TMDQA! entrevista: Thiago Pethit

TMDQA! entrevista: Thiago Pethit

Com o recém-lançado Rock’n’Roll Sugar Darling, Thiago Pethit deu uma guinada em sua carreira e se afastou de vez da nova MPB. Depois dos elogiados álbuns Berlim, Texas e Estrela Decadente, nos quais o artista aposta em sons mais sofisticados, agora ele segue o rumo do Candy Rock com a clara influência de The Stooges, The Velvet Underground e até Bonde do Rolê.

A seguir, você pode ler na íntegra a conversa que tivemos com o músico sobre esses temas e muitos outros.

TMDQA!: Apesar do clipe de “Moon” ser uma dica do que estava por vir, a mudança do seu segundo para o terceiro disco é gritante. Como isso aconteceu?

Thiago Pethit: Nem acho que tenha sido tão gritante assim. De ‘Berlim, Texas’ para ‘Estrela Decadente’ certamente houve um descompasso maior. Agora eu creio que esse foi um passo mais natural, flertar com o rock e um som mais afetado antes para depois intensificar isso, explicitar e assumir o rock como linguagem principal.
Ao menos, foi natural no meu processo. Os discos sempre surgem como resultados dos meus shows e os shows do Estrela já vinham ficando mais ‘pauleira’ de um tempo pra cá. O som mais pesado e o público mais quente. O destino das músicas foi seguir esse caminho.

TMDQA!: E quanto ao rótulo de artista da nova mpb? Você ainda se encaixa nele? Alguma vez o rótulo te incomodou?

Thiago Pethit: MPB é um rótulo bastante castrador, sob certa ótica. Todos os rótulos são castradores.. Eles determinam a prateleira em que vão descobrir o teu álbum quando estiverem nas lojas, reais ou virtuais. Então suponha que um cara que gosta de rock só vá até a prateleira deste gênero e não encontre o meu disco. Ou outro que está buscando novos sons na área de MPB e não me encontre por lá. Rotular é limitar. E MPB quer dizer um milhão de coisas e nenhuma ao mesmo tempo.
Nova MPB por sua vez, era algo que eu compreendi fazer parte nos idos de 2010. Eu estava começando, junto a um monte de outros artistas que lançavam também seus primeiros discos, todos inseridos num mercado brasileiro, mas com as influencias mais diversas e plurais possíveis. Muitas vezes, essas influências nem eram a música brasileira, mas podia ser o folk gringo ou a mais nova banda de clubs daquele momento. Isso mudou muito de lá pra cá. Como tudo no mercado, o rótulo surge e se ele é o rótulo do momento, todo mundo começa a trabalhar em cima das mesmas referências que estão sendo bem sucedidas e bem comentadas. Então todo mundo quer ser ou fazer o som da Tulipa, do Silva, e por aí vai. Surgem inúmeros artistas daquele rótulo e quando você vê, são todos iguais.
Eu cada vez menos me identifico com esses sons que definem o rótulo de Nova MPB. Cada vez sou mais estranho nesse ninho.

TMDQA!: Como se deu o processo criativo do disco? Você sempre quis fazer algo nesse estilo ou ele surgiu há pouco tempo?

TP: Como eu disse na primeira resposta, meu processo resulta do tempo entre um disco e outro e o que me acontece em shows, na vida pessoal, e no mercado. Do ‘Berlim, Texas’ para o ‘Estrela’ eu me descobri dentro de um mercado pela primeira vez na vida. Aliás, dentro e fora ao mesmo tempo. O ‘Estrela’ foi a compreensão de que eu enquanto produto era um fracasso, mas podia existir. De lá pra cá, chegando ao terceiro disco de forma independente, eu estou olhando para isso e pensando: eu sou um fracasso muito bem sucedido.
Eu sempre gostei de rock’n’roll. Sempre me identifiquei com isso e acho que existem momentos para cada artista em que ele se identifica mais com um gênero, ou com um tipo de peso ou leveza. E existem outras coisas também, que me levam a fazer os discos como eu fiz. Não é só uma questão de gosto. E por isso eu sempre bato tanto na tecla do ‘mercado’ da música.
O ‘Berlim, Texas’ por exemplo, tinha uma linguagem musical vazia de instrumentos, que ressaltava a voz, as canções. Mas não era assim só porque eu gostava e era como queria ser definido. Foi uma estratégia viável para lançar um primeiro disco, independente e sem grana e ainda assim poder fazer mais trabalhos a partir daquele. É uma equação simples: como lançar meu primeiro disco, num mercado que não vai investir em mim agora, sem ter grana o suficiente para um projeto ambicioso e ainda assim, fazer de uma linguagem mais pobre, algo sofisticado e que possa de fato, se estabelecer como linguagem e identidade sonora. De lá pra cá, a grana de investimento minha foi aumentando, pois meu trabalho foi ficando mais bem sucedido e os projetos mais ambiciosos puderam começar a acontecer do Estrela Decadente para cá. Há uma progressão de resultado sonoro, evidente. Eu só estou podendo pagar por ele agora. Então, é inegável que eu sou um fruto do mercado e do que ele pode me oferecer. E se eu não tiver mais grana de novo, para conseguir dois grandes produtores, bons estúdios, eu ainda assim vou tentar fazer um trabalho em que a linguagem se adapte ao que é possível. Pois acredito, mais que tudo, que música é um reflexo do seu tempo. E cada tempo, é um tempo.

TMDQA!: Como se deu seu encontro com o icônico Joe Dallesandro? Como ele influênciou nesse novo trabalho?

TP: O Joe reflete exatamente o que me aconteceu do último disco pra cá. Ele foi inspiração para o clipe de MOON e para o ‘Estrela’, um disco em que eu flertava com agressividade e rock’n’roll.. Agora, eu assumo esse rock e tenho o Joe na abertura do disco, fazendo-me um pedido ao mesmo tempo em que faz um convite, ao ouvinte. Tal qual Lou Reed fez com ele em Walk On The Wild Side.
Conheci Joe e a esposa dele, Kim, com o lançamento de MOON. Um amigo em comum nos colocou em contato via Facebook e passamos meses trocando mensagens, histórias, músicas, poemas. Em junho deste ano eu o convidei para participar do disco, que já tinha um poema inédito de Kim Dallesandro em Story In Blue (a faixa que fecha o álbum).
Fui até Los Angeles, passamos diversas tardes de domingo juntos, repetindo a cerimonia das conversas via facebook. Vi fotos originais da época do Avedon e do Warhol, descobri a historia de vida dessa cara, e enfim, escrevi esse texto de intro e fizemos juntos algumas fotos para divulgação. Prometi que voltaria para assistir um doc sobre o Chet Baker com eles, mas minha viagem foi encurtada e tivemos que nos despedir por telefone.

TMDQA!: Você define o som que está em seu disco como “candy rock”. Poderia nos explicar isso melhor?

TP: Joe e Candy Rock são sinônimos do mesmo desenho que eu fiz para esse disco. O Joe é um ícone genuíno de uma época em que o rock servia como expressão para a ‘música do diabo’. Era fruto de negros, gays, mulheres, desajustados sociais e rednecks. E sem nenhum discurso político claro, muito menos politicamente correto, era um grito de expressão dessas minorias. Um grito representado pelos quadris chacoalhantes do Elvis Presley. Ou da sexualidade explícita do Jim Morrison. A androgenia do Bowie e a bissexualidade do Iggy Pop.
De tempos pra cá, paga mal um roqueiro rebolar. Pois eu rebolo bastante, e isso é um pouco do candy rock pra mim.

TMDQA!: A influência de artistas como Lou Reed e Iggy Pop é clara nessa sua atual fase, mas e sobre artistas contemporâneos, você também se influência neles?

TP: Sim, existem muitos artistas contemporâneos que de certa forma me fazem repensar a minha própria música. O Jack White por exemplo, é um cara que observei para a construção deste disco. O Metronomy e a Lykke Li também. A ideia de construir um rock que é pensado em guitarras sobre arranjos quase eletrônicos, ou arranjos de beats de hip hop, é uma coisa me atrai muito. Mesmo o Adriano Cintra, produtor do disco, já vinha me influenciando indiretamente e ao trabalharmos juntos, acabou mudando meu olhar criativo ao construir as músicas.

TMDQA!: Há comparações do single “Quero ser seu cão” com “I Wanna Be Your Man” do Willy Moon. Alguns chegam até a falar em cópia ou algo do tipo. Como você se sente em relação a isso? Você se inspira no artista?

TP: Não sabia que havia essa comparação direta. Quero Ser Seu Cão, é um rock Bo Diddley tradicional. I Wanna Be Your Man também. Esse gênero que foi criado com ele nos anos 50 já foi feito por todos os artistas possíveis de Lykke Li a Stones. A estrutura musical é sempre a mesma, são todos quase iguais, com as estrofes iniciais idênticas e alguma variação no refrão. Minha ideia original surgiu ouvindo o Bonde Do Rolê e o batidão funk em ‘Arrastão’. Pra você ter uma ideia de como nem tudo é tão obvio quando se trata das minhas fontes de inspiração. Se você escutar essa música do Bonde, que é uma banda que eu adoro, vai notar que os beats possuem quase a mesma estrutura da minha música e as primeiras estrofes uma melodia muito parecida com de Quero Ser Seu Cão, lógico guardadas as devidas proporções e diferenças entre funk batidão e rock.

TMDQA!: Você tem mais discos que amigos?
TP: Cada vez mais.

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