Mari Fernandez
Foto: Divulgação

Estamos em 2021 e ainda é preciso falar sobre representatividade de gênero no mundo da música. Por mais que mulheres tenham ocupado espaços importantes na indústria, seja no palco ou na produção, a situação chega a ficar assustadora se colocarmos no papel os cálculos. O machismo é uma realidade que precisa ser revertida.

Já reparou como a maioria dos gêneros brasileiros, em suas fases iniciais, são impulsionados por homens? Demorou consideravelmente para que nos acostumássemos a ver mulheres no funk, no forró e no sertanejo universitário, para citar alguns gêneros. O exemplo mais recente disso é o piseiro, fenômeno nacional que acumula elementos de forró eletrônico, brega e funk. O Brasil tem acompanhado o sucesso estrondoso de nomes como Os Barões da Pisadinha e Zé Vaqueiro, mas cadê as mulheres nisso?

Contrariando as expectativas, ninguém imaginou que, da noite para o dia, surgiria uma cantora capaz de igualar o sucesso de alguns desses nomes (e até de superar outros). Um novo capítulo na recente história do piseiro está sendo escrito graças à cearense Mari Fernandez. Aos 20 anos, a jovem compositora tem chamado a atenção de todos pelos números incríveis alcançados por seu disco de estreia Piseiro Sofrência, lançado recentemente.

Além de ter entrado para playlists editoriais de plataformas de streaming, o seu maior hit, a canção “Não, Não Vou“, viralizou no TikTok. São mais de 400 mil vídeos postados com a canção ao fundo, incluindo contribuições de celebridades como Neymar, Lexa e Rafa Kalimann. Goste ou não da plataforma, é inegável que Mari tem causado um impacto relevante não apenas para o piseiro, como para a música brasileira como um todo.

Curiosos sobre esse impacto súbito e sobre todas as questões que levaram uma jovem de 20 anos a se tornar uma das cantoras mais ouvidas do Brasil, entrevistamos Mari Fernandez. Conversamos sobre os tempos atípicos de pandemia, o fenômeno do piseiro, a revolução do TikTok e mais.

Confira abaixo o papo!

“Um forró mais eletrônico que vem trazendo novas pessoas para o mercado da música”

TMDQA!: Como surgiu seu interesse por música? Qual a origem de tanto talento?

Mari Fernandez: Meu interesse por música começou desde criança. Comecei a cantar em escola e igreja com sete ou oito anos. E eu ia muito para a igreja com minha tia e por isso desenvolvi esse desejo de cantar lá. Desde pequena, eu sempre gostei muito de música. Eu era aquela criança que era apaixonada por cantar. Na minha família já tinham pessoas que trabalhavam com música. Minha minha avó foi compositora. Minha mãe já cantou em banda. Minhas tias cantaram em bandas. Tive até tia que foi dançarina de uma banda de forró aqui muito famosa aqui no Nordeste, a Forró Real.

TMDQA!: O piseiro é uma sensação relativamente recente no mainstream brasileiro. Quais são as suas maiores influências em termos de sonoridade?

Mari Fernandez: Eu tenho referências na música desde Alceu Valença a Marília Mendonça. No piseiro, eu tenho algumas referências como Barões da Pisadinha e Zé Vaqueiro. No forró, Xand Avião, Solange Almeida, Wesley Safadão… São muitas referências. Eu sou uma menina muito nova, com vinte anos. Então, gosto de acompanhar o trabalho de todos que já têm experiência no mercado. Gosto de escutar um pouquinho do que todos têm pra oferecer para a gente, que é a nova geração que está começando agora. Nunca é ruim se inspirar em quem já tem anos de carreira, né?

TMDQA!: Que nomes você pode recomendar para que os nossos leitores mergulhem ainda mais no gênero?

Mari Fernandez: O piseiro é um gênero novo, um estilo que vem trazendo muitos nomes dessa nova geração, como Tarcísio do Acordeon, Zé Vaqueiro, Natanzinho, João Gomes, Vitor Fernandes… Eu também estou nessa nova geração de agora. O piseiro é um “novo forró”. A gente consegue enxergá-lo assim, um forró mais eletrônico que vem trazendo novas pessoas para o mercado da música.

“Quero que venham mais mulheres”

TMDQA!: Assim como muitos gêneros musicais brasileiro, o piseiro é dominado por homens, como Os Barões da Pisadinha e Zé Vaqueiro. Foi surpreendente e ótimo ver uma mulher quebrando essa imagem, chegando sem parcerias ao topo das paradas, quebrando recordes e afins. Como foi perceber que estava protagonizando essa inspiradora revolução, mesmo sendo tão nova?

Mari Fernandez: Para mim isso tem sido uma honra. É muito importante para mim ver meus fãs me colocarem como a primeira mulher do piseiro. Mas quero que venham mais mulheres. Eu acho que, como em todos os estilos, o piseiro tem espaço pras mulheres também. A gente sabia que, alguma hora, chegaria uma mulher na pisadinha. É sempre assim: sempre tem alguém que começa e faz com que outras pessoas se inspirem. Espero que outras mulheres se inspirem também e comecem a entrar. Que dê tudo certo, se Deus quiser. O que eu quero é que as mulheres entrem mesmo aí e que isso vire algo cada vez mais comum, porque quanto mais comum virar e quanto mais mulheres existirem no piseiro, melhor vai ser. As pessoas vão gostar e eu vou estar ali junto com as outras que virão.

TMDQA!: O mundo da música ainda é muito machista. Qual você acha que é o caminho certo para que alcancemos um cenário mais igualitário e justo? Você daria alguma dica de encorajamento para as cantoras que ainda estão por vir?

Mari Fernandez: A minha dica para as cantoras que estão por vir é fazer como eu, né? É sonhar, acreditar que a mulher pode, sim, chegar aonde ela quiser. Como a gente diz aqui no Nordeste, é sobre dar a cara a bater, focar no projeto, tirar foto, se maquiar, se arrumar, preparar a imagem, fazer da gravação e do projeto a coisa mais linda do mundo e lançar isso para o povo. É preciso confiança, pensar positivo e colocar em prática a sua vontade. Foi o que aconteceu comigo. Eu tenho tido muito apoio no mercado da música, tanto por homens quanto por mulheres. Até agora não me aconteceu uma chateação. Estou vivendo um momento de felicidade porque eu confiei que isso poderia dar certo. Afinal, o que que custa tentar? Me juntei com os meus empresários, com a minha equipe e acabou que o nosso tentar deu certo.

Piseiro + Sofrência

TMDQA!: Seu álbum de estreia se chama Piseiro Sofrência que, de fato, é um nome muito chamativo e que sintetiza bem a proposta do que é apresentado. Quais foram suas inspirações para as letras? Como foi trazer temas de sofrência nessa estética gostosa do piseiro?

Mari Fernandez: Então, a gente teve a ideia do Piseiro Sofrência porque eu curto muito escutar sertanejo, que tem umas letras mais sofridas. Eu gosto de cantar esse estilo. Sou compositora e gosto de compor para essa realidade das pessoas que sofrem por amor, das pessoas que vivem um amor complicado. Eu gosto, eu curto escrever sobre isso. Quando a gente for escolher o estilo, eu falei que queria o piseiro porque eu quero levar o meu Nordeste na minha veia. Porém, colocamos um pouquinho da sofrência que eu gosto e a gente fez essa mistura, de ser um piseiro um pouco mais lento, mas animado ao mesmo tempo, com sofrência. Ele tem aquele “rebolejo”. A pessoa quer dançar escutando ele, mas a letra é sofrida.

“Precisamos falar sobre a proporção do TikTok”

TMDQA!: Como é ver mais de 1 milhão de pessoas dançando “Não Vou, Não” nas redes? O que você sentiu quando caiu a ficha de que você era um sucesso absoluto?

Mari Fernandez: Na verdade, não me caiu a ficha ainda. Eu costumo dizer que nem nos meus melhores sonhos eu imaginava que mais de um milhão de pessoas iam estar dançando minhas músicas em uma plataforma de redes sociais, fora as outras. Nunca imaginei também que doze milhões de pessoas iriam assistir ao meu clipe. Realmente, o que tem acontecido comigo foram coisas que eu sonhei, mas que estão sendo ainda mais grandiosas. Eu imaginava que seria bem menos. Não imaginava essa proporção e essa rapidez com um mês e meio de lançamento. Meu público me abraçou muito.

TMDQA!: Com você vê esse processo de viralização que o TikTok proporciona? Você já era “tiktoker” antes?

Mari Fernandez: Na verdade, eu já consumia o Tik Tok antes. Eu gostava de ver a galera fazendo dancinhas e estava ali sempre antenada, mas eu não nasci muito para dançar [risos]. Só gostava de curtir o trabalho das pessoas. Mas precisamos falar sobre a proporção do Tik Tok e sobre a entrega que esse aplicativo tem. É uma rede social que entrega muito bem. Esse sucesso todo foi uma coisa que a gente nunca imaginou, e tudo orgânico. A gente não soltou o primeiro vídeo com a intenção de viralizar, até porque o meu empresário não era forte na plataforma e não tinha muitos seguidores. A gente apenas deixou levar, mas a plataforma entregou muito bem a “Não, Não Vou”. A gente só tem a agradecer a essa plataforma. Tinha gente com cinquenta seguidores tendo um milhão de visualizações em vídeo com a nossa dancinha.

“Eu nunca subi num palco para cantar”

TMDQA!: A pandemia, de fato, mudou a maneira como as pessoas consomem, produzem e divulgam música. Os shows ao vivo deixaram de ser uma realidade para muitos e assim seguimos até hoje, incluindo o tempo do lançamento do seu disco. Você imaginava que essa fama chegaria em você de outros modos?

Mari Fernandez: No meu sonho, o que eu mais imaginava era que, quando eu estourasse e me tornasse conhecida pelo público, a gente ia fazer show, ia estar no meio da galera. Mas, infelizmente, a gente não está podendo ainda. A gente sabe que a vacina é uma realidade e que, daqui a pouquinho, vai estar tudo voltando. Eu estou muito ansiosa para fazer show, porque eu nunca subi num palco para cantar, para dançar. Então, eu estou me preparando muito, ensaiando, preparando um show pra que as pessoas curtam bastante, que a gente entregue um sentimento além do CD, além de áudio, além da imagem da Mari Fernandez para o público. De vez em quando eu penso, como a “Não, Não Vou” se sairia se a gente tivesse tendo show?

TMDQA!: Quais são seus planos para o futuro de sua carreira?

Mari Fernandez: Bom, eu quero que venham outras músicas. A gente reconhece que a proporção da “Não, Não Vou” foi algo que a gente esperava ter quando tivesse pelo menos dez anos de carreira. Essa música nos trouxe um momento de extrema felicidade. Mas eu quero ter muitos anos de estrada, fazendo shows e tendo várias músicas. Quero ver as pessoas consumindo o meu trabalho. Quero ser inspiração para outras pessoas. Então, eu continuo com o mesmo pensamento de continuar com os meus projetos, de continuar subindo, até porque eu tenho vinte anos. Não vivi ainda muitos anos de experiência na música. Eu preciso adquirir isso pra pra ter uma carreira consolidada. Então, no momento, eu tenho me preocupado com o meu público e em fazer boas músicas para eles.

TMDQA!: Alguma consideração final?

Mari Fernandez: Eu comecei profissionalmente com quinze anos como compositora. Eu morava no interior do Ceará e e coloquei esse sonho na cabeça. Saí de casa, falei “Mãe, eu vou estourar” e sempre pensei positivo. Eu acho que, quando a gente sonha com algo, a gente tem que começar a colocar os nossos sonhos em ação da maneira que a gente pode colocar. Então, a maneira que eu encontrei para entrar no ramo musical foi começar compondo para, depois, conhecer algum empresário e gravar um projeto. É preciso acreditar. Nem todas as pessoas apoiavam, mas, mesmo assim, eu escutava as críticas construtivas para melhorar. Então, você pode ser o próximo! É só você querer.

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