Foto: Jethero Miranda

Quando um artista que costuma ser compositor de uma banda lança um trabalho solo, é natural esperarmos que algo característico dessa banda vá junto com ele.

Mas no caso de Rubens da Selva e o seu álbum de estreia, Existe Um Cachorro Faminto na Minha Barriga Latindo pra Você, podemos adiantar que deve-se esperar muito mais do que isso.

Membro de bandas como Mustache e os Apaches, Mescalines e Os Barbapapas, Rubens já demonstra ter uma pluralidade enorme em sua música devido as diferentes propostas de cada projeto, e isso se reflete muito bem nesse seu primeiro trabalho assinado sozinho.

Buscando uma união de ritmos brasileiros, estadunidenses e de todo os outros cantos da nossa América, Rubens prova ser um artista continental, que não precisa de exageros para mostrar toda sua rica musicalidade.

Para entendermos melhor os caminhos que levaram Rubens até Existe Um Cachorro […], entrevistamos o artista por e-mail, onde ele nos explicou o seu processo de composição, conceito do álbum e também como pretende performar esse álbum em sua divulgação.

Confira a entrevista logo após o player de Existe Um Cachorro Faminto na Minha Barriga Latindo pra Você:

https://open.spotify.com/album/1MqJyYNklpvha2ceoVEJQp?si=hCXPG6KDRQySXiGQXzOZNA

TMDQA!: Para começarmos a conversa, nos diga: O que te levou a assumir-se como artista solo? E o que soma dos projetos dos quais você já participou e o que é mais subjetivo, que você só poderia fazer assinando sozinho?

Rubens: Nos Apaches somos cinco compositores e o Mescalines é instrumental, então a cada safra vinham sobrando músicas. A ideia de gravar meu disco veio da necessidade de desengavetar essas ideias, essa energia. Nesse trabalho solo exerço o que venho desenvolvendo nos Apaches, que é o lado canção, intérprete, junto das afinações abertas na guitarra e pesquisa folclórica, característica do Mescalines, duo instrumental, e n’Os Barbapapas, trio também instrumental e projeto mais recente. Cada grupo tem sua entidade ou identidade, então o que tem de mais subjetivo é dar voz ao que não cabe nos grupos, que acho que é meu lado poético mais denso e direto, inspirado na Nova Canção Latino-Americana. Gosto de trabalhar em grupo, mas também trabalhar solo, que é uma página sem pauta ou margem para você criar, é como viajar sozinho.

TMDQA!: Na música brasileira, desde a Tropicália, muito se fala sobre a antropofagia cultural que faz a identidade da nossa arte, misturada e cheia de vertentes. No seu caso, podemos dizer que se trata mais de uma união do que uma mistura, pois os elementos de baião, música latino-americana e o próprio blues e rock se mostram de maneira muito natural no encaminhar do álbum. Como funciona o seu processo de composição e o que leva todos esses elementos a se encontrarem de uma maneira – aparentemente – tão fácil?

Rubens: Gosto da ideia de a música ser cigana por si e sempre estar sujeita a mutação. Os primeiros gaúchos daqui eram nômades que se uniram e mesclaram a música moura com indígena e africana, então surgiu a chacarera, o candombe, o tango, enquanto no norte e nordeste surgem ritmos como o baião, maracatu e o carimbó, e tu vê que tudo se conversa. Pixinguinha que misturou jazz com samba, Baden Powell e os afro-sambas, Lula Côrtes, Jorge Ben, Os Mutantes, (Gilberto) Gil, dentre outros, abriram um leque de possibilidades na música popular. Depois de um tempo de pesquisa e tentar reatar um elo entre a música do Saara, o Mississippi, dos pampas e do sertão nordestino, eu parei de ouvir música assiduamente, pra absorver tudo. Acho que é importante o silêncio pra digerir e deixar vir a tona algo mais original, que está impregnado no seu DNA musical ou a sua própria ancestralidade. Então comecei a andar com a guitarra pela cidade observando e compondo enquanto caminhava. Gosto da música que só vai, a pira modal e hipnótica, acho que a guitarra em afinações abertas em andanças pela babilônica cidade de São Paulo, favoreceu a peculiaridade e frenesi de ritmos sincronizados.

TMDQA!: Entre os gêneros que podemos observar dentro de Existe Um Cachorro […], ritmos latinos como o tango, a Música Popular Chilena e outras vertentes dos países sul-americanos parecem ter um certo destaque dentro do álbum. Somando isso com a faixa “Canção da América do Sul”, gostaria que você nos falasse sobre a motivação que te levou a esse passeio pelo nosso continente através da sonoridade e da ideologia das letras?

Rubens: Acho que não só eu como inúmeros artistas da atualidade estamos numa maré cheia de vontade e voltados pros nossos, é cíclico. Quando derrubam a democracia na América Latina, para implantar um plano neo-liberal fascista e sem identidade, temos o dever de mostrar para que serve a arte e através dela firmar nossas raízes para resistir a homogeneização, ao enlatado. Admiro compositores como Atahualpa Yupanqui, Victor Jara, Violeta Parra que cantaram e deram voz ao povo contra os opressores de suas épocas.

TMDQA!: Por fim, nos fale como está sendo o planejamento de levar esse álbum para os palcos, visto que percussões, backing vocals, violinos e rabecas o acompanham durante as faixas. Aproveite e nos conte também sobre os próximos passos da turnê de divulgação de Existe Um Cachorro Faminto Na Minha Barriga Latindo pra Você.

Rubens: Quero levar a formação completa, com metais, rabecas, baixo, guitarra, backings, congas, leguero e demais percussões sempre que possível, mas se o caso for fazer uma versão reduzida ou até mesmo solo, pegando carona, não vou me limitar. Já tenho alguns shows em vista e lugares em mente. O que pretendo é tocar mais pelo norte e nordeste e em nossos países hermanos.

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