Foto: Leandro Godoi

A cidade de São Paulo está entrando naquela semana de Março onde tradicionalmente se torna anfitriã para uma série de artistas internacionais de estilos diversos devido à realização de mais uma edição do Lollapalooza Brasil. Além do grande festival sediado no autódromo de Interlagos, a capital paulista tem vários palcos menores e interessantes que movimentam apresentações igualmente grandiosas, como a Audio no bairro da Água Branca.

E a expectativa para a noite de sexta, 16 de Março, era a de uma apresentação de alto nível mesmo. A casa recebeu o produtor, DJ e multi-instrumentista britânico de 41 anos Simon Green, mais conhecido como Bonobo, abrindo a temporada de shows dessa ocasião especial com a sua primeira apresentação em território brasileiro. A performance do grupo do britânico foi acompanhada de um show de encerramento pelo excelente rapper nacional Rincon Sapiência.

O aquecimento da casa começou partir das 22h com o set do DJ carioca Daniel Tamenpi, que se tornou residente da cidade de São Paulo e toca constantemente na noite paulista com faixas e remixes de hip hop e groove. Tamenpi é uma figura bem respeitada e influente no meio, é um dos jurados do Red Bull Thre3Style, um dos maiores campeonatos de DJs do mundo, fez várias turnês internacionais, mas com a pista do clube ainda praticamente vazia enquanto o público chegava e ia em busca dos primeiros drinks da noite nos bares e nos fumódromos, serviu como uma boa trilha ambiente para dar início à noite apenas.

Invertendo as expectativas e o costume da ordem das apresentações de atrações internacionais por aqui, quem subiu ao palco em seguida foi a atração principal da noite. Um pouco depois da meia-noite, e com a pista da casa completamente lotada, Bonobo começou o seu set que subverte todas as expectativas e convenções que grandes públicos possam ter da apresentação de um DJ.

Foto: Leandro Godoi

Acompanhado de um baterista, guitarrista, tecladista, flautista, saxofonista e uma série de sintetizadores, Bonobo ainda empunha um baixo durante a maior parte da apresentação para mesclar elementos característicos da música eletrônica tradicional (sendo de fato executada ao vivo) com uma performance orgânica e energética. Parece óbvio, mas o comentário “é como uma balada ao vivo!” foi uma das frases que ouvimos de membros da plateia no local.

Foto: Leandro Gogoi

Bonobo veio ao Brasil pela primeira vez desde o início de sua carreira, que está prestes a completar 20 anos, como parte da turnê do seu último disco, Migration, lançado em 2016. O britânico adquiriu um status cult ao longo dessas duas décadas pelo experimentalismo de suas músicas, que misturam sons eletrônicos, como trip-hop e uma pitada de deep house, com jazz e elementos da world music. A maior parte do seu repertório instrumental cria ambiências que remetem à trilhas sonoras de filmes, algo com o qual Bonobo já está muito bem familiarizado: as faixas do inglês já foram muito utilizadas em séries, longa metragens e peças publicitárias.

Um dos pontos altos da performance do grupo de Bonobo vem com a participação especial da cantora inglesa Szjerdene, que subiu ao palco por 4x na noite para cantar algumas faixas como “Towers” “Transits”. Sua voz suave, potente e hipnotizante casa muito bem com o estilo da banda, se tornando apenas mais um dos instrumentos responsáveis por construirem a atmosfera das músicas do set.

Foto: Leandro Godoi

Outro elemento que fez toda a diferença durante o show foi a performance do proficiente baterista Jack Baker. Parece uma combinação tão óbvia quando paramos para pensar, mas ter uma bateria ao vivo executando as linhas que tradicionalmente seriam preenchidas por um pad eletrônico dá toda uma nova dinâmica às músicas. Deixou o sentimento de que isso devia ser muito mais explorado em eventos de música eletrônica e em casas noturnas ao redor do mundo. Baker ainda encaixou um impressionante solo de bateria dentro da fantástica faixa “El Toro”, uma das mais esperadas pelo público na noite.

Após um pouco mais de 1 hora e meia de set, Bonobo se despediu do palco agradecendo ao público brasileiro e feliz por ter realizado o sonho de ter tocado no país pela primeira vez. O DJ ainda se apresentou no tradicional Circo Voador no Rio de Janeiro na noite de sábado (17 de Março).

Foto: Leandro Godoi

Infelizmente uma boa parte do público não quis estender a noite e bateu em retirada para as suas casas ou de volta à área do fumódromo e dos bares externos após a apresentação do Bonobo. Uma pena para quem se foi, pois por volta das 2 da manhã, Rincon Sapiência entrou de peito aberto no palco e mostrou aos presentes por que é um dos nomes mais interessantes do rap nacional em 2018.

Acompanhado somente das pick-ups do DJ Mista Luba e do repertório explosivo e diverso do seu álbum de estreia Galanga Livre, Rincon fez valer o primeiro lugar no nosso ranking dos 50 melhores discos nacionais de 2017. E quem ficou pra ver o rapper, se divertiu. Sem parar 1 minuto e colocando a pista para dançar, Sapiência mandou uma sequência de boas músicas como “A Coisa Tá Preta”“Moça Namoradeira”“A Noite é Nossa”“Amores às Escuras”“A Volta pra Casa” e uma série de improvisos a capella que mostram a proficiência do flow do MC que dá a devida importância às palavras que coloca em cada uma de suas rimas.

Foto: Leandro Gogoi

Em diversos momentos do set, como não podia ser diferente, Rincon fez questão de lembrar que o nosso Brasil ainda é segregacionista, preconceituoso e que não devemos nos desanimar frente aos acontecimentos recentes (como o assassinato da vereadora carioca Marielle Franco). Sapiência comparou a transformação dos antigos quilombos nas atuais comunidades periféricas brasileiras, e acusou o Estado de historicamente tentar controlar a população através da retirada de benefícios, precariedade do sistema educacional, retirando a esperança do seu povo e até o matando. Para ele, a única forma de tentar digerir a realidade é resistindo através da arte.

Foto: Leandro Godoi

Após o sincero discurso, Rincon se despediu da noite paulista com a impactante “Ponta de Lança”. Tirou uma foto com o público, e ao som de “Chefe é Chefe Né Pai?” nos falantes da casa, saiu com mais moral ainda do que entrou no palco. Sorte de quem ficou pra ver.

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