Sandy no EP visual
Foto: Divulgação

Com a ascensão do coronavírus, veio um grande momento de reflexão para todos nós, tanto enquanto indivíduos quanto enquanto sociedade. Dentro dos últimos claustrofóbicos meses, cada um aprendeu a lidar com suas particularidades sobre tudo que veio a ser potencializado com a pandemia.

Vemos isso com clareza no mundo da música. Em seus novos lançamentos, artistas têm se reinventado cada vez mais, tanto esteticamente quanto em termos mercadológicos. Os temas, em grande parte, revelam essa grande angústia da classe artística em não ter contato com seu público, em não poder participar de grandes eventos. Apesar de ser algo inquestionavelmente limitante, eles têm conseguido driblar as dificuldades, se expressando de maneiras legítimas que contagiam o público como um encontro presencial.

Tome como exemplo a cantora Sandy, um dos maiores nomes da história do pop brasileiro, que acaba de colocar para fora o que sente, de forma legítima, sincera e melódica, em seu novo EP 10:39. Trata-se de seu primeiro grande lançamento desde 2018, quando lançou o álbum Nós VOZ Eles (desconsiderando a releitura de “Estrela“, de Gilberto Gil, lançada este ano por ela e seu marido Lucas Lima, e todo o estrondoso sucesso da turnê Nossa História, da dupla Sandy & Junior).

 

Curto e certeiro

O TMDQA! foi convidado para uma coletiva surpresa, sem maiores detalhes sobre o que estava por vir. Eis que, logo no início da exibição do curta que acompanha o EP (dirigido por Douglas Aguillar), ouvimos através da voz de Sandy os primeiros versos de “Piloto Automático“, um dos maiores e mais belos sucessos do grupo Supercombo. Trata-se de uma versão ainda mais sóbria do que a original, mas com uma ambientação imersiva. No clipe, vemos a cantora percorrendo uma floresta ao som de dizeres como “Eu nunca fiz questão de existir” e “Até parece que meus travesseiros pesam uma tonelada”.

Na sequência, o vídeo recebe o acompanhamento musical de uma nova versão de “Lua Cheia“, canção lançada pelo grupo 5 a Seco no disco Síntese (2018). Igualmente tocante, a inserção da faixa releva uma espécie de narrativa. Da percepção pela vida e seu melhor proveito que emana da canção da Supercombo, vem a insegurança. Esse choque dá margem à revelação de um mundo decepcionante que, segundo a letra, reclama demais. No entanto, a esperança se mostra necessária.

Sandy no EP visual "10:39"
Foto: Divulgação

E é justamente nesse momento que emana a única faixa autoral de Sandy no projeto. “Tempo“, canção originalmente lançada em 2010, no disco de estreia solo Manuscrito, fecha o EP com chave de ouro. É a esperança por dias melhores, em um contexto em que acredita-se que o tempo cura as feridas e leva a dor (e os momentos ruins) embora. “Isso vai passar”, repete-se ao fim. Enquanto isso, as imagens mostram Sandy gritando (um grito real e catártico, segundo a própria cantora), que põe para fora todas as angústias acumuladas. A esperança, no fim, é o que nos motiva.

Tudo isso, toda essa jornada de autoconhecimento foi concluída em, justamente, 10 minutos e 39 segundos, o que responde eventuais dúvidas sobre o nome do projeto.

 

O folklore brasileiro?

10:39 é, basicamente, um EP fruto dos atuais tempos que, pasmem, também é feito para os atuais tempos. Ao relacionar o lançamento com as atuais tensões sociais, a cantora deixou claro que estamos carentes de empatia. “Um olhar mais amoroso é o que está faltando”, ressaltou durante a coletiva.

Em termos estéticos, jornalistas presentes no evento compararam o olhar mais introspectivo do novo EP com folklore, disco mais recente de Taylor Swift. No entanto, Sandy não estava completamente inteirada com o novo álbum, especialmente no que diz respeito à sua parte visual. Ela citou, tentando traçar algum paralelo, Bon Iver como grande inspiração. O músico tem uma participação expressiva em folklore, cantando com Taylor o dueto “exile“.

 

A escolha das covers

É interessante notar que, apesar de um EP extremamente pessoal, 2/3 de 10:39 (algo por volta de 6:43) é composto por releituras de outros artistas. Questionada na coletiva sobre as escolhas, ela contou que selecionou músicas que possuem um grande significado para ela.

Agora, em tempos de quarentena, essas canções tiveram seu significado potencializado. Ao reouvir “Lua Cheia”, Sandy se lembra de ter se emocionado, inclusive chamando seu marido para sentir a energia. Em resposta ao TMDQA!, Sandy falou sobre “Piloto Automático”, resgatando em sua memória diversos outros grupos que teve a oportunidade de ver crescendo:

Eu conheci essa música quando eu fiz o Superstar. Foi o primeiro projeto no qual eu trabalhei depois da maternidade. Eu fui jurada em dois anos seguidos do programa, e lá eu conheci a banda Supercombo. Eles são uma banda muito boa e são ótimos compositores. Eu já me apaixonei bastante por essa música naquela época. Era a minha favorita deles. De vez em quando, eu ouvia e achava legal, mas quem chamou a minha atenção em relação a essa música, neste ano, foi o Lucas, meu marido. Estávamos falando sobre a mensagem do EP, e aí ele lembrou dessa música. Acho que a letra dessa música é maravilhosa. É também muito atemporal. Todas as músicas deste EP são, de fato, muito atemporais.

(…)

Eu crio muitas conexões. Eu sou uma pessoa que procura estar muito presente nas coisas que faço, me entregando por inteira. Por onde eu passo, eu crio conexões. Eu vejo onde e com quem eu me identifico e trago o que acho, para mim, que me completa de alguma maneira, o que me diz alguma coisa. Eu fiz os dois anos do Superstar e gravei uma música com Outro Eu. Compus algumas músicas com o Daniel Lopes, que era da banda Reverse. Gravei com a banda Melim também. Graças a Deus, quando fui jurada, eu dei 5 para eles todos (risos). Também tem o João Milliet, da banda Pagan John, que hoje toca na minha banda e mixa todas as minhas músicas. Gravei com eles e agora gravei uma música da Supercombo, que eu também conheci no Superstar. Olha que interessante!

 

“Às vezes a gente precisa admitir que existe um pouco de magia”

Mas como é possível unir três canções de compositores diferentes e lançadas por artistas diferentes em uma única narrativa? É intrigante ver como Sandy consegue se apropriar das letras em novos arranjos que fazem com que as canções soassem como já familiares a seu extenso repertório.

Sobre o fio condutor que costumou as músicas de 10:39, a cantora conta, em resposta ao TMDQA!:

Foi uma inspiração de verdade. Eu gosto mais de basear as minhas análises em coisas mais objetivas e racionais. Eu sou uma pessoa muito racional, mas às vezes a gente precisa admitir que existe um pouco de magia [risos]. Eu dei voz a isso, a essa inspiração. Foi uma coisa meio mágica, que foi se ligando. As ideias foram vindo e enxergamos a narrativa dessa maneira. Eu enxerguei essas três músicas como as músicas que eu queria nesse EP. Na hora de fazer a ordem, eu e o Lucas conversamos e chegamos a isso em um momento de inspiração. Acho que era para ser isso mesmo, desse jeito. É muito legal e doido isso. Acho que faz parte do processo artístico.

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