grandiosa, assim como foi em Gigantes com o Maxwell Alexandre (pintor brasileiro responsável pela capa do disco). O que você tem a dizer sobre ela e sobre esse processo artístico?

BK’: Quando a gente pensa num trabalho, a gente tem que pensar nas formas de lançamento, formas de deixar interessante. Deixar a galera querendo ver e entender aquilo. E isso, o quadro, os clipes, vão sendo portas para o universo do disco. A gente vai lançar num museu, acho isso maneirão, no nosso rolé, no nosso lifestyle, a gente tá sempre presente, é um rolé que a gente gosta. Tenho vários amigos, como o Maxwell, artistas plásticos, pintores, é um rolé que a gente gosta e quer estar aproximando.

Ali no MAR rola uma parada de trazer realmente os jovens de periferia, jovens pretos, para dentro do museu para consumir um outro tipo de arte, que é muito elitizada, que te afasta muito. Tem vários manos, várias amigas que também curtem e a gente acaba aproximando. Por que não juntar o lifestyle ao álbum? Foi uma parada sempre muito presente desde o Nectar, Bloco 7, a entrega do lifestyle no trabalho, algo que foi se perdendo um pouco. Eu quero trazer isso para complementar o álbum com mais coisas, fazendo algo que não fique forçado.

TMDQA!: É isso. Muito obrigado, BK’, e muito sucesso para esse novo trabalho!

BK’: Falou, abração!

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