Love, Death & Robots jibaro
Love, Death & Robots (Foto: Netflix)

Se você não está familiarizado com o Vale da Estranheza, esse é um conceito que surgiu ainda nos anos 1970 a partir do trabalho de Masahiro Mori, professor japonês de robótica que estudava a reação das pessoas ao interagirem com robôs.

A conclusão a que ele chegou foi que os seres humanos tendem a criar uma afinidade com as coisas que se parecem com seres humanos, mas há um limite para isso. Há um momento em que a semelhança cria um desconforto inexplicável, ligado a um instinto que não é possível provar cientificamente, mas acredita-se que ele exista e seja comum para toda a humanidade.

Quanto mais real, mais estranho?

O realismo em si não é o problema, pois robôs que são literalmente iguais a pessoas não criam esta sensação de incômodo. Seria o caso de filmes e séries que apenas assumem que os atores são robôs, como em Gattaca ou Westworld.

A questão surge quando os elementos são “quase” iguais. É nesse “quase” que reside o Vale da Estranheza, quando a imitação da humanidade chega muito perto da perfeição, mas ainda é possível notar que trata-se de algo simulado. Isso é muito fácil de notar em produções de animação.

O engraçado é que o nível de afinidade cresce de novo, conforme o realismo se aproxima da sua totalidade.

Há um gráfico que explica exatamente como funciona. O canal Ciência Todo Dia demonstrou de forma relativamente simples como a relação entre “afinidade” e “semelhança com humanos”:

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grafico sobre vale da estranheza
Gráfico que explica o Vale da Estranheza (Foto: Ciência Todo Dia/Reprodução)

A compatibilidade cresce conforme as características humanoides aumentam (por exemplo, uma impressora vs um Megazord). Só que, se aumentar muito, chega a um nível muito estranho e o vale do gráfico mostra isso.

Love, Death & Robots

A série Love, Death & Robots, da Netflix, é o acervo perfeito para entender como funciona o Vale da Estranheza. Por contar com diversos tipos de animação, é possível notar os diferentes níveis de afinidade que podemos alcançar com os robôs.

O primeiro exemplo é quando eles não têm nada de humano. No episódio “Os Três Robôs”, da primeira temporada e que ganha uma continuação na terceira, um dos personagens principais é uma pirâmide. Há pouca ou nenhuma conexão nesse contexto.

Um nível acima estão os próprios colegas e protagonistas desse mesmo episódio, que possuem formas humanas, mas são claramente robôs animados.

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Love, Death & Robots tres robos
Love, Death & Robots (Foto: Netflix)

Quando a animação retrata pessoas o cenário muda, mas a capacidade de criar uma espécie de vínculo com os personagens ainda é crescente. É o caso dos episódios “Zima Blue” (primeira temporada, o protagonista tem uma forma humana cartunesca) e “Pela Casa” (segunda temporada, episódio de Natal no qual as crianças são humanas mas não realistas).

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Love, Death & Robots zima blue
Love, Death & Robots (Foto: Netflix)

Quando o realismo é o foco, porém, é que o bicho pega. Os dois episódios que mergulham mais profundamente no Vale da Estranheza são do mesmo diretor, o espanhol Alberto Mielgo. “A Testemunha” (primeira temporada) e “Jibaro” (terceira temporada) se aproximam bastante de um realismo perfeito, mas algo nos faz perceber que não são pessoas.

Por mais que as técnicas de captura utilizem atores de verdade para dar mais veracidade aos movimentos dos personagens, a “sereia” de “Jibaro” torna-se uma figura muito mais inquietante por causa desse realismo incompleto. 

A protagonista sem nome é um exemplo perfeito de como algo quase humano desperta reações tão estranhas na gente. Além disso, os religiosos e os soldados invasores já são figuras aflitivas desde o início. Quando todos caem no feitiço da protagonista e começam a agir de forma desordenada, o incômodo causado pelo Vale da Estranheza vai nas alturas e contribui demais para a vibe buscada pelos realizadores.

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Love, Death & Robots jibaro
Love, Death & Robots (Foto: Netflix)

Vale da Estranheza é realidade ou forçada de barra?

A explicação dos estudos desenvolvidos a partir do trabalho de Masahiro Mori apontam para um tipo de instinto evolutivo que “treinou” a humanidade a desconfiar de algo que parece humano, mas não é.

Como diz o Ciência Todo Dia, uma hipótese é que essa estranheza é uma forma de defesa desenvolvida pelo nosso cérebro. Esta seria uma das várias ferramentas criadas por ele para que não fiquemos obcecados pela nossa própria mortalidade.

Quando confrontamos algo que parece humano, mas não é, estamos de cara com algo que é teoricamente eterno. A ideia de que aquilo não envelhece, não fica doente e não sente dor entra em conflito com o que entendemos que é a ordem natural das coisas.

Se o Vale da Estranheza poderá ser comprovado pela ciência é algo que não sabemos, mas uma certeza existe: há décadas, estúdios de todo o mundo o levam em consideração na hora de fazer seus filmes e séries.

A Pixar nunca fez obras extremamente realistas e quase sempre escolhe personagens não-humanos como protagonistas; Shrek foi totalmente reconstruído após testes de audiência revelarem uma rejeição à Princesa Fiona, que era bem mais realista na sua versão original; os próprios animes têm traços que distanciam seus protagonistas humanos do realismo absoluto e por aí vai.

Mesmo sem ter como provar no papel, o Vale da Estranheza já é uma realidade.

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