Tupac Shakur (2Pac)

Ontem (06), viralizaram pelo mundo imagens de apoiadores do presidente norte-americano Donald Trump invadindo o Capitólio (o que foi até “previsto” pelos Simpsons). O episódio, sobre o qual muitos comentam que pode ser o catalisador para uma possível Guerra Civil no país, interrompeu a sessão de confirmação da vitória de Joe Biden como novo presidente no Congresso norte-americano.

Também chamou atenção e gerou inconformidade o tratamento policial brando dado aos invasores, em sua maioria brancos. Foram feitas comparações com os episódios do movimento Black Lives Matter, no ano passado. Mas não podemos ser inocentes e tratar a violência policial contra negros como uma novidade, já que episódios de racismo já ocasionaram a morte de muitos negros inocentes nos Estados Unidos (e no mundo). Na música, vários artistas, especialmente no mundo do hip hop já denunciaram esse tipo de abuso.

Tupac Shakur, o emblemático 2Pac, é um exemplo disso. Além de relatar suas vivências, o rapper também já escreveu letras que relatam aspectos da nossa sociedade que precisam ser mudados com urgência. “Changes“, lançada na parte final da década, é uma dessas canções, e talvez a mais emblemática. É também o tema do #TBTMDQA de hoje.

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Confira algumas curiosidades abaixo, logo após o vídeo.

 

Sucesso póstumo

Gravada originalmente em 1992, mas remixada em 1998 para entrar em seu Greatest Hits, “Changes” foi uma canção póstuma, lançada dois anos após o assassinato de 2Pac em 1996.

Dentro da tracklist do álbum, também ganharam espaço as canções “God Bless The Dead“, “Unconditional Love” e “Troublesome ’96“. Além deste, foram disponibilizados seis discos de estúdio póstumos, sendo o último deles Pac’s Life, de 2006.

 

História no Grammy

Por sinal, o fato de ser um lançamento póstumo faz de “Changes” um capítulo até hoje único na história do Grammy, a maior premiação do mundo da música.

Em 2000, a canção foi indicada na categoria de Melhor Performance Solo de Rap, junto a hits de Busta Rhymes, Eminem, Q-Tip e Will Smith. No final das contas, perdeu para Eminem e sua “My Name Is”, mas esse episódio fez de 2Pac o único artista a ser indicado nessa categoria com uma canção póstuma.

 

O sample

A base da qual 2Pac se apropriou para falar sobre a falta de mudanças sociais no mundo já era bem conhecida anteriormente. Isso porque não tem como não reconhecer “The Way It Is“, da banda Bruce Hornsby and the Range, logo pelas primeiras notas tocadas.

A canção, lançada originalmente em 1986, foi para o topo da Billboard Hot 100 e não tardou a se tornar o maior sucesso do grupo. Mas a escolha não foi à toa, já que a música original faz referência explícita à busca dos negros por direitos civis e pelo fim da discriminação racial.

A canção de Hornsby também já foi “sampleada” por outros nomes do hip hop, como Wyclef Jean, E-40 e Snoop Dogg.

 

As coisas vão mudar

O refrão da música também faz referência clara à letra de “The Way It Is” e é cantado na voz de Talent. No entanto, fica evidente a troca do verso “Some things’ll never change” para “Things will never be the same”. De certa forma, isso inverte a mensagem da música.

O novo verso apresentado em “Changes” sugere que, sim, a mudança está a chegar, apesar de todo o cenário pessimista apresentado por 2Pac.

 

“Inteligente e profundo”

Em 2011, ano que marcou o aniversário de 15 anos da morte de 2Pac, o L.A. Weekly entrevistou Bruce Hornsby sobre “Changes” e sua relação com o rapper.

Na ocasião, ele disse que não chegou a conhecer 2Pac pessoalmente, e tampouco acompanhava seu trabalho. Ele relembra ter recebido a versão original em fita cassete:

Um ano após seu assassinato, recebi uma fita cassete da Shakur Foundation por correio, dizendo ‘Nós encontramos essa música. Vai ser o single do álbum de Greatest Hits que está prestes a sair’. A original era muito mais suja, com a ‘palavra com n’ sendo repetida várias vezes. Eu não pedi nada. Foi a criação deles e não era meu lugar para opinar.

Ele ainda contou que adorou o que 2Pac fez, e disse que, dali em diante, não demorou para se tornar fã de seu trabalho:

Quando o disco saiu, me mandaram. Eu nunca tinha prestado muita atenção no trabalho dele. Fiquei chocado com sua criatividade. Achei ele muito inteligente e profundo. A música dele tem muita seriedade para mim.

 

Reflexões sobre raça, classes sociais e política

“Changes” é basicamente uma meditação de 2Pac onde ele se questiona sobre aspectos da nossa sociedade que, infelizmente, nunca mudam.

Após a infância pobre, o rapper traz visões importantes sobre desigualdade social, especialmente no que diz respeito à cor da pele. Em seu discurso, ganham destaque a violência policial, a fome e o pedido pela mudança desse paradigma da sociedade.

Policiais não dão a mínima para um negro
Se puxarem o gatilho, se matarem um negro, eles são heróis

Ah, e vale frisar que ele falou isso há mais de 20 anos. Em relação aos dias atuais, alguma coisa mudou?

Meme da série "Family Guy"
Foto: Reprodução / Twitter

 

Referências

Para ilustrar seu posicionamento na letra da música, o rapper usou alguns episódios históricos.

2Pac cita Huey P. Newton, fundador dos Panteras Negras, por sua frase “É hora de contra-atacar”. A raça branca ainda é mencionada na letra como “Devil”, em referência a um termo usado por grupos de empoderamento negro da época. Ele ainda relembra a ainda recente Guerra do Golfo como exemplo de que o país presta mais atenção nos outros países do que na própria corrupção que o assola.

Ele também usa dados estatísticos, como o fato de que a maioria da população carcerária no país é constituída por negros. Além disso, faz referência à atenção voltada ao tráfico de crack nos anos 80 e 90.

 

Presidente negro

Isso tudo sem falar, é claro, na passagem “And although it seems heaven-sent, we ain’t ready to see a black president”. Com isso, 2Pac quis dizer que, em um país racista, ter um presidente negro acabaria simbolizando mais divisão e ódio.

Dez anos após o lançamento oficial da música, em 2008, Barack Obama foi eleito presidente dos Estados Unidos. No entanto, apesar de seus esforços em unir o país, tanto política quanto socialmente, os casos de violência racial continuaram nos Estados Unidos. Após seu mandato de oito anos (Obama foi reeleito em 2012), Donald Trump se tornou o novo presidente do país sob acusações de racismo tanto de sua parte quanto da parte de seus apoiadores.

O resto, pois bem, é a história que estamos vendo se desenhar.

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