Atualização (12/08): o novo álbum do Inky se chamará Animania.

Em “Devil’s Mark”, um naipe de metais explode em uníssono sobre camadas de sintetizadores, guitarras e graves, amarradas por um groove sutilmente dançante. Juntos, os saxofones, trompete e trombone – cortesia do naipe do grupo Bixiga 70 – dão cor e contraste aos riffs repetidos, um quase-transe que beira a psicodelia, mas firma o pé no chão em uma cruza esperta entre as liberdades sujas do krautrock e o revival recente do synthpop. Já em “The Rarest Good”, um arranjo de cordas embeleza uma balada sofrida de vocais rasgados, que emociona sem apelar para o drama. Tudo isso em apenas dois oitavos do novo álbum do Inky, o segundo do grupo paulistano, que sai na segunda quinzena de agosto.

A convite da assessoria da banda, o Faixa Título acompanhou um dia de gravações no Red Bull Studios, no centro de São Paulo, em meados de julho. Ainda não batizado oficialmente, o álbum conta com a produção de Guilherme Kastrup, reconhecido nacionalmente como produtor do aclamado A Mulher do Fim do Mundo (2015), de Elza Soares.

“[O novo álbum] é um disco mais tocado, menos programado, com menos edição de estúdio. E isso traz uma energia mais rock n’ roll, mais do ao vivo mesmo”, diz o produtor, em entrevista ao Faixa Título. Oriundo de uma adolescência roqueira, com uma carreira profissional que circula com facilidade entre a eletrônica e a MPB, Kastrup propôs caminhos menos sintéticos que os tomados em Primal Swag (2014), o disco de estreia do Inky. A sonoridade mais livre, antecipada pelo single “Parallax” (ouça abaixo), é fruto de uma parceira simbiótica entre o produtor e uma banda sedenta por experimentação, mas inicialmente carente de um norte.

“A gente queria trabalhar com um produtor que ajudasse a gente a dar um passo a mais. Tínhamos algumas opções [de produtores], mas aí a gente ouviu o disco da Elza no ano passado e ficou boquiaberto”, explica o baixista Guilherme Silva durante conversa no terraço do estúdio, com vista e “trilha sonora” dos ônibus no Terminal Bandeira, a alguns passos dali. Guilherme descreve o trabalho com Kastrup como um processo de confiança e desapego: “A gente jogou umas 40 músicas fora [durante as sessões de composição do disco]. Normalmente a gente se apega muito com o que a gente faz. Tem que confiar no cara com quem você tá trabalhando”.

Embalado pela turnê de Primal Swag, onde explorou novos arranjos e flertou com novas identidades sonoras, o quarteto compôs as oito músicas do novo trabalho a partir de ideias geradas em improvisos, sem certeza do que ali viria a se tornar uma música nova. “A gente se define como uma banda de jam. Ninguém nunca sentou e falou: ‘então, compus essa canção’. Mas a gente tentou incorporar esse espírito de canção nesse novo álbum. Porque se deixar a gente fritar, quando a gente vê a música tem 15 minutos e é isso”, detalha Guilherme. “Poderia ser caótico, mas a gente respeita muito o silêncio. Acho que o grande segredo da música é o silêncio, o espaço do outro. É tão importante quanto a parte que você tá tocando”, avalia.

“Uma coisa que a gente queria nesse disco era trabalhar melhor a dinâmica das músicas. O Primal Swag é pancada o tempo inteiro. E aí a gente quis fazer um disco que fosse mais sutil, menos rígido”, completa a vocalista e tecladista Luiza Pereira. Segundo Luiza, o papel de Kastrup no processo de tornar o som do grupo mais orgânico foi essencial. “Esse é um disco muito diverso. Tinha música que a gente não sabia pra onde levar, e o Kastrup deu inputs muito legais, como a levada do refrão de ‘Parallax’, que foi ideia dele”, conta.

Inky e Guilherme Kastrup
Luiza Pereira e Guilherme Kastrup durante as sessões do novo álbum

O produtor, por sua vez, elogia a coesão musical da banda durante a produção do disco novo. “Eles compõem de um jeito que chamo de ‘compor de cabeça pra baixo’. Primeiro surgem as bases, os primeiros riffs, uma batida, e a partir daí a música começa a ser construída. E na última camada vem a melodia, a letra, o que aproxima mais eles da canção. E por isso eles fazem um tipo de canção que é a ‘não-canção’, toda desfragmentada, desestruturada”, descreve. “O que eles trazem é maduro demais pra pouca idade que eles têm. E vem dessa coisa do quarteto, que é uma formação muito forte – quatro pilares, um apoiando cada corner”.

Apesar de similar em essência à banda que lançou Primal Swag, especialmente no interesse contínuo em fundir o rock e a eletrônica, o Inky de 2016 soa mais confiante e ousado. Algumas diferenças são óbvias, como a produção de Kastrup e a entrada do baterista Luccas Villela (também baixista do E a Terra Nunca Me Pareceu Tão Distante), responsável por dar outro peso à base rítmica da banda. Outras, mais sutis, passam pela evolução pessoal de cada um dos quatro, perceptíveis desde à postura profissional da banda, mais bem resolvida que no passado, e nas letras, compostas integralmente por Luiza no novo álbum.

“Esse disco é uma visão bem pessoal minha. Ele fala de coisas diversas que permeiam o meu mundo, desde ser mulher à minha visão de mundo, amor… Tudo o que você puder imaginar. Foi um disco bem pessoal pra mim nesse sentido. Foi bem difícil, até, me causou bastante insegurança. Foi uma responsabilidade a mais”, desabafa. “Eu faço as melodias antes das letras, então eu tinha que conseguir casar as duas coisas. Em ‘Parallax’ eu tinha aquela melodia que era uma coisa super rítmica e tal, e ainda tinha que colocar uma letra que fosse poética, que tivesse um sentido. Então foi um treinamento mesmo”.

Inky
A banda e a equipe técnica responsável pelo disco

Ao mirar no produtor de um dos discos mais procurados da atualidade, com passagens recentes pela Europa – durante a conversa, Guilherme ainda usava a pulseira do Primavera Sound, festival catalão no qual o Inky tocou em junho passado (leia aqui as impressões do blog sobre o Primavera) – é nítido que a banda tem planos ambiciosos. E a versatilidade da banda, exposta tanto no novo álbum quanto no discurso de união da entre os grupos da mesma geração, deixam claro que, além de ambição, há um desejo latente de integrar uma nova cena de rock, mais consolidada perante o grande mercado, mas não subserviente a ele.

“O rock em si já é muito menos segregado”, analisa Luiza. “Antes você tinha várias panelinhas, ninguém se misturava muito. Hoje em dia não tem isso. A gente pode fazer um show com o Supercombo, que é uma banda mais pop, e vai ser irado. O público quer ouvir coisas diferentes. Tá todo mundo querendo agregar”. Segundo Kastrup, chegar ao mainstream não foi um dos objetivos do trabalho. “A preocupação é exclusivamente com a música, não houve mira comercial. Acho muito bacana essa coisa de hoje em dia, do cenário ter se multiplicado, cada artista pode chegar ao seu público sem necessariamente ter que passar pelo filtro da grande mídia. Se acontecer da música cair no Faustão, legal, bacana. Mas não mirar pra isso é algo saudável pra música. O resultado é diferente”.

Guilherme concorda que não há um objetivo claro de massificar o público da banda, mas descreve alvos imponentes no futuro do Inky a longo prazo. “A gente tem um grande sonho de virar uma banda importante na América do Sul, e que isso ajude a puxar toda uma leva de bandas, que mostre que no Brasil e na América do Sul tem uma puta cena de rock. A gente tem uma cultura tão intensa, tão forte… Inky, O Terno, Francisco El Hombre, Far From Alaska, Scalene, todo mundo. Essa nossa geração é muito foda”.

O novo álbum do Inky chega às principais plataformas digitais no próximo dia 19, com show de lançamento do álbum no CCSP, em São Paulo, no dia 27 de agosto.

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