Noel Gallagher em São Paulo
Foto: Carlos Bastos/Universal Music

Nosso contato com Noel Gallagher foi feito em duas partes. Primeiro, na quinta-feira, 19 de Outubro, tivemos a oportunidade de ouvir metade do disco novo do cara, Who Built the Moon?, que sai no dia 24 de Novembro. E eis que de repente, não mais que de repente, Noel entra na sala para uma coletiva surpresa com os jornalistas presentes em um estúdio em São Paulo.

A conversa foi mediada por Zeca Camargo, durou cerca de 30 minutos e, claro, a abordagem principal foi o novo disco cuja metade tínhamos acabado de ouvir.

Perguntamos ao Noel se ele estava esperando alguma reação negativa por parte dos fãs com a direção que este novo disco tomou e se ele já havia considerado levar o Oasis pelo mesmo caminho em algum momento. A resposta veio, e com direito a uma indireta ao seu irmão Liam Gallagher.

Sim, estou esperando reações negativas, principalmente de pessoas que usam parkas. Quanto à segunda parte da pergunta… Todos os indivíduos no Oasis, exceto um, têm um gosto musical variado, mas no coletivo, como uma banda, éramos bastante retos com o que queríamos. E acho que esse é um dos principais motivos de não estarmos mais juntos, porque não acho que os integrantes estivessem se expressando. Mas é engraçado, porque todos nós ouvimos todo o tipo de música, mas quando estamos juntos como um grupo, a gente faz o rock de estádio. Então por exemplo, se eu levasse até o estúdio uma música como ‘The Death of You and Me’, nem fodendo eles ficariam interessados, mas era assim que era. Acho que você precisa se liberar de uma situação que você esteve na maior parte de sua vida musical e seguir coisas de uma forma diferente, tocar guitarras diferentes… É como eu digo, se você comer a mesma coisa no café da manhã todos os dias, você fica de saco cheio, precisa variar de vez em quando.

Em outro ponto da entrevista o questionamos sobre o fato de que ele sempre fechou seu shows com “Don’t Look Back in Anger“, mas nesta turnê com o U2 ele escolheu “AKA… What a Life” para os encerramentos. Há um motivo pra isso?

Vou te falar qual é o motivo. O pessoal da minha banda perguntou por que eu continuava fechando os shows com ‘Don’t Look Back in Anger’ porque ela é pesada demais, virou uma música pesada demais. A música é ótima, um clássico, posso tocá-la de algumas maneiras; acústica, elétrica… agora estou tocando uma versão acústica. E acho que ‘AKA… What a Life’ tem uma alegria e as pessoas precisam lembrar que ainda têm uma vida para viver, você ainda tem que passar pelo amanhã, viver os próximos anos. Não há motivo para olhar para trás.

Pois bem. A segunda parte ficou por conta da entrevista exclusiva que fizemos com o cara no domingo, 22 de Outubro em um hotel na região do Morumbi, não muito longe do estádio onde ele tocaria poucas horas depois. Seria o terceiro da série de quatro shows que o U2 fez em São Paulo na turnê de comemoração aos 30 anos do disco The Joshua Tree, com Noel sendo a atração de abertura.

Confira na íntegra o nosso papo com ele, que estava falante, bem humorado e solícito com variados assuntos abordados, incluindo quais discos ele considera os seus melhores amigos!

TMDQA!: Desde 2011 você lança seus discos sob a alcunha de Noel Gallagher’s High Flying Birds. Como você imaginava que seria o seu trabalho pós-Oasis? A decisão de usar o High Flying Birds é relacionada a não colocar o seu nome como o foco principal do projeto?

Noel Gallagher: (breve silêncio). Acho que eu penso que lancei três discos. Gosto de como tudo está se saindo e não acho que deveria voltar atrás. Tenho que fazer um disco de cada vez e então cada disco tem me dado mais confiança para fazer o próximo. Então onde estou agora, hoje em dia, o futuro me mostra ser bom pra cacete. Estou curtindo muito. Curto a liberdade de poder fazer o que eu quiser. Isso é o principal.

TMDQA!: Você poderia nos explicar o motivo por trás do nome do disco, Who Built the Moon??

Noel Gallagher: É o título de um livro – que eu nunca li – mas eu gosto do nome. O livro é sobre a hipótese de que a lua é um objeto que foi colocado ali por alguém. A pessoa que escreveu esse livro certamente assistiu a Star Wars, talvez várias vezes, e ficou tipo, “É, aquela estrela! Ela é parecida com a lua!”. Achei o título ótimo.

TMDQA!: Você acha que este álbum é o que mais te representa no sentido de terem todas as influências que você teve durante sua carreira?

Noel: Sim. Esse é o que me representa melhor. Na verdade, sabe por que eles chamam discos de “registros” [‘records’]? Porque é um registro de onde você estava na época que você o lançou. Então esse é a declaração absoluta e definitiva de onde estou no momento e eu concordo! Toda a música que já ouvi na vida apareceu nesse disco.

TMDQA!: Falando novamente sobre o novo disco. Você mencionou que ele foi gravado na Irlanda e você foi até lá para trabalhar com o David Holmes, que também é DJ e um nome conhecido na cena da música eletrônica, que já fez remixes para o U2, Primal Scream e até Ice Cube. Como vocês se conheceram e começaram a colaborar? Você acha que alguém como ele, que tem bastante familiaridade com a música eletrônica, te ajudou a expandir a sonoridade do álbum?

Noel: Eu o conheci através do Primal Scream e decidi trabalhar com ele porque eu tinha acabado de começar a fazer o Chasing Yesterday (2015), meu último álbum, e queria que ele estivesse envolvido naquele projeto e ele disse que não queria se envolver nesse porque prefere estar por perto desde o começo.

A influência dele neste disco é maior do que a de qualquer outra pessoa. Tive um grande conhecimento de música eletrônica, e ele tem mais ainda por ser um DJ. A influência dele está no estilo e a minha está nas músicas. A influência dele foi de ter a certeza de que nada que eu escrevesse fosse ter a mínima relação com o Oasis ou qualquer coisa que eu tenha feito antes. Ele encontrava os detalhes do que eu fazia, focando nas coisas menores que viraram algo grande.

TMDQA!: Desde o seu primeiro lançamento solo, é possível notar uma influência cósmica na parte visual e até em algumas músicas – principalmente as novas. Isso é uma escolha sua?

Noel: Os visuais. É, quer dizer, o cara que fez a capa do disco não é nem um artista profissional, ele é o meu carteiro! (risos). Ele ouviu o disco e disse, “é isso que eu penso”. E me mostrou; essa não foi a primeira ideia que tivemos. Ele disse, “a ideia é tudo parecer bem psicodélico.” E eu adorei.

Sabe, se um cara te apresenta várias ideias e até ideias musicais e elas são psicodélicas, bem, elas não são boas! Eu não usaria só porque são psicodélicas, tipo, foda-se. Tem de ser bom.

Então não existe sentido em fazer um disco cósmico, não vejo dessa forma. Eu o vejo como um disco pop. E não faria sentido gravar um disco só por gravar. As músicas têm de ser boas porque você sobe no palco e as toca para as pessoas. E isso que foi ótimo de trabalhar com o David. Ele nunca tocou ao vivo, e estou pouco me fodendo pra isso, ele tinha as ideias malucas e eu ficava tipo, “Ei, ei, ei, calma”, sabe? Deixe eu primeiro absorver o que você está dizendo e tentar fazer com que tudo faça sentido. E então chegamos a um lugar onde ambos ficamos felizes.

TMDQA!: O Be Here Now foi relançado no ano passado com duas músicas novas nele, “If We Shadows” e “Untitled”. O que você acha dessas duas faixas? Por que elas não foram lançadas em 1997?

Noel: Ah… Não sei?! “If We Shadows“… Não sei, talvez eu não tenha finalizado ela. Algumas músicas ficam de lado porque… Não sei qual é, ou foi na época, o motivo específico, mas deve ter tido algum.

Sabe, as músicas nesse projeto, o material finalizado, o David Holmes ama pra cacete e ele fica tipo, “Por que você não lança?” e eu respondo “Ah, não sei, tem alguma coisinha nela que eu não gosto”. Pode ser algo geral ou específico.

Deve ter tido um motivo, mas não lembro qual.

Noel Gallagher

TMDQA!: Você disse em entrevistas que esta turnê com o U2 tem sido como férias para você. Como tudo começou e como é um dia típico com eles? Aparentemente cada dia é diferente do outro, já que eles estavam andando pelas ruas de São Paulo ontem e até gravaram vídeos.

Noel: Eu conheço o Bono há bastante tempo. Estávamos no sul da França, curtindo, e ele disse, “Você sabe que vou fazer esse lance com o The Joshua Tree no ano que vem” e eu fiquei tipo, “Nossa, legal pra caralho!” (faz movimento de comemoração com os braços) e me perguntou o que eu faria no próximo ano e eu disse que estaria no estúdio. Ele falou que se meu disco estivesse pronto a tempo, eu iria com eles para fazer alguns shows. E eu aceitei.

De início seriam apenas alguns poucos shows pela Europa, mas então virou algo “Vocês querem ir para a América do Sul?” e eu fiquei tipo, “claro que sim!” e foi tudo muito casual.

Se meu disco tivesse saído eu não acho que estaria aqui. Acho que o melhor lugar para mim, se meu disco tivesse sido lançado, seria não estar em turnê com o U2. Mas eu gostei, porque eu não tinha disco saindo, nada para promover, só pelo prazer de tocar.

E a segunda parte é que não existe um dia típico com eles. Tudo muda, a cada cinco minutos. Amanhã estaremos indo para o Rio para um casamento. E depois voltamos e tudo muda e é isso, algo pode acontecer hoje à noite. É um caos.

TMDQA!: Se você tivesse de escrever um release sobre seu próprio disco, como você o descreveria em uma frase para chamar a atenção das pessoas?

Noel: Pop cósmico.

TMDQA!: O Who Built the Moon? tem nomes como Paul Weller e Johnny Marr. Você já trabalhou com o Johnny antes, mas não com o Paul no High Flying Birds. Ele é um ótimo músico que possui influências que vão do punk ao new wave. Como é trabalhar com alguém como ele nesse importante estágio de sua carreira solo?

Noel: Conheço o Paul há uns 20 anos, trabalhei em muito do material dele. Sabe, ele tocou em “Champagne Supernova“. É ótimo, ele é um amigo, e é muito engraçado. Sonhei com ele na noite passada!

TMDQA!: Sério?

Noel: Sonhei que ele usava um tapa olhos igual um pirata! Doido, né?

TMDQA!: Sim!

Noel: E o Johnny eu conheço desde antes dele ficar famoso. Ele tocou na “Ballad of the Mighty I” e tal. Eles são meus amigos, eu ligo para eles pra ter uma ajuda. Por sorte, para mim, eles dizem “claro, com certeza”.

TMDQA!: Desde o início do High Flying Birds você tem retrabalhado algumas músicas do Oasis, como “Revolution Song”. Você tem a intenção de fazer isso com outros b-sides, como “Shout it Out Loud” e “Full On”?

Noel: Não, não tem mais nenhuma. No primeiro disco teve…

Stop the Clocks“?!

Stop the Clocks” não era uma música do Oasis, era uma demo. As únicas músicas realmente do Oasis… É, talvez “Stop the Clocks” fosse lançada em algum disco do Oasis. “I Wanna Live in a Dream (In My Record Machine)“, “Lock All the Doors“, “Revolution Song” e é isso.

TMDQA!: Você fará o seu último show aqui no Brasil com o U2 na quarta-feira. Como tem sido os últimos dias em relação aos compromissos com a imprensa e o tempo livre? Você teve tempo de conhecer alguns lugares de São Paulo e aprender algumas palavras em Português?

Noel: Sim, estivemos em um lugar ótimo. Não ontem, mas na outra noite. Um restaurante chamado Maní.

TMDQA!: Não conheço.

Noel: Ah, é inacreditável!

TMDQA!: Posso imaginar.

Noel: E na noite anterior fomos a um outro lugar porque a esposa do Adam (Clayton, baixista do U2) é brasileira e nos mostrou uns lugares.

TMDQA!: Você postou aquela foto do Ringo Starr com o Pelé em uma parede.

Noel: Sério?

TMDQA!: Sim!

Noel: Não lembro! (risos). Vi mais coisas de São Paulo nessa viagem do que em qualquer outra. Devo dizer que ela é bem estilosa. Tem muita coisa legal de se ver e muito trânsito também. É fantástico, um lugar ótimo.

TMDQA!: Como você escolhe as músicas do Oasis no setlist?

Noel: Para tocar?

TMDQA!: Sim. Você prefere tocar só os hits ao invés de…

Noel: O material mais obscuro.

TMDQA!: É.

Noel: (longa pausa) É, não sei. Digo, é fácil com “Don’t Look Back in Anger” e “Wonderwall“. Quando eu entrar em turnê novamente…

TMDQA!: Acho que “Falling Down” seria uma ótima escolha.

Noel: Provavelmente vou tentar “Falling Down” e “The Importance of Being Idle” novamente. Talvez algum material menos desconhecido.

TMDQA!: “Flashbax”.

Noel: “Flaxhbax” provavelmente não! (risos). Depende. Depende de como você se sente a respeito da música. Se é uma música que é o Liam quem canta, como quando começamos a tocar “Champagne Supernova”. Eu só comecei a tocar um dia no ensaio e o resto da banda me acompanhou e eu fiquei tipo, “essa música é muito boa”. E daí você tem essa coisa de “vamos tentar para ver o que o público acha” e o público enlouqueceu, então mantivemos no setlist.

Mas é, só depende de como você se sente. Não existe uma regra. Por sorte, todas as músicas que escrevi são bastante famosas, então isso já é um começo.

TMDQA!: Nosso site chama Tenho Mais Discos que Amigos, que levado para o Inglês fica “I Have More Records Than Friends”.

Noel: (Risos)

TMDQA!: Acreditamos que os discos são nossos amigos e estarão lá nos melhores e piores momentos de nossas vidas. Você tem mais discos que amigos?

Noel: Sim. Qualquer pessoa que tiver mais amigos do que discos é… nossa, imagina.

TMDQA!: Quais álbuns marcantes você consideraria como seus melhores amigos?

Noel: (longa pausa)

TMDQA!: É difícil escolher um só.

Noel: É. (longa pausa). É difícil escolher um só.

TMDQA!: Podem ser dois ou três.

Noel: Discos que eu conheço todas as letras?

TMDQA!: Isso.

Noel: The Wall do Pink Floyd. The Queen is Dead do The Smiths. Nevermind the Bollocks do The Sex Pistols. O primeiro disco do The Stone Roses. Changes do David Bowie, esse é tipo o melhor do Bowie. É, acho que é isso.

TMDQA!: Ótimas escolhas!

Noel: Obrigado.

OUÇA AGORA MESMO A PLAYLIST TMDQA! ALTERNATIVO

Clássicos, lançamentos, Indie, Punk, Metal e muito mais: ouça agora mesmo a Playlist TMDQA! Alternativo e siga o TMDQA! no Spotify!