Sugar Kane 08
Foto: Vitor Malheiros

O disco Continuidade da Máquina, lançado pelo Sugar Kane em 2003, é indiscutivelmente um clássico do hardcore nacional. Com algumas das faixas mais marcantes da carreira da banda, ele consolidou de vez o grupo dentro da cena.

Em 2013, aconteceu no Hangar 110 o show comemorativo de dez anos desse trabalho. Na última sexta-feira (9), foi a vez da banda se reunir novamente, agora para celebrar os 15 anos — no mesmo local, que agora passou a se chamar The House. Mudou o nome, mas continua (quase) tudo igual. Foi mais uma noite histórica do grupo em um dos locais mais simbólicos da cena underground.

Foto: Vitor Malheiros

Antes, a banda Dínamo, de Curitiba, entrou em cena para aquecer o público, que aos poucos ia chegando ao The House. Deléo (vocal), Karacol (guitarra), Dudu (baixo) e Biano (bateria) fizeram uma apresentação consistente e bem hardcore, com músicas que retratam temas bem atuais.

O grupo lançou recentemente o disco Origens e tem mostrado um lado mais maduro, que se refletiu no palco. Com mensagens políticas, participações especiais e convocando a plateia para cantar junto, o Dínamo foi um ótimo aquecimento e teve uma boa receptividade da galera.

Foto: Vitor Malheiros

Não muito tempo depois, foi a vez de Caique Fermentão (vocal e guitarra), Felipe Dantas (guitarra), Murilo Benites (baixo) e Antonio Fermentão (bateria) darem início ao show do Corona Kings. Em noite de bandas paranaenses, o grupo de Maringá mostrou o porquê de ser um dos nomes de destaque da cena atual e fez uma apresentação intensa, com rapidez e riffs muito bem trabalhados.

No setlist, faixas do seu disco mais recente, Death Rides a Crazy Horse, que saiu há um ano, incluindo “Boyhood” e “Death Proof”. Assim como em 2017, abrindo para o show de 20 anos do Sugar Kane, o Corona Kings ganhou o público logo de cara. A banda tem muita força ao vivo, e a pegada stoner funciona perfeitamente com o clima experimental no palco.

Em meio a mensagens de respeito e resistência, além de crítica aos eleitores do Bolsonaro, a banda conduziu os presentes com maestria. Ainda que o clima na pista fosse tranquilo, todos estavam muito conectados ao som. Com uma performance de respeito e um público bastante satisfeito, o Corona Kings saiu de cena para dar lugar à atração principal da noite.

Foto: Vitor Malheiros

Quando o Sugar Kane subiu ao palco, a pista se transformou. Em questão de segundos, um ambiente que estava calmo e espaçoso deu lugar a um caos coletivo que duraria todo o resto da noite. E que noite!

Além de tocar o disco Continuidade da Máquina na íntegra, o show contou com uma formação especial: Alexandre Capilé (vocal e guitarra), Vini Zampieri (guitarra), Flávio Guarnieri (baixo) e André Dea (bateria). Esse era o Sugar Kane em 2009 — ano em que Flávio entrou para a banda e Vini saiu, poucos meses depois. Flávio ficou até 2013, e acredito que a maioria ali nunca tinha tido a oportunidade de ver na íntegra uma apresentação desse quarteto, que gravou o disco A Máquina Que Sonha Colorido.

Seguindo a ordem do Continuidade da Máquina, “Janeiro”, “Estou Cansado” e “Por Vir” abriram o set. Início catártico, com os fãs cantando aos berros e se acabando no mosh. O repertório foi dividido em blocos de três faixas, intercalando trios do disco comemorativo da noite com trios de outras fases da banda.

Assim, o show seguiu com “Vital” e “Fui Eu”, músicas do último trabalho lançado pelo Sugar Kane — Ignorância Pluralística (2014) — e “Será Viver”, única faixa do disco Elementar (2005) a ser tocada. É incrível o fato de tanto as canções mais antigas quanto as mais recentes terem o mesmo efeito no público, soando com a mesma força e sendo muito atemporais.

Foto: Vitor Malheiros

Voltando ao Continuidade, Capilé anunciou “uma das primeiras músicas do disco a ser ensaiada”, de quando o Renê Bernuncia assumiu a bateria do Sugar Kane e criou o groove inicial clássico de “Velocidade”. Essa música é daquelas unanimidades entre os fãs e sempre resulta em um dos pontos alto das apresentações ao vivo.

O set seguiu com “Abraço” e “Correr ou Lutar”, que foi cantada pelo Vini porque Capilé não lembrava da letra. E, então, o vocalista falou sobre a formação alternativa que estava ali, já que Rick (guitarra) toca com o Dead Fish e Moderno (baixo) também precisou estar com a banda capixaba naquela noite.

Integrantes de 2009, músicas de 2009: “A Máquina Que Sonha Colorido”, “Todos Nós Vamos Morrer” e “Revolução”. Capilé costuma brincar que sempre erra a letra de “Revolução”, e eu realmente acho que em todos esse anos eu nunca o vi acertar. Nesse show, não poderia ser diferente — assim como o coro e participação do público, intensos como se tivesse sido ensaiado. E esse foi o tom de toda a apresentação. Em meio a um hiato meio indefinido, as oportunidades de ver o Sugar Kane ao vivo são raras, e cada vez mais especiais.

E se o Sugar Kane sempre teve um posicionamento político firme, em tempos tão sombrios o discurso se torna ainda mais acentuado. “A gente é muito maior que essa porra. A gente não tá sozinho. A gente é foda!”, disse o vocalista ao falar sobre o momento de ser resistência. Isso foi a deixa para “A Máquina”, que gerou mais pancadaria na roda e muitos stage dives (ainda que muitas pessoas acabassem mesmo caindo direto no chão), seguida de “Minha Liberdade”.

Foto: Vitor Malheiros

Depois, outro momento especial veio com “Meus Amigos”, que estava sendo tocada ao vivo pela segunda vez na carreira do Sugar Kane — a primeira havia sido recentemente, no show comemorativo em Curitiba. Essa foi a única faixa que ficou de fora do show de 10 anos do Continuidade, e foi uma grata surpresa ela ter sido incluída dessa vez. Ainda por questões de não lembrar a letra, Capilé pediu que Vini a cantasse, mas quem assumiu o microfone pouco depois foi uma fã, que subiu ao palco e mandou muito bem!

O vocalista agradeceu muito ao público pela presença e pelo suporte à banda: “não tem nada que faça a gente estar aqui, a não ser vocês”. Em seguida, relembrando as músicas do Por Nossa Paz (2001), a banda mandou “Medo”, uma das faixas mais icônicas do Sugar Kane, além de “Vamos Seguir” e “Me Façam Entender”.

A entrega era total, e Capilé confessou que o momento político atual despertou a vontade de compor um novo disco. “Falta convencer o resto da banda”, brincou, para empolgação dos fãs. A vibe era sensacional, mas o show ia caminhando para o fim.

“Reviver” abriu caminho para “Harmonizar”, que encerra o Continuidade, mas aqui rolou uma inversão, porque nada mais apropriado do que a apresentação ser finalizada com “Despedida”. Antes, como de costume, Vini cantou um trecho de “Detalhes”, do Roberto Carlos, sempre acompanhado pelas vozes da galera.

Foi um show lindo e digno de celebração em grande estilo. Mas, acima de tudo, foi um show necessário. Se o apanhado de algumas das principais faixas da banda nos traz uma nostalgia e felicidade, o tom engajado nos dá a sensação de pertencimento e união. Que venha um novo disco! E, se não vier, que ainda assim a gente possa curtir mais noites memoráveis como essa.

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