Duda Beat supera o crush no clipe de “Bolo de Rolo”
Foto: Divulgação

Já ouvir falar de Duda Beat?

Já falamos dela algumas vezes por aqui e apesar de se relacionar com música há certo tempo, Duda só lançou seu primeiro álbum este ano na forma de Sinto Muito, onde a cantora e compositora mistura reggae, dub, brega, pop e mais.

A temática das letras, no entanto, é o elo que transforma o álbum e sua sonoridade em algo único. As músicas versam sobre o amor em tempos modernos, nos tempos tecnológicos e apressados em que vivemos. As pessoas se mostram cada vez mais desapegadas. Isso tudo remete à ideia da “modernidade líquida”, do autor Zygmunt Bauman. De acordo com a teoria, vivemos em tempos dinâmicos, onde o individualismo se destaca. Assim, tudo se torna mais efêmero, inclusive relações amorosas, que são justamente o ponto em que Duda quer chegar.

Eduarda Bittencourt nasceu em Recife, terra do Manguebeat e de belas tradições musicais. Desde pequena, demonstrou interesse pelo canto. Se mudou para o Rio de Janeiro na época em que se formou na escola, ainda com o desejo de cursar Medicina. Toda essa jornada, com uma participação inevitável de alguns amores que teve ao longo da vida, culminou em seu primeiro álbum de estúdio.

O disco chamou a atenção de muita gente, que se identificou pela proposta. Ainda este ano, Duda se apresenta no festival No Ar Coquetel Molotov, em Novembro. No próximo dia 28, ela se apresenta no projeto Noite Faro, no Rio de Janeiro, com Cícero, Filipe Catto, Illy e mais.

Batemos um papo com ela recentemente. Muito carismática e com um sotaque apaixonante, ela nos demonstrou amor pelo o que faz e pelo resultado de seu árduo trabalho. Conversamos sobre música pop, sobre relacionamentos e como transformar a dor em empoderamento e em dança. Confira:

TMDQA!: Eu queria saber, primeiramente, quando que começou a sua carreira. Quando que você percebeu que tinha talento para música?

Duda Beat: Desde jovem. Durante a minha adolescência inteira eu cantei. Cantei em igreja. Lá, eram eu e mais três meninas cantando. O pastor me deu um solo. Ele falou “Nessa parte, eu quero a Eduarda cantando sozinha”. Aí nessa hora, eu pensei: “Poxa, eu acho que eu faço isso bem”. Eu tinha 15 anos, mais ou menos. E aí, eu montei uma banda no colégio, ainda em Recife. A gente tocava toda sexta-feira, no intervalo. Eu cantava Claudia Leitte, Ivete Sangalo, O Rappa… Todo mundo me conhecia no colégio como “cantorinha”. Aí fiz 18 anos e me formei no colégio, e vim morar no Rio de Janeiro. Eu sempre quis morar no Rio, e sempre quis ser médica, deixar de lado essa história de música. E aí, nesse processo, eu sempre fui amiga do Castello Branco, e ele me chamou para cantar no primeiro disco dele (Serviço, de 2013). Depois, cantei com a Letrux no Letrux em Noite de Climão. Isso foi agora há pouco, já durante a época de produção do meu disco.

Nesse meio tempo, eu fui em um retiro espiritual. Foi um retiro em que passei dez dias sem falar. Lá, eu meio que concluí que, já que sempre me apaixonava por músicos, talvez eu devesse me tornar essa pessoa para poder me resolver. Aí aconteceu assim: eu saí do retiro, virei para o Tomás (Troia, produtor do disco), falei que tinha umas músicas e falei que tinha interesse em gravá-las para ver o resultado. Foi fácil trabalhar com ele, porque tínhamos as mesmas referências e ele sempre foi meu amigo. Foi o primeiro disco com ele como produtor, e o meu primeiro disco de fato. Tínhamos cada vez mais músicas, e aí ele sugeriu de gravarmos um disco porque já tínhamos canções suficientes para fechar um disco. E aí fui investindo nisso, me dedicando até hoje a aulas de canto. Graças a Deus, está dando tudo certo. Eu já tenho até planos de lançar músicas novas. Estou bem contente com o resultado.

TMDQA!: Quando você veio aqui para o Rio, como conquistou esse ciclo de amizades, que tem o Tomás, a Letrux e essa turma toda?

Duda: Gabriel, que toca bateria comigo, é meu primo. Isso fazia com que eu sempre viesse para o Rio. Acontecia em todas as minhas férias, desde que eu me entendo por gente. E Gabriel estava começando uma banda, com Tomás, Lucas, Diogo Strausz… Então essas pessoas já faziam parte da minha vida há tempos. Quando eu vinha para cá, a gente saía junto. Nisso tudo, eu conheci também Alice Caymmi, e ficamos super amigas. Era como se fôssemos todos uma gangue. Depois veio CíceroMahmundi… A gente foi ficando cada vez mais junto, todos nós. Inclusive, foi difícil me acostumar em chamar a Letícia Novaes de Letrux, porque sempre me referi a ela como Letícia. A gente acabou crescendo junto. Eu já fazia parte desse grupo. Quando eu fiz 18, falei para minha família que queria vir para o Rio, cursar Medicina, que eu sempre me identifiquei com o Rio, que meus amigos estavam lá… E aí eu vim (risos).

TMDQA!: Você tem esse “rolê” em comum com uma galera grande no cenário alternativo da música carioca. É uma galera meio que do “underground”, que está conquistando uma visibilidade cada vez maior. Como você vê essa união entre vocês para o contexto da cena local? Acha que é algo importante?

Duda: Claro! Eu acho que ninguém faz nada sozinho. Sermos unidos só vai fortalecer o nosso “bonde”. Não tenho dúvidas disso. Por mais que, hoje em dia, com a correria de cada um, a gente não esteja mais junto todos os dias, a gente se ama. E tenho certeza que, se eu ligar para qualquer uma dessas pessoas agora dizendo que estou precisando de algo, elas vão me dar atenção e a ajuda necessária. Para mim é muito importante ter essa segurança, ainda mais porque, de todos eles, eu fui a última a lançar um disco, a me aventurar nessa carreira. Eu tive o apoio deles. Isso foi fundamental para eu chegar onde estou. Se eu tenho uma dúvida, eu posso ligar para o Cícero, por exemplo. Pergunto “Cícero, como que eu faço para fazer aquilo?”, e ele responde “Amiga, é isso, isso e isso”. Não poderia haver uma escola melhor do que meus próprios amigos. Eu acho que o nosso bonde vai ficar cada vez mais forte, porque a gente se ama muito.

TMDQA!: É bom que um dá suporte para o outro. Os públicos dialogam entre si e a cena fica mais consolidada. Eu lembro de uma apresentação sua lá no Espaço Municipal Sérgio Porto, no Humaitá, na época do lançamento do seu álbum. A Letrux estava lá, no meio da galera, pulando e cantando junto…

Duda: Totalmente! Nesse show, estava ela e a banda inteira dela, que eu amo! No final das contas, ouvir elogios de uma pessoa que está fazendo aquilo há mais tempo é muito bom para mim. Só tenho a agradecer ao universo por ter me apresentado essas pessoas maravilhosas. São referências para mim. Não só musicais, mas também referências de seres humanos. Semana passada, por exemplo, eu estava fazendo um show na Casa de Cultura Laura Alvim (em Ipanema), e a Mahmundi foi. E uma das coisas mais interessantes nisso é que cada um tem seu próprio estilo! Apesar de amigos, não fazemos coisas parecidas musicalmente, e respeitamos isso uns nos outros. Reflete a diversidade da música brasileira, cada um do seu jeito.

TMDQA!: Qual a origem do seu nome artístico? De onde veio o “Beat”?

Duda: Meu nome é Eduarda Bittencourt. Na verdade, foi uma das últimas coisas que decidi. É sempre um problema para o artista! Eu cheguei a pensar que “Duda Bitt” poderia ser um bom nome, mas mudei de ideia. Então, a Camila de Alexandre, uma das minhas backing vocals, foi quem sugeriu o nome oficial: “Por que não colocar ‘Beat’, de ‘batida’?”. Pensei que remetesse muito ao rap, tipo “Duda Beat, yo!” (risos). Mas eu queria uma explicação plausível para usar esse nome. Aí resolvi associar a escolha também com o movimento do Manguebeat, um dos movimentos musicais mais importantes da minha terra. Além do mais, Chico Science é uma puta referência para mim. Todo mundo que nasce em Recife tem no Chico uma referência enorme. Acabou que foi, então, por causa do nome, Bittencourt, e por causa do Manguebeat. Eu fiquei com medo de ficar meio internacionalizado por causa da palavra em si, mas aí pensei “Desculpa, já está na minha história”.

TMDQA!: Aproveitando que você citou Science, quais foram as suas influências ao longo desta sua jornada musical, não só em termos de sonoridade, mas também em termos de estética e performance?

Duda: As minhas várias influências variam entre coisas bem antigas e coisas bem atuais. Tem um pouco de influência dos anos 80, que para mim foi a melhor época da música. Além disso, Kali Uchis é uma grande influência para mim. Tem muito da expressão corporal da Kali. Sabe quando você se identifica com a ideia de alguém? Também tem muito da música nordestina, a questão do maracatu, trevo, baião… Isso é muito influente para mim, porque cresci ouvindo. A gente de Recife tem mania de grandeza. Para qualquer coisa, achamos que o nosso é maior: maior cultura do mundo, maior shopping do mundo… Para mim, é uma das maiores culturas do Brasil, sem sombra de dúvida. É uma cultura muito rica.

TMDQA!: Essa influência, em sonoridades regionais nordestinas, fica muito evidente no seu álbum, além de remeter a uma sonoridade mais pop ao mesmo tempo. Essa mistura acabou sendo um dos pontos fortes do álbum.

Duda: Sim, eu estou muito ligada à minha terra. Passei o carnaval lá, com a minha família. Eles estão muito ansiosos para a minha volta, porque vou tocar no MECA e no Coquetel Molotov. Eu acho que a minha influência está tanto em minha origem quanto em coisas mais atuais, como a própria Kali Uchis. Eu amo a Beyoncé e a Rihanna também. São todas influências fortes. Na minha opinião, o Sinto Muito foi o meu cartão de visitas. Como se eu falasse “Cheguei”. Tudo lá foi escolhido a dedo, tem muito carinho em tudo lá. Mas sei também que pretendo lançar coisas mais apelativas, mais pop. Eu acho que o mais legal do artista, além do fato de ser um influenciador, é ser eclético na música. Eu acho que o artista tem que ser capaz de fazer tudo, porque quando cai em repetição, as pessoas acabam falando “OK, isso eu já conheço”. Eu não vou citar nomes, porque é indelicado. Acho que os fãs se questionam “Você sabe falar sobre outra coisa?”. É muito importante ser adaptável.

TMDQA!: É o que acontece com vários artistas por aí, né? Acabam fazendo a mesma coisa para sempre. De certa forma, é a expectativa que os fãs podem ter em relação aos seus futuros lançamentos. Você lançou um álbum que traz uma sonoridade bem distinta e chamativa, e agora o público deve estar ansioso pelos seus próximos lançamentos.

Duda: Na verdade, isso me deu certo medo. Por ser algo diferente, não sabíamos como o público iria reagir. Mas eu estou satisfeita com as respostas ao álbum. Os números estão crescendo, as pessoas vêm falar comigo. Agora, eu acho que mais importante do que reagir bem ao álbum, é responder bem ao discurso dele. Tem muita gente vindo falar comigo sobre relacionamentos: “Eu acabei de terminar o namoro. O que eu faço? Me ajuda!”. Era isso que eu queria. Acho que quando um artista consegue atingir um nível de profundidade ao ponto de tocar uma pessoa e torná-la sensibilizada pelo seu discurso, isso é mais importante do que fama ou número. Não é sobre números, é muito mais sobre tocar as pessoas.

TMDQA!: Antigamente eu via que o público das suas músicas era mais centrado no Rio de Janeiro. Agora, parece que o Brasil inteiro já está sensibilizado pelo seu discurso e conhece seu nome.

Duda: Está rolando, sim! Tem uma galera muito forte no Maranhão, Ceará, Paraná, Rio Grande do Sul, Bahia, Distrito Federal… Eu quero muito tocar no Brasil inteiro. Quero muito me apresentar em festivais pelo país, porque em festivais eu consigo levar a minha banda toda. Para mim é muito importante também mostrar a banda. Quero mostrar para o povo que eu tenho também duas backing vocals, Tomás, Lucas… É muito difícil começar, mas eu estou muito feliz porque tem muita gente dando espaço. Depois tudo melhora, eu espero (risos). Estou muito feliz. Acho que meu maior desejo de carreira é este: levar para os quatro cantos do país o meu show completo, para terem noção do que eu faço no palco com meu grupo todo comigo.

TMDQA!: Falando um pouco do Sinto Muito, como se deu o processo de composição das faixas e essa mistura de estilos que fica evidente no álbum?

Duda: Na época, eu ainda estava me curando da dor. Eu cheguei com “Pro Mundo Ouvir”, “Derretendo”, uma faixa que não entrou no disco e “Bolo de Rolo”, que eu considerava uma música esquisitíssima. Eu falava isso para o Tomás, e ele discordava. Eu achava uma música muito louca, por causa da estrutura em que escrevi a letra. Ele sugeriu transformar em um reggae, e acabei aceitando melhor. Muita coisa veio dele e muita coisa veio de mim. Em todas as músicas, eu chegava com letra e melodia, e Tomás fazia os arranjos. O que rolava às vezes era uma sugestão, tipo “ao invés desse verso ser aqui, ele poderia ser lá”. Questões estruturais a gente conversava bastante sobre. Como as nossas referências sempre foram muito parecidas, porque crescemos juntos curtindo as mesmas coisas, foi fácil trabalhar com ele. Aconteceu tudo de uma maneira super natural.

É como se fôssemos vestir a nossa música, né? As melodias são o ser humano, e os arranjos são a roupa. Vestimos de acordo com a sonoridade que o “esqueleto” pedia. No final, até fiquei com medo de as pessoas não saberem como categorizar o disco, porque tem tantas referências diferentes em cada faixa que eu não sei como vão interpretar isso. Foi o Tomás que disse: “Você é pop. Pop é isso: falar com muita gente”.

TMDQA!: Como foi transformar a dor da frustração de um relacionamento não correspondido em algo dançante?

Duda: Eu falava que, apesar de estar sofrendo nessas músicas, eu queria que elas fossem animadas, porque eu sou assim! Eu estava na merda, mas fazia piada comigo mesma. Eu sou uma pessoa engraçada, então não queria que meu álbum fosse uma tristeza só. “Bédi Beat”, por exemplo, é uma música triste para cacete! Muito triste. Quando eu compus, fiz essa música bem mais lenta. “Visto que você nunca me ligou”… É muito triste isso, o cara nunca me ligou, e eu estava sofrendo muito enquanto escrevia esta música. O Tomás ficou até meio receoso quando propus de fazê-la mais animada, mas insisti. Tinha que ser animada. Isso foi uma preocupação muito forte minha.

TMDQA!: Então tudo foi planejado com muita calma, certo? Inclusive o nome do disco…

Duda: Foi tudo bem pensado. A “Bixinho” ia ser uma das últimas músicas do álbum. Só que a gente pensou que as pessoas talvez não fossem dar tanta atenção para essa música. Na maioria das vezes, a pessoa, ao ouvir um álbum, ouve a primeira, a segunda, e passa para outra. Eu não queria colocar como uma das últimas, porque é o meu hit, e as pessoas precisam ouvir o hit. Então, ela subiu na trackist e terminou como a terceira faixa. A ideia inicial era fazer por ordem de composição, e “Bixinho” foi a última que compusemos. “Todo Carinho” seria a penúltima, e por aí vai. Achamos que seria um erro de estratégia. Queríamos prender a galera. A ordem foi muito pensada. Tudo foi muito bem pensado. Esse foi um dos motivos para o disco demorar tanto para sair oficialmente. Como que eu ia me apresentar, o tipo de roupa que eu usaria… O nome do disco também demorou muito para ser decidido. Quem me deu o nome foi um dos meus melhores amigos. O álbum ia se chamar “Dub Night Apaixonados Volume 1”, mas ele falou que o disco tinha que se chamar Sinto Muito. Eu amo esse nome original, poderia até ser o nome de algum lançamento futuro. Um fã, inclusive, uma vez disse que amou o meu som, e classificou justamente como “Dub Night Apaixonados”. Eu pensei “Gente, não é possível que essa menina disse isso!”.

Mas acabou saindo como Sinto Muito. Tem uma dupla conotação, de “Desculpa, eu não quero mais você” e de sentir em grande quantidade mesmo. A ideia é deixar subentendido mesmo. Eu admito que, hoje, “sinto muito, não te quero mais” é muito mais forte para mim. No final do disco, eu estou cantando na “Bolo de Rolo”: “eu não vou buscar a felicidade em mais ninguém”. É um tema que eu domino muito bem. Mas eu sinto que também quero falar sobre relacionamentos bem correspondidos, até porque é o que estou vivendo agora. Eu ainda tenho muita música sobre amor sofrido, mas para o futuro eu pretendo lançar música onde estou mais “tranquila” nesse quesito do amor. Realmente, minhas músicas são relatos da minha vida.

Duda Beat - Bixinho

TMDQA!: Uma coisa interessante a se observar também é que o público canta todas as músicas. É como se também se identificassem com a letra. Como se estivessem abrindo o peito por terem vivido exatamente o que você disse.

Duda: O que me deixa mais feliz nesses shows que eu estou fazendo, é que todo mundo está cantando junto. Foi um disco que funcionou por completo. Parece que as pessoas estão digerindo as músicas aos poucos. Se olharmos no Spotify, dá pra ver que todas as faixas têm um número parecido de reproduções. Estão consumindo minha obra por completo, e isso é bem legal. É muito melhor do que você ter um hit foda enquanto as outras músicas contém poucos “plays”. E isso é tão raro, sabe? No momento em que vivemos hoje, todo mundo fica tão na correria que fica sem tempo de ouvir um disco inteiro. A moda são as playlists, né? Uma música de um, depois uma música de outro…

TMDQA!: Cantar sobre amor e sobre relacionamentos frustrados é bem comum. Vimos isso em trabalhos recentes de grandes artistas nacionais como, por exemplo, Letrux e Johnny Hooker. Esse tema remete muito à questão da modernidade líquida, de Bauman. Você acha que, talvez por conta da tecnologia, as relações hoje me dia estão cada vez mais supérfluas, rasas?

Duda: Totalmente. Eu até brinco que, desde que inventaram essa história de “ficar”, ninguém quer nada com ninguém”. Assim, as pessoas românticas se fodem cada vez mais. E eu sempre fui muito romântica, então eu sempre sofri muito com essa história da modernidade líquida.

No disco, eu falo de três caras diferentes que passaram na minha vida. Um deles é o personagem em “Bixinho”, que é uma pessoa pela qual eu não sentia o menor apego. Era um amigo meu que cresceu comigo. O outro, doze anos mais velho que eu, ficou sete anos comigo só ficando. Com o terceiro, eu fiquei entre três e quatro anos, mas ele era meu amigo também. Com esse último, eu saía todo final de semana, e ficava na esperança. Era um sofrimento muito grande para mim. Falo muito sobre essa questão de só “pegar” as pessoas, deixando o sentimento de lado. Isso me maltrata, porque se a tendência da sociedade for caminhar para isto, eu estou fodida caso não dê certo com o Tomás. É como se ninguém mais pensasse em construir família, em estar junto de alguém… As pessoas acham normal, e se eu falo isso, eu sou careta. Mas é a maneira que eu penso, e me preocupo com isso. É muito bom ter alguém para encontrar no sinal do dia, alguém amigo, para demonstrar carinho e compreensão, para cuidar.

TMDQA!: Em relação ao disco, eu acho que, além da sonoridade que ele possui, uma coisa gostosa e dançante ao mesmo tempo, a temática, o fato de falar sobre relações amorosas, faz com que Sinto Muito tenha uma pegada pop. No entanto, a faixa de abertura, “Anicca”, é muito curiosa, e se mostra mais conceitual do que as outras. Como você acha que ela se relaciona com o resto do conteúdo do álbum?

Duda: “Anicca” significa “impermanência”. Tudo na vida é impermanente. Tem toda uma história, que tem a ver com o retiro do qual participei. Se você parar para ouvir a faixa bem, ela é como se fosse uma abertura de um conto de fadas, tipo “A Bela Adormecida”. É como se a personagem principal desse conto estivesse entrando na floresta. A faixa realmente inicia uma história. Logo depois tem a “Bédi Beat”, em que eu explico que a história começa a partir do momento em que eu me fodi. “Eu vivi à flor da pele e nem percebi que das vezes que eu ria, era vontade de chorar”. No final, eu acabo descobrindo que eu não vou mais buscar a felicidade em mais ninguém.

TMDQA!: A Christina Aguilera também lançou álbum este ano. Curiosamente, a estrutura do novo trabalho ficou parecida com a do seu álbum, em termos de começar com uma introdução conceitual para, então, entregar para as músicas que, ao mesmo tempo, possuem uma explicação profunda e são dançantes. A Christina sempre foi enquadrada como uma artista pop, mas esse recurso da introdução não necessariamente é algo do pop, justamente por sua natureza mais “conceitual”. Por exemplo, a Lorde lançou, ano passado, o Melodrama, que é pop, apesar de letras e sonoridades um pouco mais reflexivas. Muitos enquadraram como “indie pop”, e o álbum teve um ótimo desempenho. Você acha que isso acaba virando uma tendência, visto que está se mostrando um recurso cada vez mais presente no pop?

Duda: Eu acho que é uma tendência, não necessariamente do pop, mas de artistas que possuem muita referência. Eu não sei se estou sendo um pouco abrupta no que estou falando, mas acho que uma pessoa que possui referência, que escuta desde Frank Ocean até o que é tocado no interior de Recife, vai conseguir fazer um álbum mais diversificado. Um álbum é uma obra, e toda obra precisa de uma introdução. Isso eu aprendi fazendo redação: introdução, desenvolvimento e conclusão.

TMDQA!: Vi muita gente classificar o seu álbum com um termo minimamente interessante: “sofrência indie pop”. O que você acha dessa classificação? Como você enxerga essa mistura de estilos que compõe o seu álbum?

Duda: Então, eu não concordo muito com “indie”. Eu me considero uma artista muito mais pop do que indie. Se for “indie” para remeter a “independente”, então eu realmente sou, pelo menos por enquanto. Agora, se for “indie” de “música indie”, eu não concordo, cara! Eu acho que o meu disco tem estilos muito bem definidos. Tem brega, tem reggae, tem música latina… Eu acho que o indie me caracteriza em um lugar onde eu não quero estar.

TMDQA!: Eu acho que muito disso, dessa associação do seu com a musicalidade indie, tem a ver com a transformação do pop vem sofrendo recentemente. É o que falamos sobre a Lorde e sobre a Christina. Talvez seja porque as pessoas ainda não estão acostumadas com essa sonoridade um pouco diferenciada do pop da última década. Talvez o público ainda precise de um tempo para se acostumar com isso.

Duda: Ninguém fala que elas são indie. Elas são pop. Eu acho que eu sou sofrência pop, mesmo. Eu quero ser pop, porque eu quero falar para muita gente. Eu quero que minha música toque para muita gente. O indie, pelo menos na minha visão, é algo que me restringe muito. Às vezes, eu sinto que quem nasce indie, não sai do indie. Eu acho que o primeiro passo que eu preciso dar é não me identificar com isso. É muito louco pensar assim. Falaram por aí que “Duda Beat inventou a sofrência indie”. Eu não inventei isso, sabe? A Letrux faz sofrência indie, por exemplo. E ela curte isso. Não sei se é o meu lugar. Eu prefiro ser categorizada como uma sofrência pop.

TMDQA!: Agora, para finalizar: você tem mais discos que amigos?

Duda: Não (risos). Acho que tenho mais amigos do que discos. Sou uma pessoa muito “do mundo”. Eu tenho muitos amigos, muitos.

TMDQA!: Se você pudesse escolher três discos para ouvir durante o resto da sua vida, quais seriam?

Duda: Vamos lá. Eu levaria o novo da Kali Uchis, Isolation. Eu levaria também o primeiro do Frank Ocean, o Channel Orange. E levaria também, para contemplar, o , do Caetano Veloso.

TMDQA!: Muitíssimo obrigado pelo papo, Duda! Espero que não tenhamos ocupado muito do seu tempo.

Duda: Que nada! Eu estava indo malhar agora, mas foi uma ótima desculpa. Estava com uma preguiça danada (risos).

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