Resenha: Matanza - Pior Cenário Possível

Basta dar uma volta no meio da galera num desses festivais locais de rock para sacar o óbvio. O Matanza é uma das bandas favoritas da molecada que está descobrindo o hard rock, o hardcore, o metal, enfim, um estilo de música mais agressivo. Entretanto, falar que o apelo do grupo é apenas entre esse público seria uma grande inverdade. Muita gente, inclusive os mais velhos, gosta do Matanza, só que a juventude transviada em geral costuma achar que o som dos caras é a coisa mais perigosa do mundo.

No sétimo disco da banda (Pior Cenário Possível, lançado em Abril), era de se esperar que Jimmy London (vocais), Donida (guitarra) e companhia voltassem mais agressivos do que nunca, devido ao anúncio de que o registro seria o primeiro do Matanza a ser gravado com duas guitarras ao invés de somente uma. Se o grupo já destilava uma fúria descabida sem limites com um guitarrista, dobrar a presença do instrumento mais característico do rock no álbum significaria duas vezes mais poder e possibilidades.

Com esse portentoso panorama, Pior Cenário Possível tinha tudo para ser um trabalho que agradaria tanto os fãs mais antigos quanto também os que de alguma forma se mostravam aborrecidos e ignoravam os intentos do Matanza. Aliado a isso, ainda estava o fato de que o countrycore que tanto afamou a banda não seria tão evidente e que as músicas sobre bebedeira (sucesso entre os jovens, inclusive entre os que não têm idade para beber) seriam substituídas por uma temática mais sombria, claramente inspirada em filmes e literatura de crime e terror. A cereja do bolo era a produção do gigante Rafael Ramos, que já havia trabalhado com o Matanza nos álbuns Santa Madre Cassino e Música Para Beber e Brigar e que no ano passado produziu nada mais nada menos que Nheengatu, dos Titãs, Nu, do Forfun e Setevidas, da Pitty. Sem pedir perdão pelo trocadilho, este é ou não o melhor cenário possível para um registro?

Decidida a começar de forma avassaladora, a banda prega o pé na porta com a veloz “A Sua Assinatura”. A partir daí a voz de Jimmy encarna personagens curiosos e diferentes como o detento armando uma fuga da prisão (“O Que Está Feito, Está Feito”), o fantasma nada camarada que espanta todos que aparecem em seu lar (“A Casa em Frente ao Cemitério”) e o sortudo com corpo fechado que sempre escapa da morte (“Sob a Mira”). Entre as interpretações, estão uma ou outra narrativa mórbida como a de “Matadouro 18”, que mostra a inventividade do Matanza na construção das rimas, percebida também em “O Que Está Feito, Está Feito”. As duas músicas se configuram como as melhores do disco.

Na segunda metade do trabalho, o grupo tenta passar uma sensação claustrofóbica e desesperadora através da faixa título, conseguida muito mais pelo entrosamento rítmico entre os instrumentos do que pela letra. Essa fluidez foi resultado do processo de gravação de Pior Cenário Possível, onde todos os instrumentos foram registrados conjuntamente, trazendo mais naturalidade às composições. Todos os músicos estão excelentemente bem e o baixista China (que saiu recentemente do Matanza) faz uma baita de uma despedida.

O “Pessimista” da música seguinte é mais um dos personagens irritados que a banda tanto gosta de incorporar. As narrativas continuam com “Chance pro Azar” e “Orgulho e Cinismo” (sobre o declínio da civilização por conta do caráter humano), desembocando no pesado encerramento “Conversa de Assassino Serial”, onde um matador mais experiente dá um rala e uma lição a um descuidado que deixou várias pistas para a polícia nos seus crimes.

Mesmo tendo o terror como maior inspiração para Pior Cenário Possível, o Matanza já foi mais intimidador e chocante em outros álbuns. Em tempos de banalização da violência, as letras apresentadas no trabalho (salvo uma ou duas exceções) horrorizariam apenas velhinhas e defensores da família tradicional brasileira. Ainda assim, não irão faltar os fãs (não todos) que classificarão o som como o mais tenebroso do mundo. Como prova de que não é, basta tomar de exemplo a formação clássica dos Misfits (maiores expoentes do horror punk), que seria tão assustadora, horripilante e indecente hoje quanto no fim dos anos 70 e inícios dos anos 80. Inclusive nesses tempos de banalização da violência.

Pior Cenário Possível pode até não amedrontar, mas em seus 35 minutos de duração é curto e grosso como um bom álbum de hardcore punk com elementos de heavy metal. Para uma melhor apreciação, é recomendável escutar todo disco no talo (assim como é com todo o tipo de música que vale a pena). Com o volume baixo, a voz de Jimmy fica muito mais em evidência do que os instrumentos, causando perda de força e escondendo o potencial energético e a qualidade instrumental das faixas. É difícil prever se o Matanza continuará ou não sendo uma das bandas preferidas dos garotos rebeldes, ansiosos por emoções e letras mais fortes. Se grande parte das músicas do registro for tocada nos próximos shows, é bem provável que sim.

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