Foto: Marcelo Ferraz

O fim do ano chegou, de forma cada vez mais inesperada e pegando muita gente de surpresa. “Mas já?” você deve ter pensado quando viu o calendário virar a data para o dia 1º de Dezembro. Pois é, amigos. Essa pergunta também passou pela cabeça de muitos fãs de música em São Paulo que estão pouco a pouco se dando conta que um dos locais mais icônicos e representativos do underground brasileiro está com os seus dias contados.

O Hangar 110, casa de shows histórica da capital paulistana localizada no número 110 da rua Rodolfo Miranda, no bairro do Bom Retiro, tem data e hora marcada para fechar as suas cortinas pela última vez: às 23h59 do dia 23 de Dezembro, o CPM 22 tocará o último acorde no palco do Hangar em um show que teve os seus ingressos esgotados em menos de 12 minutos, com direito a apresentação extra no mesmo dia.

De qualquer forma, o nosso “CBGB brasileiro” ainda respira com uma série de apresentações incríveis (com um toque melancólico de saudosismo antecipado) para essa reta final do mês de Dezembro. E um line-up de respeito abriu a festa de despedida na sexta-feira passada (1 de Dezembro), com shows de Deb & The MentalsMenores Atos Pense.

Quem foi até o Hangar pôde conferir uma noite que lembrou as grandes apresentações de anos atrás, com casa cheia, ingressos esgotados e fãs inflamados pela apresentação das bandas principais da noite.

Deb & The Mentals

Deb Babilônia (Foto: Marcelo Ferraz)

A abertura ficou por conta do quarteto Deb & The Mentals, que começou a esquentar o Hangar com o público que ainda chegava na casa aos poucos, formando fila do lado de fora e usando os bares da rua como ponto de encontro pré-rolê da sexta à noite. Lá dentro, a banda executava os sons do seu último lançamento, o excelente disco Mess, com precisão e sem firulas.

Stanislaw Tchaick e Guilherme Hypolitho (foto: Marcelo Ferraz)

O garage rock sujo e rápido da banda, que remete à sonoridade de clássicos da região de Seattle nos anos 90, se torna muito mais encorpado com a presença de palco e a voz inebriante, grave e rasgada da vocalista Deb Babilônia. Ver ela ao vivo é como presenciar uma mistura de Stevie Nicks, Joan Jett e Becca Macintyre em formação, mas o ar que ela transmite de provavelmente não ligar para nenhuma dessas comparações torna o seu papel na banda muito mais interessante.

A apresentação era intercalada com um show particular de stand-up e mensagens improvisadas do baixista Stanislaw Tchaick (Water Rats), que se sentia à vontade no silêncio entre músicas no palco como se estivesse ensaiando com a banda na frente de amigos. Definitivamente são uma daquelas bandas que soam melhor ainda ao vivo do que em estúdio (e com o volume dos P.A.s bem alto de preferência).

Menores Atos

Cyro Sampaio (Foto: Marcelo Ferraz)

O trio carioca de rock alternativo/emo, Menores Atos, subiu no palco em seguida para dar de cara com uma plateia apaixonada que já se abarrotava em frente ao mesmo para uma apresentação intensa e emocionante. Desfilando sons do seu disco Animalia, que possivelmente entraria para uma lista dos melhores lançamentos nacionais da década, a banda abusou de transições instrumentais e ditou o ritmo do coral paulistano que cantava à plenos pulmões, a ponto de deixar a sensação de que se dependesse deles, o Hangar teria motivos de sobra para continuar aberto.

Foto: Marcelo Ferraz

O vocalista Cyro Sampaio não cansou de transparecer o seu entusiasmo por encontrar a plateia demonstrando mais uma vez com tanto vigor a sua troca de energia com a banda, dizendo que o Menores Atos a partir desse dia dividiria sua “cidadania” entre Rio de Janeiro e São Paulo. O vocal também anunciou a entrada da banda em estúdio para a gravação do seu novo LP no ano que vem.

 

 

Eram constantes as invasões de palco para o mosh e para que os fãs cantassem
diretamente do microfone, nada inesperado em um show desse porte dentro do Hangar 110. O único momento em que público e banda tiveram uma pausa para respirar foi durante a balada “Sobre Cafés e Você”, que ganha uma versão full band ao vivo que teria sido muito interessante se fosse registrada em estúdio também.

Foto: Marcelo Ferraz

O gran finale, com suspiros de lamento do público, veio com a pegada “Sereno”, que encerrou o set dos cariocas de forma excepcional. É uma banda para se assistir sempre que possível ao vivo.

Pense

Lucas Guerra (Foto: Marcelo Ferraz)

Os mineiros da banda de hardcore Pense eram os headliners da noite e mostraram que tinham repertório de sobra para bater de frente com uma plateia alucinada que esgotou os ingressos para assistir à apresentação comemorativa de 10 anos da banda na estrada. O início do set foi marcado por um áudio do ensaio do filósofo brasileiro Mario Sérgio Cortella chamado “Porque existe alguma coisa e não o nada?”:

“Por toda a história da humanidade há uma questão que não foi contada. Em qualquer momento da história humana. A grande questão, que é absolutamente abstrata, mas ela é fundamental é: Porque é que existe alguma coisa e não o nada? Quatro grandes foram os caminhos para tentar responder à essa angústia. A ciência, a arte, a filosofia e a religião. Essas quatro áreas se dedicaram a tentar explicar porque que nós existimos, porque que as coisas existem, com uma grande diferença: a Ciência procurou trabalhar o “como” das coisas, isto é, o funcionamento. Enquanto que a filosofia, a arte e a religião foram em busca dos por quês. Ambos são necessários, não ao mesmo tempo, não do mesmo modo. Mas tanto o “como” quanto o “por que”, são necessários.” 

A introdução filosófica do set acabou com uma emenda na explosiva faixa “Revitalizar”, single que marcou o retorno do Pense aos palcos após 1 ano e meio de hiato. O show foi pontuado por versões energéticas das músicas dos discos Além Daquilo Que Te Cega Espelho da Alma, recebidas com a presença constante dos fãs no palco se lançando por cima da platéia, muitas rodas punk e o suor escorrendo pelas paredes de um Hangar quente e feliz com o vigor de uma banda que tem tudo pra se tornar um dos principais nomes do hardcore nacional.

Na metade do set, o vocal Cyro do Menores Atos retornou ao palco para uma participação especial na música “Contra-Cultura”, cantada em uníssono pelo público presente e retomando uma característica que sempre foi essencial nessa cena para poder garantir a sua sobrevivência: a cumplicidade e amizade entre as bandas que se ajudam e fazem turnês juntas constantemente.

Cyro Sampaio no palco com o Pense (Foto: Marcelo Ferraz)

O vocal do Pense, Lucas Guerra, não cansava de despejar mensagens de positividade para os fãs, desejando que os mesmos vivessem o presente, pois não sabemos o que pode acontecer amanhã e se estaremos por aqui ainda, e que soubessem dar valor às pessoas à sua volta e ao momento em que viviam, celebrando a música e a união em torno de um espaço tão importante quanto o Hangar 110, mesmo que tardiamente. Ainda ficou a promessa de um retorno da banda ao estúdio para a gravação do terceiro disco da carreira  para o ano que vem.

O fim do set chegou com a música “Expansão da Consciência”, um público muito satisfeito com a experiência decidiu subir em peso ao palco, sequestrar os microfones e assumir o papel de vocalistas de apoio do Pense, marcando assim a despedida dessas 3 bandas que conseguiram fazer parte da história do Hangar por uma noite, pela última vez.

A casa ainda tem uma agenda extensa para o mês de Dezembro com várias bandas que tem uma relação muito próxima com a biografia do local, então não perca a chance de prestigiar por pelo menos mais uma vez o espaço ou de conhecê-lo caso nunca tenha ido. O Hangar 110 e todos os profissionais que lá trabalharam por todos esses anos pra fazer a história acontecer merecem.

Agenda:

08/12 – R.Sigma
09/12 – Gloria
10/12 – Esteban Tavarez
13/12 – Matanza
14/12 – Strike
15/12 – Nitrominds, Garotos Podres
16/12 – Flicts, Excluídos, Desardados, Drakula
18/12 – Dead Fish
19/12 – Sugarkane, Zander e Corona Kings
21/12 – Dead Fish
22/12 – Hateen
23/12 – CPM 22

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