The 1975
Foto: Divulgação

Por Nathália Pandeló Corrêa

O The 1975 está dificultando a vida de jornalistas ao redor do mundo. Eles achavam que tinham fechado suas listas de melhores álbuns do ano — inclusive nós aqui do Tenho Mais Discos Que Amigos! –, mas em pleno 30 de novembro, chega A Brief Inquiry into Online Relationships, terceiro trabalho de estúdio do quarteto de Manchester, para desafiar o que considerávamos de melhor na música pop esse ano.

Matthew Healy sabe que o nível de expectativas é alto. O álbum anterior, I Like It When You Sleep, for You Are So Beautiful yet So Unaware of It, de 2016, estabeleceu o cantor e compositor como uma das mais promissoras novas vozes por aí. Suas letras sinceras entregam a vulnerabilidade de uma geração inteira, colocando o dedo nas feridas — sejam elas vícios, amores, obsessões.

Em A Brief Inquiry into Online Relationships, o The 1975 dá um passo adiante. Se recusa a ficar na caixinha limitada do pop, explora do jazz à eletrônica e potencializa seus pontos fortes, entre eles, as letras. Temáticas tão atuais quanto a crise de refugiados e o governo Trump dividem espaço com relatos pessoais — é o caso de “It’s not living (if it’s not with you)”, uma referência ao uso de heroína do próprio Healy.

Talvez o maior acerto do The 1975 não seja acertar sempre e sim errar nessa tentativa. Num momento em que o pop passa por uma redescoberta da sua própria identidade, quem traz algo novo e diferente sai na dianteira. Jogar o mesmo jogo de sempre não parece ser uma opção. E Matthew Healy talvez seja uma das vozes mais dissonantes em um cenário que pede pra ser reinventado.

Não que A Brief Inquiry into Online Relationships esteja tentando ser um disco “conceitual” ou simplesmente mudar os rumos da música. O The 1975 apenas escreve sobre o mundo à sua volta — e bastante, por sinal. No ano que vem, sai a segunda parte da nova era da banda, batizada de “Music for Cars”, com o disco Notes on a Conditional Form.

Eles certamente têm muito a dizer, e o Tenho Mais Discos Que Amigos! conversou com o artista por telefone sobre o novo disco, o retorno ao Brasil no Lollapalooza 2019 e mais. Confira abaixo:

TMDQA!: Oi Matthew, obrigada por seu tempo. Queria falar sobre o novo disco, claro. Estava reouvindo agorinha e sinto que vocês estavam trilhando uma linha tênue — ousar e tentar algo novo, mas ao mesmo tempo, não apagar totalmente o que deu certo em I like it when you sleep. Estou no caminho certo? Era algo que vocês pensaram especificamente pra esse projeto?

Matthew Healy: O modo como o disco foi feito… Bem, não houve uma intenção, sabe? Eu diria que esse desejo de ser ousado vem mais da vontade de não ficar entediado. Meu relacionamento com a música é algo incrível, porque eu não vejo qualquer limitação. Acho a música pop muito libertadora, e todas as vezes que tive a oportunidade de fazer as coisas do modo como quis, isso me levou adiante, sabe? A ter mais sucesso, ou algo do tipo. Então eu sinto que meu relacionamento com o meu trabalho é assim, quanto mais eu faço, mas eu vou aperfeiçoando, melhorando. E como eu não ouço só um tipo de música, eu não faço um tipo de música apenas. Então é bem isso, não há necessariamente uma intenção explícita.

TMDQA!: Você acha que esse novo capítulo é o momento mais pessoal e aberto que vocês já tiveram como banda? Digo porque cada música é bem diferente das demais e dá a sensação de encontrar bastante da personalidade de vocês nelas.

Matthew: Sim… Quer dizer, acho que… Como explicar isso? Acho que gravar um disco é mais ou menos assim: cada vez que você faz, ele se torna algo a mais, ele se torna cada vez mais você. É uma espécie de exagero das suas características, porque elas são amplificadas. O que é bom em você fica mais evidente, o que é ruim também. A sua sinceridade fica mais potente, sabe? Então talvez seja isso, as nossas personalidades transparecendo mais a cada novo disco.

TMDQA!: Acho que faz sentido, até porque vocês produziram o disco também. Acho que foi a primeira vez que você e George produziram, e basicamente foi a primeira vez também sem o Mike Crossey como produtor, certo? A sensação foi de liberdade pra explorar e experimentar… Ou foi apenas assustador (risos)?

Matthew: Eu diria que nenhum dos dois (risos). Na verdade, o motivo da gente sempre ter gravado com o Mike é que nós produzimos uma série de EPs, certo? E gravamos no meu quarto. Mas aí quando você vai gravar um disco, você procura um produtor, e o convence a trabalhar com você. E Mike foi nosso primeiro produtor. E quisemos trabalhar sempre juntos, porque ele fazia o nosso som maior, melhor. As músicas vinham de nós, mas ele nos ajudava a chegar no resultado final. Só que as coisas mudaram muito desde que a gente começou a banda. Nos últimos 11, 12 anos, virou um novo mundo. Então não é como se não precisássemos do Mike, mas o disco todo foi feito pela gente numa casa, então só sentimos que era algo que precisávamos fazer sozinhos, e que não havia espaço para outras pessoas nesse momento.

TMDQA!: De início, parecia que o disco ia se chamar “Music for Cars”, e depois ficou claro que esse é o título dessa nova “era” que vocês estão começando, e que inclui ainda outro disco pra 2019. Isso me chama atenção porque a gente tá num momento que o single reina absoluto e você me diz que vamos ter umas 25, 30 músicas novas do The 1975 num período de 7 meses. Não que eu vá reclamar, mas… por que? Não seria mais fácil jogar o jogo como todo mundo?

Matthew: Nossa, eu acho que poderia falar 25 minutos sobre esse assunto (risos)! Mas resumidamente, eu acho que há uma concepção errônea de que os discos não são tão populares quanto os singles hoje em dia. Claro que o streaming é o meio mais fácil de ouvir música hoje e o single se encaixa perfeitamente nisso. Mas isso não tem a ver com o nosso processo criativo. E não é como se a era dos grandes discos tivesse acabado, inclusive quando eles saem, as pessoas ouvem. É impossível pensar que as pessoas não vão dar play num álbum inteiro do Kendrick Lamar, como o DAMN., entende? E isso está presente em tudo que a gente consome hoje. As pessoas assinam Netflix não porque querem ser entretidas por meia hora, um episódio. Eles querem séries longas, às quais vão dedicar cinco anos assistindo (risos). E eu faço parte desse mercado, consumo música com a mesma rapidez que qualquer fã. Mas pra mim não faria sentido fazer dois anos de turnê se não tivéssemos algo completo pra mostrar.

TMDQA!: Acho que está dando certo. A Time já falou que é um dos discos do ano, a NME falou que vocês fizeram “a resposta millennial para o ‘OK Computer’”. Acho que a ligação mais óbvia entre os dois é que ambos são produtos de seus tempos, só que com 20 anos de diferença. Aqui vocês lidam com o nosso relacionamento com máquinas e tecnologia, com o caos político, com obsessões e amores… Então queria saber, após essa ‘brief inquiry’, o que vocês descobriram?

Matthew: Na verdade, eu não descobri nada (risos). Eu sinto que não fiz um disco opinativo, e sim joguei várias perguntas no ar. Essas temáticas são bastante abrangentes e eu não fiquei apontando dedos com o que está de errado com a sociedade. Acho que as pessoas não vão se sentir julgadas ao ouvir uma música como “Love it if we made it”. É difícil escrever um disco refletindo essa realidade e não soar como “uma obra sobre os tempos modernos”, mas trata-se apenas de um disco gravado refletindo a nossa vida, como pessoas jovens num mundo que tem tudo isso. E eu realmente vivi as coisas sobre as quais escrevo, então tudo que posso fazer é escrever do meu ponto de vista.

TMDQA!: A gente se falou mais de um ano atrás, quando vocês vieram pro Lollapalooza Brasil. E eu te perguntei o que você vinha ouvindo e você me disse John Coltrane e Carole King. E quando se pensa em “Be my mistake” ou “I always wanna die (sometimes)” ou as que flertam com o jazz, como “Sincerity is scary” e “Mine”, faz total sentido. Então queria saber se você pode me dar umas pistas sobre o caminho que vocês vão seguir com “Notes on a conditional form”, tipo os discos que vocês ouviam enquanto trabalhavam nas composições.

Matthew: Eu diria algo meio Yo La Tengo, mas também tem um pouco de Burial, um produtor daqui do Reino Unido. Ouvimos bastante garage, voltando um pouco ao tipo de coisas que escutávamos lá no início. E também algumas bandas tipo Joan of Arc, American Football, coisas assim. É o que consigo lembrar no momento.

TMDQA!: E só pra terminar: vocês vão voltar ao Lollapalooza Brasil ano que vem, então já será com a turnê nova. O que podemos esperar?

Matthew: Acho que o show tem muito a ver com aquilo que estava falando do disco antes, de que não é algo intencional, é só um retrato do meu mundo. Então eu quero que o show seja algo familiar pras pessoas, mas ao mesmo tempo, um exagero. É um show do The 1975, elevado à 50ª potência.

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