Ashe

Por Nathália Pandeló Corrêa

A imagem de uma Califórnia solar quase nunca aparece nas músicas de Ashe. Não se deixe enganar pelo cabelo platinado da californiana de 28 anos. Ela já anunciava no primeiro EP, The Rabbit Hole (2018) que não tinha a menor vontade de ser mais um estereótipo.

Desde então, Ashlyn Rae Wilson vem construindo um cancioneiro onde destila os mais pesados dramas de quem passa pelas dores de crescimento. O seu divórcio inspirou boa parte dos dois EPs seguintes, The Moral of the Story, partes 1 e 2, ambos de 2019. Tudo culmina em Ashlyn, um álbum onde surge o luto pela perda do irmão. Sua estreia em álbum confirma o que muitos suspeitavam: temos aqui uma nova voz potente – não só como cantora, mas como compositora.

Ashe não discordaria. Ela se vê como uma “cantadora de histórias” e garante: todas são reais e inspiradas na sua própria vida. Se nos EPs o clima indie (no primeiro) e folk (os dois últimos) tiravam um pouco do peso da narrativa de corações partidos, no novo disco a sonoridade é mais intensa, com direito a todos os arranjos e instrumentos que cada música pedia. Ashlyn lida com assuntos pesados, mas sem se perder no marasmo. Ashe usa cada letra para reconhecer seu passado, aceitar o presente e dizer: estou pronta para seguir em frente.

E é isso que ela vem fazendo. Das paradas da Billboard aos billboards da Times Square, Ashe está pronta para fazer shows – ela já tem turnê anunciada na Europa – e até pensar no próximo disco. Enquanto isso, a artista conversou com o Tenho Mais Discos Que Amigos! sobre o atual momento da sua carreira.

Leia a entrevista exclusiva com Ashe logo abaixo.

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TMDQA!: Olá Ashe! Obrigada por seu tempo!

Ashe: Obrigada a você por me receber!

TMDQA!: Eu estou empolgada porque ouço os EPs há um tempo, e agora que o disco saiu, fica a sensação que você completou um ciclo – no sentido de que contou uma história com começo, meio e fim -, pelo menos nessa primeira parte da sua carreira. Você também tem essa sensação?

Ashe: Primeiro, obrigada por dizer isso! E sim, eu vejo dessa forma. Mas também sinto que estou no começo de algo. Com o disco sim, contei começo, meio e fim da história, mas agora que saiu, sinto que é um novo começo também e estou bem empolgada.

TMDQA!: E falando em completar ciclos, você canta sobre tanta coisa pessoal, sobre amor e perdas. Mas nos clipes, você está dançando. Não sei se estou vendo demais, mas seria uma forma de pensar que você saiu do outro lado com um sorriso no rosto, apesar de tudo que passou?

Ashe: Sim, acho que essa com certeza é uma forma de interpretar. Penso que a parte da dança, em particular, é uma forma tão única de auto expressão, é uma forma tão libertadora de se expressar. E no clipe de “Me Without You” eu tenho esses pequenos momentos dançando e é muito eu me encontrando de novo, uma auto descoberta, o que é muito poderoso. E mesmo em meio a coisas difíceis, há esse elemento de leveza que a dança traz. Fazer a coreografia em “Till forever falls apart”, com o Finneas, foi assim porque cantávamos sobre um amor que dura até que se destrói, então pensamos “vamos só curtir esse momento e rodopiar um com o outro”. Há tanta beleza no caos da vida e acho que a dança é isso.

TMDQA!: Qual foi o último clipe que você lançou mesmo? Aquele em que você dança em cima de um balcão de bar?

Ashe: Esse é o “Me Without You”.

TMDQA!: Isso! Foi muito libertador ver você dançando em cima do vidro quebrado.

Ashe: Sim!

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TMDQA!: Você estava falando de auto expressão e sei que você foi criada numa casa cristã, eu também fui. Não sei se dançar fazia parte da sua vida – certamente não fez parte da minha! -, e agora sinto que essa parte religiosa não faz parte necessariamente da sua vida agora. Como você se relaciona com essas origens?

Ashe: Eu era bem rígida com isso quando era mais jovem, e agora sou bem menos. Longe de mim dizer que não há mais nada acontecendo lá em cima. Muita mágica já aconteceu na minha vida pra eu acreditar que se trata apenas do acaso, que simplesmente aconteceu. Acredite no que você quiser acreditar – essa também é uma forma de auto expressão, certo? Nós todos precisamos saber e amar o que acreditamos. Não sei, mas eu amo muito minhas origens e sou muito grata pelo lugar de onde vim, me ensinou a ser um humano bom, que ama o próximo, valoriza as pessoas, então aprecio tudo isso. Não sei exatamente onde estou dentro desse assunto do que acreditar, mas sinto que há mais coisas acontecendo do que apenas isso, o que podemos tocar, sentir e ver. Não acho que seja só isso. Mas não sei definir.

TMDQA!: Sei exatamente o que você quer dizer. Mas voltando à música: sei que você se inspira muito pela década de 70, inclusive todas as roupas que você usa hoje em dia são lindas!

Ashe: [exibindo o blazer] Obrigada!

TMDQA!: É verdade! Mas a música é muito moderna, você não está tentando imitar os sons daquela época (embora algumas pessoas te comparem com Carole King e coisas do tipo). Então fiquei curiosa com o direcionamento que você deu pro Finneas ou outras pessoas com quem você estava trabalhando em termos de como queria que o disco soasse. Eu sei que você disse numa entrevista que queria honrar o som de The Moral of the Story, porque foi essa música que fez as pessoas pararem pra te ouvir. Mas pra onde você se vê indo a partir daí? Agora que fez isso, pensa que pode explorar outras sonoridades nos próximos discos?

Ashe: Eu sou coprodutora executiva no disco, então eu fiquei controlando o som e o direcionamento e o formato do álbum. É um dos motivos porque me sinto tão orgulhosa dele, estive muito envolvida desde a composição à produção. Esse som honra The Moral of the Story e também discos que eu cresci amando. Você citou Carole King, tem também os Beach Boys, Beatles, essa música pela qual me apaixonei muito cedo. Ao mesmo tempo que eu nunca tentaria copiar… Aliás, esses discos já são perfeitos! Por que eu tentaria recriar algo que já existe e é perfeito?

Mas há inspirações e dá pra ouvir isso no disco, com certeza. Inspirações de Queen, Abba e muitos álbuns antigos. Mas eu estou fazendo música em 2021, então há muitos elementos modernos. Havia limitações ao que se conseguia criar nos anos 60 e 70 e havia apenas algumas ferramentas para se fazer música, e agora existem tantas ferramentas e brinquedinhos e cores, então só quero brincar com todos eles. E onde eu vou com a minha música… não sei! Estou empolgada para começar a trabalhar no segundo disco e ver onde vai dar. Em geral tudo começa no piano, então estou interessada se o segundo será mais rígido. Porque esse primeiro é grandioso, e amo isso. E me pergunto se o próximo será um pouco mais simplificado… Não sei.

TMDQA!: Eu sei que você acabou de lançar o primeiro, então sem pressão!

Ashe: (risos) Obrigada! Me dá um minutinho pra respirar!

TMDQA!: Mas então focando nas composições, estávamos comentando sobre como você escreve de um ponto de vista pessoal. Mas às vezes parece que você está apenas contando uma história – tipo o conceito de Chapter 1 e Chapter 2, The Moral of the Story, etc. E elas parecem reais, embora até possam não ser. Parece que você escreve da perspectiva de um personagem. Você trata dessa forma, como se fosse contar uma história, talvez?

Ashe: Sim, eu diria que eu sou uma contadora de histórias antes de tudo. Antes de ser cantora, performer, sou escritora, contadora de histórias primeiro. Por isso acho que escrever um livro um dia soa excitante pra mim. A escrita foi a minha primeira paixão. A melhor forma que encontrei para processar o que acontece na minha vida – os melhores e mais empolgantes momentos, e os momentos que foram péssimos, os piores. Eu só sei processar isso através da escrita. Não sou muito boa em pegar um personagem e escrever sobre ele. Eu definitivamente escrevo melhor ao falar da minha própria vida. É… (pausa) São todas inspiradas em histórias reais, são todas verdadeiras.

TMDQA!: Uau! (risos) O bom e o ruim.

Ashe: O bom e o muito, muito ruim (risos).

TMDQA!: Você tem uma voz muito distinta – como compositora, digo. Como cantora também, mas falando especificamente da parte de autoria. As pessoas podem até ter te ouvido antes, mesmo sem saber, porque você já compôs pra outros artistas. Mas agora, é tudo Ashe, certo? Isso te torna mais autoconsciente? Tipo, “minha mãe vai me ouvir dizendo essas palavras”? (risos) Sabe, as palavras agora saem da sua boca. Isso tem outro peso pra você?

Ashe: Essa é uma boa pergunta. Acho que nunca pensei muito nisso. É só a coisa certa pra eu fazer. É o que eu tenho que fazer. Eu não tentei me preocupar muito com isso. Mas digo o seguinte: chamei meu disco de Ashlyn, que é meu nome verdadeiro. Então, sabe, não tem como separar mais. Não há mais a artista “Ashe”. Existe “Ashlyn”. Nós entramos na Billboard 200 – meu disco estreou na posição 194 – e tinha logo ao lado do número da posição: “Ashlyn”. E eu fiquei tipo [coloca as duas mãos na cabeça]. A sensação é muito estranha, olhar o meu nome lá. É muito empolgante, mas também sinto que estou totalmente nua em público. Mas estou orgulhosa do que fiz, então se minha mãe estiver ouvindo, sei que ela vai ficar orgulhosa também.

TMDQA!: E porque é quem você é.

Ashe: Totalmente.

TMDQA!: E quando o disco saiu, você tuitou algo tipo “esse disco é a minha vida”. E eu entendo isso, até porque se você pensar, você levou a vida toda pra escrever essas canções. São um produto de quem você se tornou nesses 20 e poucos anos. Mas falando em próximos passos, agora você vai escrever sob outro ponto de vista: o de alguém que esteve no Billboard 200.

Ashe: [faz cara de assustada]

TMDQA!: Ou de alguém que tem shows esgotados em toda parte.

Ashe: [levanta os braços em comemoração]

TMDQA!: E eu quero te perguntar sobre isso! Mas antes, queria saber: você acha que isso vai mudar como você vai lidar com a sua música?

Ashe: Acho que isso inevitavelmente vai acontecer. Como poderia não mudar? Mas acho que vai mudar as coisas para melhor. Pode até haver prós e contras. Quando você escreve uma música e você pensa que ninguém vai se importar ou ouvir, você escreve essa música de uma forma totalmente diferente. E agora sei que as pessoas vão ouvir. A abordagem vai ser um pouco diferente, mas estou muito mais confiante agora. Não estou com medo das pessoas amarem ou odiarem o disco, vai haver pessoas por aí dizendo que eu não mereço o que tenho e tudo isso é ok e estou aprendendo que está tudo bem. Estou confiante na minha própria voz, então acho que o próximo disco que eu fizer, vou continuar tocando nos assuntos que fazem de mim quem eu sou e o que há de único no que eu amo. E se eu começar a partir daí, provavelmente vou fazer mais boas músicas. Mas não sei.

TMDQA!: Então só mais uma pergunta: sei lá quando a gente vai ter música ao vivo de novo por aqui, mas você anunciou uma turnê europeia. Então queria saber como você imagina que o disco vai ficar ao vivo, pois como você mesma disse, ele é bem grandioso musicalmente. E isso significa que tem brasileiro lotando suas redes sociais com pedidos pra vir pra cá?

Ashe: (risos) “Come to Braziiiil”!

TMDQA!: É isso que a gente faz no nosso tempo livre, até os artistas virem (risos).

Ashe: Adoro! Eu acho que quando eu conseguir tocar no Brasil, vai ser o show mais divertido. Todas as histórias que eu ouço de outros artistas, tipo o Niall Horan, que já tocou no Brasil antes, todos que já tocaram lá, falam “eles são intensos, é muito divertido”. Intenso no melhor sentido. Estou empolgada, ainda estamos tentando entender como vai ser, porque com a pandemia, tudo fica complicado. Mas quando a gente anunciou a turnê, eu fiquei pensando que queria muito estar indo pro Brasil também, porque eu quero ir. É egoísta, sabe? É só porque EU quero ir. Mas você fez uma boa pergunta. Não tenho certeza de como o álbum vai ser ao vivo, acabei de começar a pensar na produção, design de palco, a experiência para os fãs, do momento em que eles entram no local do show até chegarem aos seus lugares, à compra dos produtos oficiais, à música que vai estar tocando enquanto eles esperam por mim. Tudo vai ter uma boa curadoria e quero escolher com cuidado. Não sei, mas vou começar a cavar tudo isso. Mas posso adiantar que vai ser ótimo!

TMDQA!: Bom, e eu posso te dizer que se você vier, as pessoas vão comparecer. E se prepara, porque a gente canta alto.

Ashe: Ótimo, a gente pode competir, porque eu canto muito alto também (risos).

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