É 2019 e todos sabemos que estamos vivendo em um mundo onde as tensões políticas e sociais estão à flor da pele.
A banda brasileira de hardcore Malvina está lançando um novo disco de estúdio chamado Hybrid War onde fala sobre a teoria das “Guerras Híbridas”, que seriam táticas intervencionistas adotadas pelos Estados Unidos para manipular governos ao redor do globo, o que segundo o grupo, estaria sendo feito no Brasil.
Para explicar todo conceito, a banda fez um faixa a faixa onde detalhou cada uma das dez canções do álbum e você pode ver tudo logo abaixo.
“Quantos de vocês permanecem ilesos nessa perspectiva?”
Flashes do golpe em curso no Brasil se sucedem de forma anárquica. O papel da classe média é mencionado com a ironia das manifestações “populares” anti-Brasil, conduzidas pelo capital estrangeiro através do MBL – financiado pelos irmãos Koch -, e pelos interesses da ínfima elite nacional através do Vemprarua, do bilionário Jorge Paulo Lehman e Revoltados Online, do empresário Marcelo Reis.
São essas as forças que conduzem os “Amarelos”, que desfilam ao longo do verso. A ameaça de um Estado Policial e autoritário figura em um horizonte fechado, sobre uma terra de recursos e garantias sociais roubadas.
“Você é a força que nos ataca?”
A gênese da atual crise é abordada com a adrenalina das Jornadas de Junho de 2013 no Brasil. O ódio de classe reprimido da classe média ao longo da primeira década do século 21 é liberto em uma campanha contra a corrupção que acaba por determinar o saque dos recursos nacionais e a retirada de garantias trabalhistas, em um realinhamento à política imperialista dos EUA.
“E esse programa de remoção irá continuar, depois que tiver ganhado ou perdido.”
As Olimpíadas de 2016 marcaram o início do processo de destruição da democracia e das conquistas sociais no Brasil em nome de interesses transnacionais e de uma ínfima elite nacional. As remoções como na Vila Autódromo, na Zona Oeste do Rio, e a maior truculência policial nas zonas mais pobres da cidade inauguraram o jogo neoliberal e antidemocrático que vivemos hoje sob o governo ilegítimo de Bolsonaro.
Herakleion, nome de uma antiga cidade egípcia que afundou, é uma metáfora que ataca o caráter criminoso das políticas neoliberais responsáveis por desastres como o de Mariana e Brumadinho, e a lógica higienista atrelada à especulação imobiliária. A limpeza social visa esconder os marginalizados e miseráveis destruindo moradias e assassinando gente.
Transformando as classes baixas em barro escuro,
E então, gigantescos painéis de vidro refletivo.
Ao invés do reflexo do mar, o reflexo dos espelhos cobre as terras arrasadas. Herakleion é um crossover de hardcore e thrash metal que explora alguns elementos de psicodelia.
“O partido político da elite do dinheiro nunca vai nos permitir participar diretamente das questões e escolhas que definem as nossas vidas sem criminalizar o nosso apelo.”
O caos de uma anomia fabricada pela grande mídia, quando os protestos de 2013 não haviam ainda sido cooptados pela direita, e se tratavam de manifestações contra o aumento das passagens, é o elemento principal dessa que pode considerada uma das músicas mais agressivas do disco.
A Rede Globo criou um cenário de guerra e, através da distorção e da manipulação dos fatos, contaminou o país com a onda de medo indispensável para uma troca de regime.
“Eu queria acreditar no paraíso,
Queria ouvir sua voz, mas nunca pude
Eu queria acreditar no paraíso, porque nós nunca te encontramos. ”
Essa música é uma homenagem a Ruy Carlos Vieira Berbert, tio dos irmãos Berbert, assassinado na ditadura militar.
Estudante de Letras da USP, Ruy Carlos decidiu dedicar a vida à luta pela liberdade e enfrentou a ditadura. Após sua prisão no Congresso da UNE em Ibiúna em 68, passou a integrar o Movimento de Libertação Popular. Ruy recebeu treinamento de guerrilha em Cuba e, ao retornar ao Brasil, foi preso e assassinado em Natividade. Por duas décadas, três governos militares e dois civis sabiam de sua morte e nunca informaram à família.
Enquanto a escuridão corrói, um pai cava um buraco sem fundo.
A última frase da música expressa a tortura que a ditadura militar exercia fora das salas de interrogatório, negando às famílias o direito de saber se seus entes estavam vivos ou mortos.
Ruy Carlos Berbert teve um enterro simbólico, seu corpo e restos mortais nunca foram encontrados.
“Um caminho perigoso pra redescoberta do amor para além da estreita noção de recompensa.”
As coordenadas pra uma longa batalha por recursos escassos nos são impostas desde o nascimento. A desigualdade – base do sistema – se legitima através de status quo, pertencimento de classe ou pela total ausência de direitos. Esse “melhor dos mundos possíveis” se faz de muros e medos, e condena os que ousam quebrar seu encanto.
“O quão longe ele vai,
Isso só significa a proximidade do recomeço.”
A banda experimenta novos caminhos nessa faixa e retorna à cenas da recente história brasileira em um ônibus conduzido pela amargura de um trabalhador do Brasil atual.
“Essa caminhada moral apenas cede o nosso petróleo.”
O grupo de jovens estudantes que, após regressar da pós-graduação oferecida pela Universidade de Chicago, atuou como o braço direito de Pinochet e fez do Chile um laboratório das políticas neoliberais nos anos 80, chega ao Brasil de 2013.
Apesar do ministro Paulo Guedes ter sido de fato um Chicago Boy e ter trabalhado para o Pinochet, os Garotos de Chicago na música são outros. O Movimento Brasil Livre (MBL), um dos grupos mais proeminentes na campanha pelo impeachment de Dilma Rousseff, também composto por jovens adeptos de Milton Friedman é, assim como o Instituto Millenium, Instituto Liberal e o Instituto Mises, ligado a uma rede internacional de think tanks cujo centro é a Atlas Network, sediada em Washington e financiada pelos Koch Brothers, bilionários do Petróleo, entre outros.
O papel desses agentes no Brasil e na América Latina é realinhar as políticas de acordo com os interesses imperialistas. Os discursos e motes nacionalistas são construídos à medida para esconder o ímpeto de destruição da soberania popular e a entrega das empresas e recursos do país. Minando a democracia os Chicago Boys trazem “o rosto conhecido” da ditadura.
“Como amamos nossos pequenos bebês,
Mas eles merecem esse mundo deserto que planejamos.”
Ao negar o aquecimento global e as mudanças climáticas, o super-homem neoliberal nega a história da espécie humana e assim condena o seu futuro.
As estátuas moais da Ilha de Páscoa representam o alto grau de complexidade que os nativos atingiram antes de se extinguirem. Vivemos sob a ameaça de um simples “click” em um de nossos dispositivos nucleares. Reduzimos a biodiversidade a um nível abaixo do limite sugerido como “seguro” pra sobrevivência da espécie humana e nenhuma mudança drástica é adotada no nosso cotidiano destrutivo – Trump e Bolsonaro nos demonstram exatamente o contrário.
Nossa conivência com transnacionais “ecocidas” são ofuscadas pelo brilho de smartphones enquanto condenamos as próximas gerações, a vida daqueles que mais amamos.