Vagabon
Foto: Ebru Yildiz

Por Nathália Pandeló Corrêa

Laetitia Tamko é uma multi-instrumentista polivalente. Nascida em Camarões, ela se mudou com a família para Nova York na adolescência e, aos 17, ganhou uma guitarra dos pais. Hoje, aos 26, ela é conhecida como Vagabon e colhe os louros de Infinite Worlds, primeiro disco de seu trabalho inspirado pelo indie e lo-fi no qual toca ainda bateria, sintetizador e teclados.

Nem sempre foi assim. Laetitia cresceu no cenário punk e foi de lá que veio essa filosofia do do it yourself. Ela leva tão a sério que vai assinar a produção, com tudo que tem direito, de seu próximo disco, que acabou de gravar e deve sair até o final do ano. Antes disso, porém, Vagabon chega ao Brasil para um show aguardado no Balaclava Fest, que acontece neste sábado (27) em São Paulo, onde divide a noite com Ride e Terno Rei.

Como parte de uma nova leva de artistas femininas empunhando suas guitarras para desbravar o mainstream novamente, Vagabon tem tudo para solidificar seu nome de vez com o próximo trabalho, ampliando a sonoridade elogiada de Infinite Worlds e do EP Persian Gardens. É só o começo para a artista que surgiu com uma demo no Bandcamp. Ela contou ao Tenho Mais Discos Que Amigos um pouquinho do que vem por aí em uma entrevista exclusiva por telefone. Confira abaixo do serviço e, logo depois, a entrevista:

Balaclava Fest
Data: 24/04/2019
Horário: 16h (abertura da casa)
Local: Audio – Av. Francisco Matarazzo, 694 – Barra Funda – São Paulo/SP
Ingressos: a partir de R$ 150 (Ticket 360)
Abertura da casa: 16h00
Classificação: 16 anos

TMDQA!: Oi Laetitia, obrigada por seu tempo! Que bom que você virá ao Brasil, quero falar sobre isso! Mas antes, queria falar mais sobre seu trabalho. Você é uma das artistas que a gente conheceu graças ao Bandcamp — e também, claro, graças às músicas que você produz! Mas já faz uns 5 anos que você lançou a demo, e muito mudou desde então. Ao olhar pra trás e tendo agora uma perspectiva mais ampla da música enquanto mercado e indústria, como você enxerga as oportunidades e os desafios que os artistas independentes têm hoje? Está ficando mais possível ter uma carreira e viver de música? O mercado está mesmo se abrindo pra vozes diferentes?

Vagabon: Nossa, com certeza! Nem acho que eu estaria onde estou hoje se não fosse pela internet. A indústria da música e as grandes gravadoras estão prestando atenção em jovens artistas e os levando a sério. Nós não dependemos mais de assinar um contrato – nós mesmos nos organizamos com as nossas comunidades virtuais de fãs e outros artistas e fazemos a nossa voz ser ouvida. Houve uma época em que só as pessoas poderosas determinavam quem seria ouvido ou visto, mas já está claro que isso mudou. Eu sou cria da internet, da filosofia punk, e hoje é possível ter uma carreira e se manter vivendo de música graças a isso. É um momento empolgante, em que há uma mudança na indústria. As tecnologias ainda são bem recentes, hoje nós temos tantas formas de compartilhar música, de criarmos algo viral… Os “protetores dos portões” da indústria já perceberam que eles têm cada vez menos controle sobre quem é visto. Se você mora numa cidade pequena no interior dos Estados Unidos, você pode criar o seu próprio mundo, usar a internet pra fazer novas amizades por meio da música, organizar turnês e tudo mais. Eu sou muito feliz por ser uma artista dessa geração que teve a possibilidade de fazer uma demo por conta própria e ganhar notoriedade com isso, me manter vivendo disso. É realmente empolgante.

TMDQA!: Você teve bastante calma antes de lançar Infinite Worlds — lançou uma demo, depois o EP e só depois o disco. Você acha que isso te deu oportunidade de crescer, amadurecer e se sentir mais confortável à medida que as expectativas aumentavam sobre o seu trabalho?

Vagabon: Sim. Nem foi muito estratégico. Eu estava na mentalidade de que esse era meu primeiro disco, eram as primeiras músicas que eu compunha na vida, e eu as fui lançando na medida que terminava de escrever. Aos poucos elas começaram a chamar atenção e isso me possibilitou fazer muitos shows antes mesmo de lançar o disco. Então havia muitas pessoas que já eram parte da minha jornada, que queria me acompanhar nessas aventuras, então eu fui crescendo aos poucos junto disso.

TMDQA!: Falando de vozes diferentes, acho que uma das primeiras coisas que as pessoas notam é que você é de Camarões, e claro que isso faz parte de quem você é e imagino que seja motivo de orgulho. Mas também é uma armadilha, porque isso mantém nós, que escrevemos sobre música, presos na narrativa de sempre, e é claro que você é mais que a “menina de Camarões”. Tem alguma coisa sobre você ou seu trabalho que você gostaria que as pessoas notassem, se elas não estivessem tão ocupadas falando da sua aparência, por exemplo?

Vagabon: Sim… Nossa, essa é uma ótima pergunta. Te agradeço por ter feito, não tem muita gente que reconhece que isso acontece. Quando eu decidi lançar minhas músicas e compartilhar um pouco sobre mim, eu não sabia que isso viraria uma trívia a meu respeito na imprensa. Com esse próximo disco, o que eu espero fazer é me solidificar como uma multi instrumentista autodidata, que experimenta e faz coisas diferentes. Eu gosto de compartilhar com as pessoas. E a sensação de ser uma mulher africana que veio da cena rock e punk… Bem, isso faz com que eu seja uma anomalia no aspecto geral das coisas, porque as pessoas que ocupam esses espaços onde me inseri não eram como eu. Eu vejo que essa foi uma apresentação minha ao mundo, mas eu sou mais que isso. Sou cientista, sou engenheira… Como era meu primeiro disco, acho que as pessoas foram na direção do que era mais fácil comentar. Mas espero que com meu próximo álbum, a gente consiga falar de outros aspectos do meu trabalho também.

TMDQA!: Eu entrevistei a Nilüfer Yanya semana passada e a gente estava falando de como as mulheres com suas guitarras estão voltando a fazer parte do mainstream. Elas não necessariamente sumiram, mas talvez a gente não estivesse prestando tanta atenção. Agora tem uma geração nova de mulheres guitarristas e você faz parte disso. Você tinha alguma favorita quando estava crescendo e aprendendo a tocar guitarra no seu quarto? E quem são as mulheres fodonas que você ouve hoje? Quer dizer, tem a Courtney Barnett, que eu sei que você fez turnê com ela…

Vagabon: Isso que eu ia dizer (risos)! Ela é foda, é muito incrível vê-la tão empolgada pelas músicas, por conhecê-las a fundo. Eu me sinto muito tocada por todas essas mulheres e quero apoiá-las. A Courtney Barnett toca muito, e eu citaria também a Victoria Ruiz, do Downtown Boys. Ela não necessariamente toca guitarra, mas ela representa um grupo de mulheres que me inspirou muito quando estava começando aqui em Nova York. Infelizmente, os shows punk que eu frequentava não tinham muitas mulheres tocando, mas eu gosto de outros gêneros também, tipo folk. E a Julie Byrne é uma musicista incrível, ela tem um estilo de guitarra e uma obra que é tão bem pensada e construída que acho lindo. Nossa, são muitas… Tem a Frances Quinlan, do Hop Along. E como eu disse, a Victoria Ruiz, que me fazia sentir vista nesses lugares, sabe? Mas o simples fato de que eu não consigo citar todas as mulheres incríveis mostra o quanto a gente já avançou. São muitas para nomear (risos).

TMDQA!: Eu vi no seu Facebook que você já está preparando o segundo disco e eu vi um pedacinho de “Full moon on Gemini” que você postou no Twitter. Como está indo esse processo? Tem algo que você pode nos adiantar sobre o que está trabalhando?

Vagabon: Ah, sim! Meu próximo disco vai sair no final do ano. Estou muito empolgada, foi algo triunfante pra mim. Eu estava bem insegura em produzir meu próprio disco, sozinha, entrar na minha imaginação é algo bem desafiador. O motivo de eu ter demorado tanto pra lançar outro disco é que era muito importante pra mim que ele saísse do meu cérebro, sabe? Não queria ser influenciada por outros. Não que um dia eu não vá procurar um produtor ou algo do tipo, mas sendo esse meu segundo disco e eu muito nova em fazer música, eu achava necessário explorar todas as partes do meu cérebro, que fosse algo totalmente meu.

TMQA!: Agora, só pra provar que dá sim pra entrevistar alguém stalkeando as redes sociais (risos), eu também vi no seu Twitter que você chora a cada sessão de gravação, mas não chorou na última. Por que isso?

Vagabon: (Risos) Verdade! Eu só acho muito emocionante gravar minhas músicas. Eu coloco muito de mim nas canções, e não ter um produtor é meio que como não ter um amortecedor, sabe? Eu tinha que tocar, arranjar tudo… Não há uma separação entre a composição das músicas e a gravação, é tudo feito por mim. A resposta curta pra isso é que eu estou tentando construir meu catálogo ao mesmo tempo que exploro meu eu interior. E passar por um processo tão pessoal assim dificulta muito que eu não seja bem dura comigo mesma, para que eu seja o melhor que puder ser. No fim das contas, parece uma maratona, sabe? É tipo cruzar a linha de chegada. E eu fiquei feliz porque pensei comigo mesma, “há quatro meses nesse estúdio eu não conseguia nem ver a linha de chegada, e agora cá estou eu”. Mas é isso, não posso entregar muito antes da hora.

TMDQA!: Olha, do jeito que você fala, parece bem cansativo mesmo.

Vagabon: (Risos) Sim, cansativo e compensador ao mesmo tempo!

TMDQA!: Agora, só pra terminar, você vai tocar aqui em São Paulo e acho que é a primeira vez.

Vagabon: Isso, vai ser minha primeira vez aí!

TMDQA!: Queria saber se você vai ter um tempinho pra explorar a cidade, se tem curiosidade pela comida, pela música e tudo mais. Ah, e claro, o que você tem planejado em termos de repertório. Vai dar pra ouvir alguma das músicas novas?

Vagabon: Sim, eu vou sim tocar algumas músicas novas. Eu fico muito empolgada toda vez que viajo pra algum lugar lindo, como o Brasil. Eu tento me dar uns dois dias para conhecer os lugares, ir a museus, parques, conhecer as pessoas mesmo. Estou bastante curiosa e me sinto muito abençoada de estar aí com vocês!

TMDQA!: Bem, eu espero que você se divirta bastante aqui no Brasil!

Vagabon: Obrigada!

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